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Hipérboles Olímpicas

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Fernando Lopes - Iscas Politicrônicas -

                                          A piada é antiga: Em uma cidade da França, havia várias padarias numa mesma rua, separadas por alguns quarteirões. À porta da primeira lia-se: “O melhor pão da cidade”. Metros à frente, a concorrente anunciava: “Aqui, o melhor pão da região”; e na seguinte: Temos o melhor pão da França!” A última padaria anunciava, candidamente: “O melhor pão da rua toda”.

                                          Pois é. Muitas vezes o segredo está em prometer apenas o possível; uma lição simples, efetiva, muito mais eficiente que exageros descabidos. E, vejam só, até mesmo num país doentiamente ufanista como a França, cujo maior herói é um nanico que se rendeu duas vezes (para o mesmo inimigo), e orgulha-se do famoso Arco do Triunfo, que celebra derrotas como se fossem vitórias. Impressionante a cara de pau deles.

                                          Não ficamos atrás (bom; menos em rendições, nisso eles são campeões mundiais) com as Olimpíadas. Aqui, desde que o mundo é mundo, confundimos intenção com realização, e nesse item (promessas) até o primeiro escalão das maiores figuras da república transforma-se em meros vereadores boquirrotos de alguma cidadezinha do interior, empenhados em revogar uma tal lei da gravidade.

                                          Incomoda muito ouvir, desde a coroação do Rio de Janeiro como capital olímpica, que tudo será perfeito, a melhor Olimpíada da História, tudo maravilhoso na cidade mais linda do mundo, que o planeta se curvará diante do Brasil, e outras bravatas repetidas por nossas autoridades. Que ridículo. O governador fluminense em exercício garantiu que serão estas as maiores e melhores Olimpíadas da História. Dilma não deixou por menos; antes de ser afastada, disse que um novo padrão de excelência seria criado, e as futuras sedes mundiais teriam dificuldade de acompanhar tamanha opulência e tecnologia de ponta. Sim, Dilma – a mesma que quis ensinar macroeconomia aos alemães.

                                          Seria muito mais correto prometer menos e realizar mais, em lugar de vender uma imagem que simplesmente não existe. Taí a gama de defeitos nos alojamentos para atletas, a imundície da lagoa Rodrigo de Freitas, as doenças epidêmicas, turistas assustados, infraestrutura deficitária – coroada por um sistema de transporte capenga. Mesmo diante dessa dura realidade, os discursos grandiloquentes, hiperbólicos, de um exagero patológico, não diminuem. Pior: Se há crítica (merecida ou não), deveria ser recebida com educação, jamais devolvida com grosseria, sem uma resposta coerente.

                                          Exemplo: A goleira americana Hope Solo postou fotos exibindo um vasto arsenal contendo roupas contra insetos, repelentes, chapéu com tela e etc. Um risível exagero (proposital ou não), que foi “respondido” da pior forma possível por nosso técnico da seleção feminina de futebol. Esse senhor alegou, sem explicar ou justificar nossos problemas, que os EUA são um país “muito pior”, e que leva “colete à prova de balas” quando viaja para lá – um país onde “todo mundo atira em todo mundo”. Perdeu uma excelente chance de ficar quieto; reagiu como se tivessem xingado sua mãe, em vez de admitir que sim, há uma série de problemas, inclusive de doenças transmitidas por mosquito, e demonstrar quais as medidas tomadas para solucioná-los ou amenizá-los. Enfim, atitude que qualquer dirigente sério tomaria – ou deveria tomar.

                                          Mas não adianta. Somos atavicamente, geneticamente, teimosamente imunes à realidade. Sonhamos com um futuro perfeito que cairá em nosso colo por puro merecimento, bastando samba, ginga, simpatia e malemolência. Sempre deixamos de lado o projeto, o ensaio e o trabalho duro, que colhem os verdadeiros louros da vida e o reconhecimento alheio. Ficamos somente com a ideia e o desejo, vício advindo, em boa parte, dessa política doente, paternalista, demagoga, que nos aflige há tanto tempo, com as conhecidas consequências deletérias. O aluno não passa de ano? Em lugar de ensiná-lo corretamente, cria-se a aprovação automática. Alguma parcela do povo não chega à universidade? Em vez de base educacional e conhecimento, optamos por enfiá-los pela porta dos fundos, via cotas. Não tem trabalho? Vai de bolsa-tudo. Tem Zika? É só alegar que no inverno ela diminui; e afinal, o verão tá tão distante… Tiroteio nas ruas cariocas, traficantes, sequestradores e assaltantes sem fim? Basta desviar das balas (perdidas ou achadas) e ridicularizar Miami como “muito mais perigosa”, ao estilo absurdo do tal técnico brasileiro. Que ridículo, meu Deus. As uvas continuam verdes, meu caro Esopo.

                                          E assim vamos. Aqui, uma simples ideia inicial, uma mera intenção, é comemorada como vitória final, independente dos resultados. É a nossa cachaça, nossa ilusão, nosso vício – ao qual nos agarramos, chorosos e jecas como de fato somos. Mas, sinto alertar, a imensa maioria do resto do mundo decente deixou há muito de padecer dessa infantilidade de criança birrenta. Não cola mais. Bom, talvez na França, mas isso é outro assunto.

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