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Luciano Pires -

Bom dia, boa tarde, boa noite. Na última vez que fiz um levantamento sobre o perfil dos ouvintes deste Café Brasil, apareceu que a idade média é 35 anos. Gente madura, já mais do que adulta, muitos talvez entrando na envelhescência. É sim, envelhescência, nunca ouviu falar? Então venha conosco que o tema hoje é sobre seu futuro.

Pra começar, uma frase do escritor francês Charles Lemesle:

Os homens são como os vinhos: só os melhores com a idade lucram em doçura o que perdem em força. Os outros azedam.

Este programa chega até você com o auxílio de quem está preocupado com nosso futuro, por isso cuida muito bem da cultura: Itaú Cultural.www.itaucultural.com.br

[showhide title=”Ler o roteiro completo do programa” template=”rounded-box” changetitle=”Fechar o roteiro” closeonclick=true]

Vinde, vinde, moços e velhos

Vinde, vinde
moços e velhos
vinde todos, apreciar.
como isso é bom,
como isso é belo.
como isso é bom,
é bom demais.

olhai, olhai,
admirai
como isso é bom,
é bom demais.

Como é bom né? Você está ouvindo, no podcast, Antônio Nóbrega seu VINDE, VINDE MOÇOS E VELHOS!

E é com esse som que vamos anunciar o ganhador do prêmio da semana? Desta vez será um exemplar de meu livro BRASILEIROS POCOTÓ, devidamente autografado. E o premiado foi o Francisco Ramos que deixou uma mensagem no podcast 222 – Caminho das Índias, dizendo assim:

“Olá Luciano, este não é o primeiro comentário que faço aqui, já me manifestei algumas poucas vezes quando tenho algo a acrescentar e algumas vezes via twitter, pois eu tenho o costume de ouvir podcasts na rua e o twitter é a forma mais prática de se comunicar em trânsito. Este podcast é um dos meus favoritos desde 2006 e confesso que se não me expresso muito é pela minha condição de aprendiz. Quando escuto o podcast fico lá, quietinho, prestando atenção como uma criança com os olhos vidrados no contador de histórias e sem se atrever a dar um piu sequer para não atrapalhar. Sei que estou errado mas só me acho digno de me expressar quando tenho algo a acrescentar.
Luciano, muito obrigado pelos 222 programas!”

De nada Francisco! E pare com essa história. Todo mundo tem muito a acrescentar. E agora prepare-se pra receber seu exemplar do Brasileiros Pocotó!

E você aí? Ficou com inveja? Então faça como o Francisco, deixe um comentário na página do podcast em www.portalcafebrasil.com.br! O próximo prêmio pode ser o seu.

Meu amigo Marcio Fleury manda um texto de autoria de Antonio Fábio Ribeiro, chamado ENVELHESCÊNCIA, que vou usar para abrir o programa.

Ao fundo você ouvirá um hino para os envelhescentes… O MILIONÁRIO, com os Incríveis, um tremendo sucesso de 1965, que é de autoria do inglês Mike Maxfield e foi gravado originalmente pela banda inglesa The Dakotas. Mas a versão dos Incríveis é melhor…

Somos crianças e, mais ou menos aos onze anos, iniciamos a nossa adolescência. No máximo aos 25, ingressamos na idade adulta.

Nessa fase tínhamos a obrigação de ter, fazer e ser. Ter casa, carro e uma gama de outros bens. Ser profissional, trabalhar, empreender, progredir, viajar, conhecer, casar, ter filhos e mais uma carrada de outras coisas. Ser socialmente aceito e adequado ao nosso tempo, competitivos, inteligentes, bem sucedidos, gostosos, desejados e muitos outros predicados ou modismos. Aos 55/60 anos, já éramos velhos, geralmente ancorados na casa de uma filha ou de uma nora.

Hoje, com o desenvolvimento da medicina e das ciências da vida, vivemos saudáveis até os 80 ou 90 anos. Entendo que o período da vida entre o fim da idade adulta e a velhice, quando tudo que poderíamos fazer já  foi feito: casar, separar, ter amante, ganhar e perder dinheiro, ser rico ou ser pobre, ter poder, aposentar, ter outra opção sexual, gira em torno de 20 a  25 anos.

Essa fase é a adolescência da velhice. Gosto de chamá-la envelhescência, procurando criar um neologismo para o nosso vernáculo. Defendo a tese de que nessa etapa da vida, temos o direito de fazer tudo o que gostaríamos e aquilo que desejarmos. Evidentemente, já não mais com a energia e a irresponsabilidade das aventuras e diabruras praticadas na juventude.

O meu, este aqui é o Café Brasil…você não achou que a gente ia te deixar curioso pra ouvir o The Millionaire com os Dakotas, não é? Lalá, mata a curiosidade da turma…

Fraquinho né?

Vou retomar o texto do Antonio Fábio.

A primeira coisa que temos a fazer é trabalhar a cabeça, para aceitar o balanço da idade adulta como ele se nos apresenta, zerando os nossos ganhos e perdas de natureza econômica, financeira, social, política, cultural, sexual e outros itens desse balanço (azedos e doces) do período que se perdeu nas brumas do passado.

O meu taxímetro continua girando e adentra, agora, em 2010, nos 68 anos contados, cronologicamente, como manda o figurino, fazendo um tic tac vigoroso. Há cinco anos, comecei a raciocinar como um envelhescente, fato que desejo oficializar, junto aos meus amigos e familiares. Estou considerando que o meu período de envelhescência vai até aos 83 anos, quando, apesar de relutante, passarei a aceitar a idéia de estar ficando velho.

Os anos da envelhescência são contabilizados por subtração até a data fatal, quando serão zerados. Neste ano de 2010, portanto, estarei comemorando os meus 15 anos. Em 2011, 14 anos e em 2018 estarei terminando a minha envelhescência e começando a minha velhice. Sempre fui um otimista, por isso, quando chegar à velhice, guardo a expectativa de que a medicina e as pesquisas, sobre a vida humana, apesar da quadradice dos governos e das igrejas, possam me surpreender. Quem sabe me leve a rever o conceito de envelhescência, esticando o período da sua duração?

Desejo, ardentemente, nesse período e na comemoração de cada um de meus novos recomeços, que antigamente chamávamos de aniversário, conviver com a plêiade de amigos que fiz ao longo da vida, notadamente, aqueles que, como eu, nasceram durante, ou um pouco depois da segunda guerra mundial, vivendo a sua fase adulta na metade de século mais rico que a humanidade conheceu em todos os tempos.

Mundo velho

Deus fez o mundo tão lindo,
Só belezas que rodeia.
Colocando lá no espaço
Lua Nova e Lua Cheia

Fez o sol e a luz divina
Que o mundo inteiro clareia,
No céu estrelas paradas
A lua e o sol passeia

Deus fez o mar azulado,
É o castelo da sereia.
Fez peixe grande e pequeno
E também fez a baleia.

Fez a terra onde formei,
Meu cafezal de ameia,
Baixadão cheio de água
Onde meu arroz cacheia.

Deus fez cachoeiras lindas
Lá na serra serpenteia.
Fez papagaio que fala,
Passarada que gorjeia.

Tangará canta de bando,
A natureza ponteia
Pros catireiros de penas
Que no galho sapateia.

Mundo velho mudou tanto
Que já está entrando areia.
Grande pisa nos pequenos,
Coitadinhos desnorteia

Quem trabalha não tem nada,
Enriquece quem tapeia.
Pobre não ganha demanda,
Rico não vai pra cadeia.

Na moral do velho mundo
Quem não presta pisoteia.
Os mandamentos de Deus
Tem gente que até odeia.

Igrejas estão vazias,
Antigamente eram cheias.
O que é ruim está aumentando,
O que é bom ninguém semeia.

Ó meu Deus venha na terra
Porque a coisa aqui tá feia,
Mas que venha prevenido,
Traga chicote e correia.

Tem até mulher pelada
No lugar da Santa Ceia.
Só Deus pode dar um fim
No que o diabo desnorteia

Olha só, você reconheceu a voz do Daniel ai no fundo né, que fez dupla com seu pai José Camilo interpretando MUNDO VELHO, um dos muitos sucessos da dupla Tião Carreiro e Pardinho. Olha só, o melhor do sertanejo de verdade você encontra é aqui, no Café Brasil!

E então encontro um texto de Mário Prata, chamado Você é um Envelhescente? O Mário é um grande escritor e sua visão do envelhecimento, como sempre, é muito bem humorada. Vamos ao nosso teste de envelhescência?

Ao fundo, no podcast, você ouvirá ninguém menos que OS VELHINHOS TRANSVIADOS, grupo fundando em 1960 por Zé Menezes, que veio lá de Juazeiro do Norte. Composto por músicos experientes, os Velhinhos gravavam músicas velhas com arranjos novos e novas com arranjos velhos, só pela bagunça. Foram 13 elepês lançados em 11 anos de carreira. Aqui eles vão com a inesquecível marchinha carnavalesca de Arlindo marques Jr e Roberto Riberti: NÓS, OS CARECAS…

Se você tem entre 45 e 65 anos, preste bastante atenção no que se segue. Se você for mais novo, preste também, porque um dia vai chegar lá. E, se já passou, confira.

Sempre me disseram que a vida do homem se dividia em quatro partes: infância, adolescência, maturidade e velhice. Quase correto. Esqueceram de nos dizer que entre a maturidade e a velhice (entre os 45 e os 65), existe a ENVELHESCÊNCIA.

A envelhescência nada mais é que uma preparação para entrar na velhice, assim com a adolescência é uma preparação para a maturidade. Engana-se quem acha que o homem maduro fica velho de repente, assim da noite para o dia. Não. Antes, vem a envelhescência. E, se você está em plena envelhescência, já notou como ela é parecida com a adolescência? Coloque os óculos e veja como este nosso estágio é maravilhoso:

– Já notou que andam nascendo algumas espinhas em você? Notadamente na bunda?

– Assim como os adolescentes, os envelhescentes também gostam de meninas de vinte anos.

Velho enferrujado

Chega pra lá
Seu velho enferrujado
Com cara de cegonha
Querendo me beliscar

Chega pra lá se não eu passo a agulha
Chamo a rádio patrulha pra te espetar
Chega pra lá se velho saliente
Não seja tolo
Vá lamber sabão

Se você ficar me beliscando
Ai careca de uma figa eu lhe meto a mão
Ai careca de uma figa eu lhe meto a mão

Hoje em dia não se pode
Ir ao cinema sozinho
Vem logo um velho com cara de bode
Todo treme, treme pra tirar casquinha

E se agente acha ruim o velho de perto não sai
E ainda diz assim
Olha menina mais respeito
Eu posso ser seu pai
E fica se babando mas dali não sai
Ai menina mais respeito eu posso ser seu pai

Rrarraa…você ouviu Isaurinha Garcia com VELHO ENFERRUJADO, de Gadé e Valfrido Silva. O órgão ao fundo é de Walter Wanderley, claro e o ano é 1949… Não sei se rio ou se choro…

E retomando o texto do Mário Prata.

– Os adolescentes mudam a voz. Nós, envelhescentes, também. Mudamos o nosso ritmo de falar, o nosso timbre. Os adolescentes querem falar mais rápido os envelhescentes querem falar mais lentamente.
– Os adolescentes vivem a sonhar com o futuro os envelhescentes vivem a falar do passado. Bons tempos…

– Os adolescentes não têm idéia do que vai acontecer com eles daqui a 20 anos. Os envelhescentes até evitam pensar nisso.

– Ninguém entende os adolescentes… Ninguém entende os envelhescentes… Ambos são irritadiços, se enervam com pouco. Acham que já sabem de tudo e não querem palpites nas suas vidas.

– Às vezes, um adolescente tem um filho: é uma coisa precoce. Às vezes, um envelhescente tem um filho: é uma coisa pós-coce.

– Os adolescentes não entendem os adultos e acham que ninguém os entende. Nós, envelhescentes, também não entendemos eles. “Ninguém me entende” é uma frase típica de envelhescente.

– Quase todos os adolescentes acabam sentados na poltrona do dentista e no divã do analista. Os envelhescentes, também a contragosto, idem.

– O adolescente adora usar uns tênis e uns cabelos. O envelhescente também. Sem falar nos brincos.

– Ambos adoram deitar e acordar tarde.

– O adolescente ama assistir a um show de um artista envelhescentes (Caetano, Chico, Mick Jagger). O envelhescente ama assistir a um show de um artista adolescente.

– O adolescente faz de tudo para aprender a fumar. O envelhescente pagaria qualquer preço para deixar o vício.

– Adolescentes e envelhescentes bebem escondido.

– Os adolescentes fumam maconha escondido dos pais. Os envelhescentes fumam maconha escondido dos filhos.

– O adolescente esnoba que dá três por dia. O envelhescente quando dá uma a cada três dia, está mentindo.

– A adolescência vai dos 10 aos 20 anos: a envelhescência vai dos 45 aos 60. Depois sim, virá a velhice, que nada mais é que a maturidade do envelhescente.

– Daqui a alguns anos, quando insistirmos em não sair da envelhescência para entrar na velhice, vão dizer:

–  É um eterno envelhescente!

Que bom.

E daí? Você é um envelhescente? Se ainda não é, não se preocupe, viu? Você vai chegar lá…

E quem melhor pra falar das coisas do envelhecimento que Rubem Alves?

Ao fundo, no podcast, estamos ouvindo CHEGA DE SAUDADE, de Tom e Vinícius com Mauricio Einhorn, Sebastião Tapajós, Gilson Peranzetta e Altamiro Carrilho. Esta maravilha está no CD Encontro de Solistas….

Ao meio dia se faz trabalho e política. Ao crepúsculo se faz poesia.

Quando o sol está a pino estas idéias não nos perturbam. Tudo parece estar bem. Tem muito tempo ainda.

As rotinas do trabalho ocultam nossa verdade. Mas elas não podem impedir nem que a tarde chegue, com suas cores de adeus, nem que o outono chegue, anunciando a proximidade do inverno.

E eles nos forçam a ter pensamentos diferentes, pensamentos de solidão. São mestrs silenciosos. Se prestarmos atenção e ouvirmos o que nos dizem, ficaremos sábios…

E na sala da TV da casa daquele casal meio idoso, no intervalo da novela das 8 o velhinho levanta e a mulher pergunta:

– Aonde você vai?

– Na cozinha.

– Você não quer me trazer uma bola de sorvete?

– Claro!

– Não vai escrever isso no caderninho?

– Ah, vamos, não vou me esquecer disso!

– Então me coloque calda de morango por cima. Mas escreva pra não esquecer…

– Vou me lembrar disso também, c’o a breca! Você quer uma bola de sorvete com calda de morango, certo?

– Sim, mas coloque um pouco de chantilly em cima, e lembre-se do que o médico nos recomendou: escreva no caderninho!

– Mas que saco, já disse que vou me lembrar!

Em seguida, vai pra cozinha. Passados uns vinte minutos, volta trazendo um prato com dois ovos fritos.

A mulher, com sorriso irônico nos lábios olha para o prato e exclama:

– Não disse que você ia esquecer as torradas?

Velho no metro

Que será que o velho pensa no metrô
O que que será que o nenê pensa no berço
Que será que o velho pensa no metrô
O que que será que o nenê pensa no berço

As rugas dos velhos determinam as idades
Assim como os gomos das árvores
Os olhos do nenê enxergam os anjos
Assim como os anjos protegem você

Que será que a menina tá pensando
No banco da praça
Olha só que engraçado aquele homem
Comendo uva passa
E passa tempo passa hora passa ano
E o cabelo branqueando
As rugas na minha cara aparecendo
Talvez esteja envelhecendo

E é assim, ao som de O VELHO NO METRO com, é claro, o Karnak que nosso Café Brasil dos envelhescentes chega ao final. E aí, meu? Tá se preparando pra envelhescência? Quanto mais cedo começar, melhor, viu? Palavra de evelhescente!

Com o jovial Lalá Moreira na técnica, a adolescente Ciça Camargo na produção e eu, o aborrescente Luciano Pires na direção e apresentação.

Estiveram conosco Antônio Nóbrega, Daniel e seu pai José Camilo, Os Velhinhos Transviados, Os Incríveis, The Dakotas, Isaurinha Garcia, Mauricio Einhorn, Sebastião Tapajós, Gilson Peranzetta e Altamiro Carrilho e claro, o Karnak.

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E pra terminar, uma frase dele, é claro, Rubem Alves.

Quem é rico em sonhos, não envelhece nunca. Pode até ser que morra de repente. Mas morrerá em pleno vôo. O que é muito bonito.

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