Em nome do amor (revisitado)
Labi Mendonça - Iscas Anarquiscas -Eu já toquei neste assunto antes. Fui ler o que havia escrito e achei que se mantém verdadeiro. Acredito que seja válido rever e acrescentar no tema.
A palavra amor, ao longo dos últimos milênios, foi muito explorada, desgastada, descaracterizada de sua origem essencial. O amor pressupõe um querer bem tão intenso e integral que se torna incondicional. Acredito que tenha surgido na tentativa de definir a relação de fé entre o homem e sua adoração temente a Deus. Uma divindade que já vem embutido na crença ancestral dos povos mais primitivos, e que foi com o tempo sendo mais bem arquitetada pelas diferentes religiões. Ora, neste caso, o amor é um estado de adoração muito elevado, comparável somente ao que uma mãe consegue nutrir por seu filho. As outras demais formas de gostar e querer bem, por serem condicionais, não deveriam ser chamadas de amor. É uma falta de respeito com essa definição. Mas a necessidade de “vender” o amor enquanto sentimento adquirível, através de produtos, gestos e declarações, foi fazendo com que esse sentimento tão nobre e sublime, fosse perdendo seu encanto e força, sua essência original. Acabaram com ele.
O tema é sempre recolocado na mente das pessoas em virtude da pressão comercial dos dias comemorativos, como dia dos namorados, dia dos pais e das mães, dia das crianças, e o explorado Natal ou dia de ação de graças. Ou ainda, dia da família. O que pretendem com isso, é, sempre, estimular o consumo, e promover atitudes materialistas de generosidade. Provas materiais e concretas que tentam fazer passar por gesto de amor.
Engraçado, a despeito desse amor capitalista e materialista de comprar e dar presentes, declarando seu amor a alguém, tentando provar com a prenda, que o sentimento é real, eu sinto as pessoas agindo sem consciência do que fazem. Cada vez mais egoístas e egóicas.
Vejo a maioria muito voltada para si, pessoas angustiadas com suas carências. Acho que o individualismo vem aumentando muito, a despeito da falsa impressão do compartilhamento exacerbado nas redes sociais. Todos se fazem de bonzinhos e amigos, mas estão olhando apenas para seu umbigo, preocupados com seus próprios desejos.
Há milênios as sociedades e religiões “vendem” o amor como sentimento essencial, mas suas atitudes provam que não praticam esse princípio. A ganância materialista, o egoísmo, o individualismo vão a cada dia se consolidando, tornando o homem mais frio e destrutivo, embora se declare o inverso, e mostrando que esse “falso conceito” de amar, torna-se cada vez mais vazio.
Ser amoroso é uma característica de algumas pessoas, que nascem com isso, independente de serem ricas ou pobres, serem mais instruídas ou mais ignorantes. Mas a vida em sociedade, e os exemplos que as pessoas vão tendo diante do comportamento da maioria pode detonar essa essência, tornando o ser amoroso um retraído, desconfiado e inseguro. E até egoísta.
Os preconceitos, ódios, vinganças, ganâncias ocupacionistas continuam movendo povos e pessoas, gerando conflitos, guerras, destruição e mais violência. O amor é vilipendiado sempre, e se pratica toda essa maldade em nome de um futuro, idealizado e hipotético amor.
O resultado é que, numa atitude egoísta, possivelmente originada da necessidade de autopreservação, o indivíduo perde seu contato com a sua própria essência e se espelha no outro, num mundo exterior que ele não consegue resumir nem sintetizar. Clona o externo.
No geral a pessoa acaba perdendo sua identidade, mesmo que na sua página do Facebook pareça que ele tem passado, presente e se projeta no futuro em harmonia com o mundo, amparado por amigos virtuais que existem ali naquela tela luminosa, mas que nem sempre se preocupam mesmo com o outro. Ele está se tornando um conceito virtual falso, já que na realidade ele não é como se apresenta.
Eu ainda vejo muita gente sem saber o que deve alimentar. A maioria das pessoas vive voltada para o que quer ter e não para o que deve ser, e a sensação que se tem é de que os valores morais e éticos perderam o sentido, e todos parecem viajantes perdidos no tempo, buscando possuir o que lhes pode satisfazer a necessidade material, mesmo que o emocional e afetivo sejam somente amenizados com prendas e lembranças. Muitos falam de autoconhecimento, mas poucos querem olhar de frente para seu próprio Eu Real.
Mesmo quando amantes se presenteiam, e juram amor sem fim, existe muita solidão no interior da maioria das pessoas, angústia por um futuro que parece agressivo, insegurança de não agradar ao padrão estético da moda, falta de conteúdo nos posicionamentos em relação ao social e coletivo, falta de certeza ideológica e filosófica, falta de confiança na solidariedade do outro em relação aos próprios anseios, falta de foco no que deve ser objetivado na vida de nossa sociedade, e falta de coragem de olhar de frente para seu próprio problema e defeitos. O mundo vai cada dia mais sendo ocupado por esses seres daninhos, e não mais amorosos.
Gente convive lado a lado, corpos compartilhados, fluidos sexuais trocados, corpos penetrados, tetos comuns, compromissos conjugais assumidos, famílias e familiares dependentes, numa situação que beira o paradoxo, onde muitos estão juntos, mas não sabem se são felizes, e muitos se separam buscando ser felizes. Alguns buscam se juntar imaginado ser felizes, mas não abrem mão de nada, nem aprendem a se entregar verdadeiramente, amorosamente, e a grande maioria, atravessa sua trajetória pela vida, como uma boiada, que não questiona a marcha para o abatedouro, até na hora em que cada um se depara com a morte.
Afinal, sentimos uma imensa necessidade de ter um amor, mas nem sempre estamos preparados para entender o verdadeiro sentido do amor. O homem moderno estaria de fato aprendendo a ser melhor e mais sadio em nome do amor? A despeito de todas as declarações neste sentido?
As respostas devem ser encontradas dentro de cada um. Caso tenha dúvida, passe seu cartão de crédito, faça sua inscrição, e se informe em algum dos milhares de sites onde os teóricos das filosofias, seitas, religiões, horóscopos e runas, podem aconselhar como definir o seu presente e seu futuro.
Eu, que sou irreverente e mais pé no chão, estou olhando para o que diz meu coração. Cheguei até a listar algumas regrinhas básicas de sabedoria, que ajudam bastante na realização de ser melhor a cada dia. E agora, tentando ser coerente, declaro que continuo na minha busca. Seguindo em frente para ver onde e como ser verdadeiramente feliz. E você?