A dissonância cognitiva
Luciano Pires -Quando uma autoridade reconhecida pelo povo se comporta de forma irracional, fazendo com que tentemos conciliar mentalmente a autoridade de direito com a irracionalidade de seu comportamento, temos duas opções. Ou desistimos e nos desinteressamos da política, ou construímos uma concepção de mundo que tente assimilar o contraditório da ação da autoridade, sem pirar. Para isso abrimos mão da lógica e damos pedaladas no discurso político até que a contradição da autoridade seja relegada para um plano invisível, normalmente o das ideologias. É especialmente então que surge o duplopensar ou duplipensar, o ato de se ter duas crenças contraditórias e aceitar ambas como verdade.
A isso damos o nome de dissonância cognitiva.
Dissonância tem a ver com falta de harmonia. Na música, por exemplo, é um conjunto de sons que destoam. Já o “cognitiva” vem de cognição, que é o processo de aquisição do conhecimento, envolvendo os processos mentais que influenciam o comportamento de cada indivíduo.
Dissonância cognitiva então é uma falta de harmonia na forma como você trata a aquisição e processamento de informações, e se manifesta pela sensação desagradável de conviver com duas ideias contraditórias ao mesmo tempo. Sabe aquele desconforto quando você senta para jantar, olha aquele franguinho a passarinho que sua mãe preparou com tanto carinho e lembra do documentário sobre matadouros de animais? Pois é. Dissonância cognitiva.
É a teoria da dissonância cognitiva que explica porque tanta gente cai em golpes manjados. Lembra daquela oferta que chega por e-mail com um preço inacreditável? Aquele investimento que dá taxas de retorno fabulosas? Aquela proposta de curso que, se você fizer, ficará rico? Diante da perspectiva de ganho rápido ou fácil, a suspeita de que a proposta possa ser irreal, ilegal ou desonesta fica para trás. Em dissonância cognitiva, o trouxa faz a opção psicológica de correr o risco.Os psicólogos chamam essa vulnerabilidade de “suspensão voluntária da incredulidade”.
Depois do prejuízo, criamos todo tipo de desculpa para justificar a escolha desastrada…
No marketing político então… repare na estética, no discurso, no conteúdo. A intenção é criar na sua cabeça a dissonância cognitiva, a ideia de que você votou no político errado, que aquele que está na tela é o que tem as melhores soluções. Viu, seu trouxa? Aí você fica com aquela sensação de que votou errado… e sai à cata das explicações que darão alívio psicológico.
A maioria das pessoas combate a dissonância cognitiva evitando-a. Quando alguém aparecer com a informação dissonante, o mais fácil é ignorar, se negar a aceitar.
Vivemos num mundo repleto de contradições, a dissonância cognitiva vem de todos os lados. Não parece que o Brasil é uma gigantesca dissonância cognitiva? Por todo lado manifestações repletas de afirmações absolutas como “todo mundo”, “sempre”, “ninguém”, “nunca”, todas como conclusão genéricas de algum incidente em particular ou alguma evidência solitária. Um caso seletivamente escolhido serve como bandeira para a generalização. E dá-lhe dissonância cognitiva.
Sabe o resultado? Desaprendemos a manifestar nossas dúvidas, a usar “talvez”, “alguns”, “a maioria”, ” a minoria” e assim proporcionar o bom debate, evitando os malefícios da generalização. O resultado das contradições diárias às quais estamos expostos, quado respondemos com generalizações e afirmações absolutas é o surgimento dos justiceiros sociais exibindo virtudes, princípios, credos e valores morais que na verdade não possuem.
Pratica-se a censura para garantir a liberdade de opinião. Mata-se em nome da paz. Rouba-se em nome da justiça social. Agride-se em nome da democracia. Quebra-se a Constituição em nome da segurança jurídica.
Dizem uma coisa e agem ao contrário.
É isso a dissonância cognitiva? Não. Dissonância cognitiva é só o gatilho.
O nome disso é hipocrisia.
Convido você a ouvir mais sobre Dissonância Cognitiva no Podcast Café Brasil 508 : http://portalcafebrasil.com.br/podcasts/508-a-dissonancia-cognitiva/