Sensibilidade histórica
Luiz Alberto Machado - Iscas Econômicas -“Aqueles que não conseguem se lembrar dos erros do passado estão condenados a repeti-los.”
George Santayana
Ponte entre passado, presente e futuro
“Aqueles que não conseguem
se lembrar dos erros do passado
estão condenados a repeti-los.”
George Santayana
A convite da aluna de Relações Internacionais da FAAP, Karina Calandrin, ministrei palestra, juntamente com o senador Eduardo Suplicy, na abertura do Simulado para o Ensino Médio (SiEM 2013), um modelo de simulação voltado a estudantes de ensino médio baseado em acontecimentos históricos.
Refletindo sobre o que falar na abertura, acabei optando por um paralelo entre a História e a minha própria história.
Assim, iniciei contando aos presentes que eu odiava a disciplina História no primário, no ginásio e no colegial, denominações que prevaleciam na minha época.
E por que isso?
Porque a História era pessimamente ensinada. Todas as professoras que tive nessas ocasiões obrigavam os alunos a decorarem nomes, datas e fatos relevantes, sem maior preocupação com a análise das relações de causa e efeito existentes entre eles.
Nesse contexto, só circunstancialmente conseguia me interessar pela matéria. Uma dessas vezes ocorreu quando fui disputar o campeonato mundial de basquete mirim, defendendo a seleção brasileira, em Porto Rico. Fizemos escala, na ida e na volta, na Venezuela, sendo que na volta permanecemos no país por alguns dias, fazendo três jogos contra a seleção local e tendo a oportunidade de visitar alguns pontos turísticos e localidades históricas. Entre elas, a cidade de San Juan de los Morros, a capital do estado de Guárico e, praticamente, a porta de entrada para a zona central do país, onde nos foi narrada a história da independência da Venezuela com destaque para os feitos de Simón Bolívar. No retorno desta viagem, fui obrigado a fazer diversas provas que haviam sido adiadas por conta da ida ao exterior. Em História, estudávamos a independência dos países sul-americanos e na minha prova havia uma pergunta sobre a da Venezuela. Ainda com a memória fresca, dissertei longamente sobre o tema, provocando surpresa na própria professora, que acabou me atribuindo a pontuação máxima na questão.
Depois disso, só passei a me interessar pela disciplina na Faculdade de Economia, quando tive um excelente professor de História Econômica, que me fez compreender o real sentido da História e a extraordinária importância que ela pode ter na nossa própria vida e no entendimento das coisas que acontecem à nossa volta.
Quando, mais tarde, abracei a carreira de professor, concentrei-me nas disciplinas do núcleo histórico do curso de Ciências Econômicas: História Econômica Geral, História do Pensamento Econômico e Formação Econômica do Brasil.
Passei então a enxergar a História como ela deve efetivamente ser entendida, ou seja, como uma ferramenta excepcional para estabelecer conexões entre o passado e o presente e, a partir daí, com as limitações naturais de qualquer previsão, o desenho de cenários futuros. Em outras palavras, uma ponte entre passado, presente e futuro. Uma ponte, porém, repleta de surpresas e de atipicidades.
Isso vale para qualquer área do conhecimento, assim como para a nossa própria vida.
Exatamente por isso é que sou extremamente grato ao esporte, por ter me propiciado oportunidades incríveis de conhecer diversos países numa época em que viajar para o exterior era extremamente difícil, privilégio apenas de pessoas de elevado nível socioeconômico, muito superior ao de minha própria família.
Não tenho a menor dúvida de que, parte de tudo o que alcancei na vida, tanto no plano pessoal como no profissional, deveu-se ao aprendizado obtido nas viagens desse período da minha vida, em que tive a chance de conhecer países então muito pouco conhecidos, tais como Iugoslávia, União Soviética, Finlândia e Suécia, ou mesmo, mais perto do Brasil, Panamá, Peru e Equador.
O tempo foi passando e o acompanhamento da evolução histórica desses e de outros países que visitei foi extremamente facilitado pelas observações e pelos conhecimentos adquiridos quando neles estive.
No desempenho de minhas funções como professor, tenho procurado sempre que possível lançar mão de textos ou filmes que permitam aos alunos o estabelecimento de relações de causalidade entre acontecimentos de diferentes períodos históricos, mais ou menos extensos.
Ainda no semestre passado, ofereci um curso intitulado O cinema e a redemocratização do Brasil e da América do Sul, preocupado com a desinformação cada vez maior dos alunos sobre acontecimentos relativamente recentes da nossa realidade, mas não vividos diretamente por nenhum deles. Interessante observar que isto ocorreu algumas semanas antes dos movimentos que tiveram lugar nas ruas de diversas partes do Brasil a partir do mês de junho.
Para minha satisfação, recebi diversas mensagens de participantes deste curso, chamando minha atenção para algumas semelhanças entre o que foi visto nos diversos filmes utilizados no curso e as reivindicações dos grupos de manifestantes.
São situações como essas que tornam tão gratificante a vida de um professor. Tenho certeza que ministrando cursos como este ou tendo a oportunidade de falar para estudantes que sacrificam parte de suas férias para participar de uma simulação histórica, estou contribuindo para a formação de futuras lideranças que poderão fazer do Brasil um país muito melhor do que esse que temos hoje.
Uma das lições que se aprende na História é que a evolução não ocorre de forma linear, Sendo assim, não basta saber o que aconteceu de certo e de errado no passado para se ter certeza do que ocorrerá no presente ou no futuro. Seria muito cômodo se fosse assim. Mas, também, absolutamente monótono.
Portanto, deixo como recomendação final a todos que procurem conhecer a História e fazer desse conhecimento uma ferramenta importante para a análise das coisas e das mudanças que acontecem à nossa volta, com velocidades e intensidades muitas vezes surpreendentes.
Se alguém tiver alguma dúvida, sugiro que observe o que aconteceu com a popularidade da presidente da República, e de vários governadores, prefeitos, senadores, deputados e vereadores ao longo dessas últimas semanas.
Faltou – e continua faltando – a muitos deles aquilo que é citado por Galbraith em A era da incerteza como o fator que para Marx distingue os bons dos maus economistas: sensibilidade histórica.
Iscas para ir mais fundo no assunto
Referências e indicações bibliográficas
GALBRAITH, John Kenneth. A era da incerteza. Tradução de F. R. Nickelsen Pellegrini. 6ª ed. São Paulo: Pioneira, 1984.
Referências e indicações webgráficas
MACHADO, Luiz Alberto. O cinema e a redemocratização do Brasil e da América do Sul (curso). Disponível em http://www.faap.br/nucleocultura/cinema_redemocratizacao.html.
SiEM 2013. Disponível em http://www.siemsp.com.br/.