O discurso não conta
Labi Mendonça - Iscas Anarquiscas -Eu nem ia mais publicar este texto. Pensei que já estava ultrapassado, pois comecei a elaborar durante o período eleitoral. Acontece que a eleição passou, o horário político gratuito na TV passou, a síndrome do tudo ou nada passou, os extremistas ficaram sem quórum para movimentos golpistas ou de impeachment, e eu pensava que não havia mais motivo para eu falar sobre o que pretendia. Só que não…
Agora, ainda mais do que nunca vejo as pessoas crentes, iludidas, agarradas a textos, matérias, notícias, falas, discursos, pronunciamentos, promessas… Como ocorreu no período eleitoral.
Muito admirado, me surpreendo quando vejo um Arnaldo Jabor do alto do seu vocabulário articulado e mordaz, tentar passar um discurso, um pensamento, uma reflexão, (não importa se certa ou errada) para o seleto público da noite do Jornal Nacional, construindo uma opinião (seria?), sobre algum assunto, geralmente político. Retórico.
Outro susto ao ver o Jo Soares, no meio do seu Talk Show, no dia em que rodeado das “Meninas do Jo”, jornalistas e comentaristas, tomar a palavra e construir um texto que buscava justificar Evo Morales. Valeu pelo susto estampado no rosto das suas parceiras de mesa. Poucos entenderam o que significava aquilo.
Do mesmo modo que eu via e ouvia na campanha um Aécio Neves candidato prometendo “mudar o Brasil” com uma desfaçatez que me apavorou demais. Como se fosse fácil, possível e exequível. Todos podem falar e prometer è vontade, não faz a menor diferença se é ou não é… O que interessa é ganhar.
A candidata do Governo, não prometeu tanto, mas também entrou na dança do discurso, do vai fazer e acontecer, do vai mudar e vamos ter… Como se fosse acontecer… Apavorado, eu vejo que a maioria das pessoas ainda acredita no papo falado, nas promessas, nos discursos, no bla-bla-bla, que não se concretiza nunca, nas matérias de jornal, nas reportagens das publicações vendidas aos interesses dos que jogam o jogo do poder.
O que me surpreende, é que isso revela por parte de todos eles, uma visão equivocada do Brasil e de como as coisas são no mundo. Faz muito tempo que nada do que se fala é o que acontece. Por décadas eu vejo essa situação se agravando. Pouco do que se fala se torna verdade e acontece como foi dito. É assim no governo, é assim na (in)justiça, é assim na imprensa, é assim nas empresas, é assim na economia, é assim nas relações internacionais, é assim no processo de disputas de poder no mundo global.
Até contratos, selados com cláusulas rigorosamente elaboradas, são desconsiderados e aviltados, obrigando que as partes prejudicadas tenham que arcar com longos, custosos, demorados e complicados litígios legais, para tentar defender direitos e salvar processos não levados a sério. Cláusulas são retiradas de minutas, outras são capciosas e dão direito e interpretações errôneas, e com isso, mais bla-bla-bla, que revela que o ser humano está perdendo a honradez, a seriedade e a decência, fazendo qualquer coisa para se defender e alcançar seus objetivos, mesmo quando prejudica a outros. Que se fodam os outros. Esse é o “padrão” que estão gestando no Brasil faz muito tempo! E também no mundo. E vai ficando normal. As pessoas acreditam no papo, e quando nada daquilo se cumpre elas já se esqueceram de tudo ou se sentem impotentes para lutar contra. Assim, fica tudo pelo não dito…
Querem fazer um exercício de memória? Eu não faço porque me deixa deprimido… O que interessa é o que é feito. Isso sim tem que ser considerado. O discurso não interessa mais… Quase ninguém lê, nem ouve, nem pensa, nem questiona, nem mesmo entende o que está sendo dito e não dito.
Até eu, pensando bem, estou perdendo tempo aqui… Escrevendo… Acham que alguém vai se preocupar com a minha admiração, colocação, questionamento? Vamos pro baile e vamos torcer para que a parte pior do problema não venha bater na minha praia. Tem lixo demais nesse papo todo!