Arte e ciências
alexsoletto - Iscas Científicas -Antes de mais nada, sei que estou atrasado e peço desculpas. Os filmes que vamos comentar, já até saíram do circuito de cinemas. Mas vamos lá… Podem xingar!
Aristóteles quando disse que, “…filosofia e ciência eram uma única coisa…” A “mesma coisa” do filósofo grego era por que, uma se inspiravam na outra freqüentemente. Por exemplo, nas artes cinematográficas.
Portanto, peço desculpas novamente, mas ainda vou falar um pouco mais de como as Ciências foram e são usadas por Hollywood para produzir grandes sucessos de bilheteria. Depois dos dois últimos textos, “Gravidade” e “Interestelar”, achei que encerraria o assunto por aqui. Engano. Dois grandes filmes lançados este ano, me fizeram voltar ao assunto. A saber, “A Teoria de Tudo” e “Jogo da Imitação”.
Hollywood sempre ganhou muito dinheiro com extraterrestres e barulhentas guerras interestelares. Viagem a Lua (1903); Guerra dos Mundos (1953); Viagem Fantástica (1966); Contatos Imediatos do Terceiro Grau (1977); O Exterminador do Futuro (1984); Jurassic Park (1993); Matrix (1999-2003); A Origem (2010). A lista dos sucessos é enorme. Por vezes a ficção adquire tamanha credibilidade que nos atinge literalmente. Orson Wells, um radialista americano, “apavorou” toda população de Nova York, transmitindo pelo rádio, a historia escrita por H.G. Wells, “A Guerra dos Mundos”, como se fosse uma invasão real de extraterrestres na Terra, a ponto de provocar correrias pelas ruas e acidentes reais com gente se ferindo. Na sua maioria, os filmes, abordando temas futuristas ou, vamos dizer, “pura futurologia”. Exageros e até alguns erros são cometidos desafiando as leis da física nos filmes. Por exemplo: na saga “Guerra nas Estrelas”, aquelas explosões barulhentas que ouvimos nas salas Cinemax da vida, simplesmente são impossíveis, pois como no espaço não há ar (atmosfera), não há propagação do som. Estando lá, não ouviremos nada, além de um profundo e angustiante silêncio.
Mudança de Paradigma
De “ET” para “Gravidade”, por exemplo, a mudança do padrão é notória. Saímos da pura ficção científica para algo mais consistente em termos de realidade científica. Em “Gravidade” tudo (quase tudo…) que ali acontece é permitido pelas leis da física. Não estamos falando mal do filme “ET” ou de outro qualquer, que são obras-primas do cinema (eu assisti várias vezes a todos), mas apenas como referencia. Parece que Hollywood resolveu agora contar, as histórias de personagens reais que poderiam efetivamente servirem de contato do terceiro grau com algum ET.
Stephen Hawking e a Teoria de Tudo
A história de “A Teoria de Tudo” descreve a vida do famoso físico inglês, (ainda vivo, o que é raro entre gênios científicos) Stephen Hawking, maravilhosamente interpretado pelo vencedor de melhor ator 2015, Eddie Redmayne. Felicity Jones faz o papel de sua primeira esposa, Jane Wilde . O físico, aos 21 anos de idade, foi diagnosticado com uma rara doença ainda sem cura, ELA, ou, esclerose lateral amiotrófica, que é degenerativa e paralisa todos músculos do corpo, mas que curiosamente, não afeta as funções cerebrais e nem as reprodutivas (sexuais). Na época os médicos não lhe derem mais do que alguns meses de vida que no entanto, lhe deram uma sobrevida de 52 anos (hoje com 73 anos completados em 8 de janeiro de 2015). Apesar de passar todos esses anos em uma cadeira de rodas, isso não impediu que sua força de vontade e genialidade, seguissem em frente. Ganhador de vários prêmios e mais muitas medalhas concedidas por seus trabalhos em física teórica, hoje é considerado entre os maiores cientistas já nascidos. Atualmente professor lucasiano emérito (cargo criado por Henry Lucas) da Universidade de Cambridge, cargo que foi ocupado por Sir Issac Newton. Atualmente trabalhando na busca de uma equação que una todas as quatro forças fundamentais da natureza – força forte, força fraca, eletromagnetismo e a força gravitacional – para explicar como funciona o Universo, dai o nome do filme “A Teoria de Tudo”, ou “Teoria do Campo Unificado”. Do macro mundo, (planetas, galáxias) ao micro mundo (átomos, partículas), o desafio da teoria é unificar essas quatro forças, principalmente a da gravidade com a força nuclear forte. O filme mostra a trajetória do físico, desde seu ingresso na Universidade de Oxford, sua relação com sua futura esposa Jane Wilde, (de importância vital para o sucesso do cientista, com quem teve três filhos. Foi ela quem escreveu o livro no qual o filme se baseou). Em 1988, Hawking publica seu primeiro livro, “Uma “Breve História do Tempo”. Sucesso com 20 milhões de exemplares vendidos (em perto de trinta idiomas) em uma linguagem menos hermética do que a usual das Ciências. Em 2001 lança seu segundo livro: “O Universo Numa Casca de Noz”. O sugestivo título foi inspirado na peça “Hamlet” de Shakespeare, no ato 2, cena 2: “Eu poderia viver recluso numa casca de noz e me considerar rei do espaço infinito”. Também bem sucedido, vendeu outros milhões de copias. Em 2003 com a ajuda de sua filha Lucy, também um livro infantil “A Chave Secreta de George para o Universo”, que se propunha a explicar alguns conceitos de ciências para crianças. Curiosamente o complexo físico defensor da existência dos buracos negros, recentemente declarou que, estes podem até não existir e que eles emitem uma espécie de radiação e que perdem energia com isso. Hoje a comunidade científica tem a certeza que os buracos existem e concordam também que eles emitem radiação conhecida como “Radiação Hawking”. com humildade e humor, coisa rara em gênios, veio à publico confessar que estava revendo sua teoria anterior a respeito aos buracos negros e que na verdade, segundo o físico, não é como ele e parte da comunidade científica acreditavam até então.
Alan Turing e O Jogo da Imitação
Os filmes “O Jogo da Imitação” e “A Teoria de Tudo” foram lançados em circuito comercial, praticamente ao mesmo tempo. Os dois estão na categoria de cinebiografia. E eles tem muito em comum. Ambos descrevem histórias reais de personagens com problemas pessoais dramáticos (Stephen Hawking, com sua doença degenerativa e Alan Turing, com seu homossexualismo). Relatam suas atividades profissionais e suas vidas amorosas. E ainda, no caso do “O Jogo…”, temos como ingrediente infalível, a IIa Guerra Mundial. Os atores dos personagens principais, Benedict Cumberbatch (O Jogo…) e Eddie Redmayne (A Teoria…) foram indicados ao Oscar de melhor ator. Eddie Redmayne acabou, merecidamente, levando a estatueta.
Alan Turing
Alan Touring (1912-1954) foi um visionário. Conhecido como “Pai da Ciência da Computação”, também é considerado pioneiro no desenvolvimento dos conceitos da IA, ou Inteligência Artificial. Um artigo escrito por Alan no termino da 2a Grande Guerra, o “Computing Machinery and Intelligence” é considerado como marco inicial do desenvolvimento da inteligência artificial. Só após o surgimento dos computadores modernos é que a IA se desenvolveu para valer e pode assumir o status de Ciências. Assunto antigo nas mentes mais brilhantes do planeta, ainda é um desafio para seus pesquisadores. Alan criou um famoso teste para se determinar se um computador é dotado de inteligência artificial, ou não. Consistia em colocar homem e máquina em um lugar fechado (sem vidros) e um operador do lado de fora fazendo perguntas, sem saber qual deles estava respondendo. Analisando as respostas, o operador de fora, tinha que dizer se o computador ou se o homem estavam respondendo. Se fosse afirmativo para o computador, este poderia ser considerado possuidor de inteligência artificial. O exemplo moderno mais famoso de uma inteligência artificial em operação foi a partida de xadrez entre o computador “Deep Blue” da IBM e o enxadrista russo campeão mundial, Garry Kasparov, em 1997. A conclusão da partida, nós já sabemos: vitória com um xeque-mate inesperado e, de certa forma assustador, da máquina. Para a época uma parafernália de painéis, números e chips estava muito próximo à ficção científica…
Marian Adam Rejewski
Já ouviu falar? Pois é… Longe de querer tirar a genialidade de Alan Turing, também é preciso contar a história, o mais próxima da realidade possível. Marian Rejewski foi um matemático e criptoanalista polonês, que foi meio “esquecido” ao se contar a história dos primórdios do processo da descodificação da Máquina Enigma. Por volta dos anos de 1930, o Biuro Szyfrów (departamento de cifras e códigos do serviço secreto polonês), ao descobrir que novos códigos (eles começaram a usar uma matemática combinatória, baseados exclusivamente em ações de origem mecânicas) estavam sendo usados nas máquinas alemãs de codificação, contratou alguns matemáticos para tentar solucionar esse novo desafio. Entre eles estava Marian Rejewski, que não demorou muito para descobrir alguns pontos fracos nas novas máquinas alemãs.
Em 1939 com a invasão nazista da Polônia, Marian fugiu para a França e depois para a Inglaterra. Lá (em Boxmoor) em um beaureau de decifração, começou a trabalhar para os aliados no setor de decifração de códigos. Mas o matemático, curiosamente, nunca foi designado para colaborar em Blethcley Park, onde foi Alan Turing quem assumiu o comando de seus trabalhos.
Fatos e Versões
É bastante comum neste meio de gênios e de descobertas geniais, os egos e interesses diversos, baterem de frente. As versões as vezes são mais divulgadas e aceitas do que os fatos em si. Exemplos: o avião foi criado pelos Irmãos Wright; Thomas Edson inventou a lâmpada eletrica; Einstein disse que “Tudo é relativo”; Darwin escreveu que “O homem descende do macaco”. Recentemente descobri (não sabia!) que Einstein escreveu de próprio punho, uma carta à Comissão de Premiação Nobel, indicando o nosso Marechal Rondon ao premio Nobel da Paz!
Colossus de Alan versus o Enigma Nazista
O Colossus (primeiro computador eletrônico programável) nasceu em 1943, no Post Office Research Laboratories em Dollis Hill ao Norte de Londres, no Bletchley Park. E já nasceu para trabalho pesado. Na época para uma única missão quase impossível. Inverter o jogo da IIa Guerra Mundial. Seu desafiante era a máquina de decodificação alemã, a Enigma. Os precursores da Enigma (1923) foram construídos por um comerciante da Baviera, Arthur Scherbius, e era destinado aos empresários que sabiam que, um dos pilares para obter sucesso nos negócios, era a manutenção em segredo, do desenvolvimento dos seus produtos. Anos depois a máquina saiu de circulação publica e foi servir ao IIIo Reich que utilizava um numero enorme de combinações para codificar e trocar mensagens entre as forças militares alemãs. Uma (e na verdade outras mais) das Enigmas, foram capturadas pelo aliados, normalmente existentes em submarinos alemães dos temidos U-boats.
No campus do Bletchley Park, haviam as “cabanas” ou “Hut” em inglês. A primeira Hut foi inaugurada em 1939. Oito delas, faziam parte do complexo que desenvolvia os trabalhos de espionagem e decifração de códigos alemães. Nas cabanas Hut 4 e Hut 8, estavam concentrados os esforços da equipe chefiada por Alan. O filme mostra as cabanas com grande realidade, dando uma sensação de credibilidade às cenas.
A máquina Enigma alemã era terrível. Ela trocava seus códigos de segurança, todo dia. Assim os aliados tinha até o inicio de cada noite para decifrar as mensagens. Era de enlouquecer! Alan, perseguido de perto pelo Comandante da Marinha inglesa, Denniston, que achava que sua equipe estavam gastando dinheiro a toa, conseguiu resistir e quebrar enfim os segredos da Enigma. O próprio Churchill precisou intervir. Neste momento surgem algumas cenas mais dramáticas do filme. Empolgados com o feito, a equipe (Projeto Ultra) tenta avisar aos seus superiores para relatar o feito. Alan os impede veementemente. Depois de levar alguns socos e ouvir xingamentos, ele consegue convencer a todos que não poderiam divulgar a descoberta por que assim os alemães também ficariam sabendo da quebra dos códigos, o que poria tudo, literalmente, por água abaixo. Um dos membros da equipe pede a Alan reconsiderar a decisão por que, em dos navios britânicos que corria grande risco de ser afundado, seu irmão servia à Marinha. Nada pode ser feito. Os historiadores da IIa Guerra defendem que o conflito mundial terminou quase dois anos antes, o que salvou a vida de muitos. De fato a equipe e alguns poucos, decidiam que navio seria avisado e qual não. Alem desse drama, Alan também enfrentou seu drama pessoal, a sua homossexualidade. O matemático foi denunciado, acusado pela sua preferência sexual e condenado à castração química em 1952. Curioso saber que, a Inglaterra ainda considerava comportamentos homossexuais como crime, até final da década de 1960! Dos quase 50 mil homens (alguns falam em 75 mil) condenados por esse “crime” apenas três deles foram “perdoados”. Em 24 de dezembro de 2013, a Rainha “perdoou” Alan Turing pelo seu crime. O correto seria Alan perdoar a Rainha, não?