Café Brasil 299 – Desobediência civil
Luciano Pires -Bom dia, boa tarde, boa noite! Num de nossos programas anteriores, o Mexe-mexe, fizemos uma provocação sobre a necessidade de se tirar a bunda da cadeira para fazer acontecer.
Hoje parece que nos transformamos em militantes do tuíter e do Facebook. Gente que escreve sua indignação e fica por isso mesmo, jamais provocando uma ação efetiva. Vamos mais fundo nesse tema hoje.
Pra começar, uma frase de ninguém menos que Raul Seixas:
A desobediência é uma virtude necessária à criatividade.
Este programa chega até você com o apoio de gente que sabe muito bem como colaborar para a ação: desenvolvendo a cultura. Itaú Cultural, www.itaucultural.org.br. Acesse o site e descubra um mundo de opções para quem quer ampliar sua percepção sobre o mundo.
+ Ver roteiro completoE o exemplar de meu livro NÓIS…QUI INVERTEMO AS COISA da semana vai para …para… Adavilso Sartori, tá ganhando o segundo livro. Ele já ganhou um, porque comentou os vidiocasts e as iscas intelectuais. Ele comentou assim o programa MEXE-MEXE e de um jeito que acho que nem eu faria…
“Caro Luciano, há tempos rumino algumas ideias sem tempo para utilizá-las em um singelo comentário. Pois bem, um podcast sobre resignação era o impulso que eu precisava. Há alguns dias ouvi o programa O Ouvinte Ativo e me identifiquei muito, e por aquelas doces coincidências da vida, era sobre esses temas que minhas ruminâncias ruminavam: ser ativo ou ser resignado. Dirijo o comentário aos nobres ouvintes.
Tomarei teu tempo com um longo comentário. Gosto de números! Então procurei alguns. Na página do Podcast Café Brasil, há um quadro onde indica que 3.721 pessoas curtiram a página no Facebook. Se formos só por esse indicador, que nem é assim tão significativo, e supuséssemos que cada um que curtiu, comentasse um podcast ao menos uma vez por ano, teríamos uma média de 71 comentários por programa. Que tal, hein? Mas que isso?
Esperar que um ouvinte do Café Brasil seja capaz de tirar o traseiro da cadeira apenas uma vez por ano é ridículo! Afinal são ouvintes ativos, ou são resignados, arrebanhados?
Então recalculando, um comentário semestral: 142 comentários por programa. Se for um comentário trimestral: 284 comentários por programa. Ahhh, aí sim a conversa está começando a ficar interessante.
Se você tem um sonho é preciso que a inteligência seja acionada para realizar esse sonho, e se você tem inteligência é preciso um sonho para ordená-la. Se você tem uma ideia, uma opinião, é preciso expressá-la para que exista provocando outras pessoas, se você é provocado, recebendo uma isca, é preciso internalizá-la, misturar com as tuas ideias e devolve-la ao mundo. Só assim há resultado. Esse processo todo é uma atividade, que precisa obviamente de pessoas ativas.
Certamente muitas pessoas ao ouvirem o programa sobre a resignação, irão balançar a cabeça concordando, dizendo: que absurdo, o brasileiro é mesmo resignado! E?
Meu caro ouvinte de podcast que não se dispõe a comentar o programa, VOCÊ É UM RESIGNADO. Não é só quem assiste o Big Brother Brasil, não é só quem baba no sofá assistindo programas dominicais, não é só quem não liga pra política. Você também é um resignado. Ou não tem ideias ou é um preguiçoso, o que dá no mesmo. Ideias só existem se saírem de dentro das cabeças de seus donos.
Talvez você diga: Mas o que eu posso fazer? Quem sou eu pra mudar isso? Te respondo: Não importa o que você pode fazer, desde que você faça tudo o que puder. Agora se não fores capaz de trazer tua opinião, de debater, de criar uma discussão, resigne-se com o título de resignado.
Parece um pouco de exagero tanto barulho simplesmente porque não há muitos comentários nos programas do Café Brasil, mas há uma razão simples.
Se não podemos esperar que as pessoas sejam capazes de pelo menos expressar suas ideias, sobre temas que lhes interessam, então há que se preocupar. Se os bons se calam perante o perigo, a esperança começa a perder espaço pro medo. Cansei de ver pessoas elogiando os programas, mas o melhor elogio é participar. Ouvir e concordar é fácil!
Tão fácil quanto se indignar com a notícia de corrupção do jornal, tão fácil quanto dizer que político é ladrão, tão fácil quanto jogar a culpa no outro.
Podcasts cheios de comentários serão a demonstração de que o brasileiro está deixando de ser resignado.
Isso mesmo, a mudança começa por você! E aí? Vai encarar ou tá com medinho?”
É isso aí Adavilso! Nada como um ouvinte para falar para os ouvintes… Aproveito o gancho do Adavilso pra comentar uma coisa sobre comentários no podcast.
Uma das formas mais importantes de mostrar que os podcasts são sim uma ferramenta com alta penetração é sua capacidade de mobilização das pessoas. E a principal forma de mostrar isso é pelos comentários dos ouvintes, que tem duas características: a quantidade e a qualidade. Quantidade é legal, mas um comentário que traz em seu texto simplesmente um gostei não é a mesma coisa que um comentário como o do Adavilso, que mostra que ele realmente investiu tempo numa discussão pertinente provocada pelo programa. Isso vale ouro e por isso insisto tanto. Podcasts são um processo que envolve quem faz e quem ouve e precisam demonstrar essa interação. A forma é: a gente fazendo e você comentando. Por isso insisto.
O Adavilso ganhou um livro pois comentou o programa. E aí?
Não sei se você já ouviu falar em Desobediência Civil. Já? Ou como diriam no interior, não já? A Desobediência Civil é uma das formas de expressão do direito de resistência, que é o direito que qualquer pessoa tem de resistir ou de se insurgir contra qualquer fator que ameace sua sobrevivência ou que represente uma violência a valores éticos ou morais humanistas.
Eu tenho medo dessa palavra humanistas… mas, vamos em frente.
O direito de resistência sempre esteve presente na história da humanidade, uma vez que surge como forma de defesa natural contra qualquer forma de opressão ao indivíduo ou a uma coletividade de pessoas. O direito de resistência tem lugar quando as instituições públicas não estão cumprindo seu fiel papel e quando não existem outros remédios legais possíveis que garantam o exercício de direitos naturais, como a vida, a liberdade e a integridade física. Além da Desobediência Civil, também são exemplos de resistência o direto de greve (para proteger os direitos homogêneo trabalhadores) e o direito de revolução (para resguardar o direito do povo exercer a sua soberania quando esta é ofendida).
O termo Desobediência Civil foi tornado famoso por um escritor norte americano chamado Henry David Thoreau que tornou-se famoso por seus escritos sobre vida natural no século 19, muito antes que a ecologia se transformasse no que é hoje.
Senhora liberdade
Nei Lopes e Wilson Moreira
Abre as asas sobre mim
Oh senhora liberdade
Eu fui condenado
Sem merecimento
Por um sentimento
Por Uma paixão
Violenta emoção
Pois amar foi meu delito
Mas foi um sonho tão bonito
Hoje estou no fim
Senhora liberdade abre as asas sobre mim (2x)
Não vou passar por inocente
Mas já sofri terrivelmente
Por caridade, oh liberdade abre as asas sobre mim (2x)
Que tal hein? …um sambinha gostoso, aliás, sambão, aliás HINO! Você ouve SENHORA LIBERDADE, de Wilson Moreira e Nei Lopes, que eu já toquei aqui, mas é irresistível. Esta versão tem Nei Lopes, Zé Renato e Wilson Moreira.
Insatisfeito com a vida em sociedade, Thoreau exilou-se voluntariamente numa cabana às margens do lago Walden, dentro de uma floresta em 1845, aos 27 anos de idade. Ele queria, conforme suas próprias palavras:
“Fui para os bosques viver de livre vontade,
Para sugar todo o tutano da vida
Para aniquilar tudo o que não era vida,
E para, quando morrer, não descobrir que não vivi!”
Seu livro mais famoso, Walden ou A Vida nos Bosques, é resultado dos dois anos em que ele viveu na floresta.
Decidiu não pagar impostos para não financiar a escravidão ou a guerra e numa visita à cidade foi preso, passou a noite na cadeia o que o inspirou a escrever seu livro A DESOBEDIÊNCIA CIVIL, obra que influenciou de Leon Tolstói a Mahatma Gandhi.
Bem, enquanto você se prepara para o que vem pela frente, uma pausa. Vamos tratar da promoção que pode colocar em suas mãos um iPod Touch. Se você não sabe o que é, vai procurar. É uma central multimídia fantástica. Com ele você poderá baixar o Café Brasil diretamente do iTunes! É muito fácil, quer ver?
Acesse www.facebook.com/componentesnakata (nakata com k) e publique um relato sobre uma ocasião em que você ficou na mão por falta de manutenção preventiva em seu carro. E depois peça pra seus amigos curtirem a historinha! A cada mês as três melhores histórias serão escolhidas e a que tiver mais curtir leva o iPod. Uma promoção da Nakata, que fornece componentes de suspensão e direção que jamais vão te deixar na mão.
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Arriscado é não usar Nakata. Exija a tecnologia original líder em componentes de suspensão. Tudo azul. Tudo Nakata.
Encontrei um texto legal de Tiago Mesquita em www.vivaviver.com.br, (alias, tem gente escrevendo pra mim perguntando porque eu nunca digo www ponto, vivaviver ponto, etc. Eu não digo por uma razão muito simples: é porque eu não gosto) www.vivaviver.com.br que trata de Thoreau e da Desobediência Civil. Aqui vai uma parte do texto.
Ao fundo você está ouvindo VOO SOBRE O HORIZONTE com o Azymuth, trio brasileiro fundado em 1970 que se você não conhece, não sabe o que está perdendo….
Em A Desobediência Civil, Henry Thoreau dispara verdade após verdade, anulando o esforço da máquina estatal de difundir o medo e encorajando o indivíduo a encontrar a força em suas próprias raízes.
O melhor governo é o que menos governa. Para Thoreau, a liberdade é a máxima existencial e sem ela não passamos de meros cadáveres ambulantes insinuando gestos mórbidos pela superfície de um grande cemitério. Precisamos antes de tudo ser governados por nós mesmos, aceitar o desafio de dar conta de nossos próprios passos.
A minha origem é nobre demais para que eu seja propriedade de alguém. Para que eu seja o segundo no comando ou um útil serviçal ou instrumento de qualquer Estado soberano deste mundo.
A Desobediência Civil surgiu durante a curta estadia de Thoreau dentro de uma prisão americana, acusado por sonegação de impostos. Foi lá entre quatro paredes, entre grades e trancas, que ele escreveu esse ensaio revolucionário, que logo se tornaria uma das obras mais lidas pelos amantes da libertação. Entre esses, Ghandi, um de seus mais sinceros admiradores.
Thoreau não é um pensador qualquer, mas um profundo estudioso da religião e da sabedoria humana, exibindo conhecimento da obra de grandes mestres. Num trecho do livro ele cita Jesus, ao falar de dinheiro, lembrando que foi dito dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus, sem deixar claro o que era de um e o que era do outro, pelo simples fato de que ninguém desejava realmente sabê-lo.
Mas é usando as palavras de Confúcio, que Thoreau reforça as bases contraditórias em que está sustentado o Estado e reflete sobre as implicações da razão no desenrolar dos fatos. Se um Estado for governado pelos princípios da razão, a pobreza e a miséria serão objeto de vergonha se um Estado não for governado pelos princípios da razão, a riqueza e as honrarias serão objeto de vergonha.
Henry David Thoreau foi tratado por alguns como um dos idealizadores do anarquismo. Já para outros, ele está mais para um precursor de um novo sistema de governo, mais dinâmico, fluido e íntegro. Por que então estará cada homem dotado de uma consciência?
Na minha opinião devemos ser em primeiro lugar homens e só então súditos. Não é desejável cultivar o respeito às leis no mesmo nível do respeito aos direitos. A única obrigação que tenho direito de assumir é fazer a qualquer momento aquilo que julgo certo.
A Desobediência Civil é um ensaio que virou livro pela alta relevância do conteúdo e pelo incontestável poder de expressão de Thoreau, capaz de encontrar os melhores argumentos para salvar o indivíduo das armadilhas das estruturas opressivas. Rápido de ler, mas digno de ser minuciosamente estudado. É um livro certamente útil para aprender a se erguer do status miserável de rebanho sem afundar na medíocre autoridade do pastoreio.
Canto livre
Lúcio Batista
Desse mundo que
Nada vou querer
Só meu canto é livre
Porque
Ando sem saber
Sem nem mesmo ter
Tempo pra poder amar
Você
Palco iluminado
Roupas coloridas
É mais um show
Que eu faço sem
Você
Olhando para cada menininha
Querendo que ali estivesse a minha
Caio na realidade
E choro em meu canto
Dessa multidão
Prisioneiro sou
Só meu canto é livre
Eu vou
Nesse mundo que
Ando sem saber
Sem tempo pra poder amar
Você
Nasce um sentimento
Cresce em meu ó pranto
E se levantar te ensinou
E vai
O amor que nasce agora entre a gente
Quebrando esse tabu indiferente
Vivendo em nossa américa
É livre o amor
Abraço meu
Palco abandonado
Onde nós sobrevivemos virgens
À crescer
À aprender
Tudo foi um sonho
Encoberto de rosas selvagens
Agora eu sei
Eu acordei
Desse mundo que
Nada vou querer
Só meu canto é livre
Porque
Dessa multidão
Prisioneiro sou
Só meu canto é livre
Eu vou
Que tal hein? Esse é CANTO LIVRE de Lúcio Batista em adaptação de Aroldo, Carlos Geraldo, Netinho e Pique, os integrantes da banda CASA DAS MÁQUINAS, que interpreta a canção. A Casa das Máquinas lançou três álbuns entre 1974 e 1978 que, ouvidos hoje, mostram a ebulição criativa daqueles anos. Casa das Máquinas, no Café Brasil.
Agora alguns trechos do livro A Desobediência Civil.
No entanto, quero me pronunciar em termos práticos como cidadão, distintamente daqueles que se chamam antigovernistas: o que desejo imediatamente é um governo melhor, e não o fim do governo. Se cada homem expressar o tipo de governo capaz de ganhar o seu respeito, estaremos mais próximos de conseguir formá-lo.
No final das contas, o motivo prático pelo qual se permite o governo da maioria e a sua continuidade – uma vez passado o poder para as mãos do povo – não é a sua maior tendência a emitir bons juízos, nem porque possa parecer o mais justo aos olhos da minoria, mas sim porque ela (a maioria) é fisicamente a mais forte. Mas um governo no qual prevalece o mando da maioria em todas as questões não pode ser baseado na justiça, mesmo nos limites da avaliação dos homens. Não será possível um governo em que a maioria não decida virtualmente o que é certo ou errado? No qual a maioria decida apenas aquelas questões às quais seja aplicável a norma da conveniência?
Costuma-se dizer e com toda a razão, que uma corporação não tem consciência mas uma corporação de homens conscienciosos é uma corporação com consciência. A lei nunca fez os homens sequer um pouco mais justos e o respeito reverente pela lei tem levado até mesmo os bem-intencionados a agir quotidianamente como mensageiros da injustiça.
Gostou das idéias do Thoreau? Mas vamos com cuidado, né? Em nome do direito de resistência como forma de defesa contra qualquer tipo de opressão ao indivíduo ou a uma coletividade, tem uma turma do balacobaco pintando e bordando no uso da lei contra a lei, da imprensa e de verdades simplificadas para atingir certos objetivos.
Isso é tema para um próximo programa. Por enquanto fique com a lição de casa: Olha só, no seu lugar eu compraria o livro do Thoreau, DESOBEDIÊNCIA CIVIL. Tem 80 páginas e merece ser lido e refletido. E mais. Tem pra baixar gratuitamente na internet, é só procurar. (http://www.superdownloads.com.br/download/167/desobediencia-civil-henry-david-thoreau/)
Heróis da Liberdade
Silas de Oliveira
Mano Décio da Viola
Manuel Ferreira
Passava noite, vinha dia
O sangue do negro corria
Dia a dia
De lamento em lamento
De agonia em agonia
Ele pedia o fim da tirania
Lá em Vila Rica
Junto ao largo da Bica
Local da opressão
A fiel maçonaria, com sabedoria
Deu sua decisão
Com flores e alegria
Veio a abolição
A independência
Laureando o seu brasão
Ao longe soldados e tambores
Alunos e professores
Acompanhados de clarim
Cantavam assim
Já raiou a liberdade
A liberdade já raiou
Essa brisa que a juventude afaga
Essa chama
Que o ódio não apaga pelo universo
É a evolução em sua legítima razão
Samba, ó samba
Tem a sua primazia
Em gozar de felicidade
Samba, meu samba
Presta esta homenagem
Aos heróis da liberdade
Ô, ô, ô, ôLiberdade senhor!
E é assim, ao som do samba enredo da Império Serrano de 1969 HERÓIS DA LIBERDADE, de Mano Décio da Viola, Silas de Oliveira e Manuel Ferreira, na voz fantástica de João Bosco, que o Café Brasil de hoje, levemente anárquico, vai saindo de mansinho.
Com o libertário Lalá Moreira na técnica, a anarquista Ciça Camargo na produção e eu, o preocupado Luciano Pires na direção e apresentação.
Estiveram conosco o ouvinte Adalviso Sartori, Tiago Sartori, Nei Lopes, Casa das Máquinas, Azymuth e João Bosco.
Este programa chega até você com o suporte do Auditório Ibirapuera, que há muito tempo sabe usar uma arma mortal contra a mediocridade: a música produzida por quem quer fazer arte. Visite o www.auditorioibirapuera.com.br e dê uma olhada na programação. Quem visita o auditório nunca mais esquece.
Este é o Café Brasil, um programa interessado em colocar um pulguinha atrás da suas orelha. Ou duas, quem sabe… Venha para www.portalcafebrasil.com.br e faça acontecer.
Pra terminar, é claro, uma frase de Henry David Thoreau:
A massa nunca se eleva ao padrão do seu melhor membro pelo contrário, degrada-se ao nível do pior.