Brasiliência
Luciano Pires -Já ouviu falar em Brasiliência? Acho que não, esse termo não existe, eu inventei. É a junção de “Brasil” com “resiliência”.
Resiliência é a capacidade de recuperação, de se recobrar diante de adversidades, de se adaptar a mudanças. O melhor exemplo é o lutador do UFC que, mesmo recebendo uma saraivada de pancadas, grogue, quase caindo, consegue reagir e nocautear o oponente. Ou aquele seu parente que faliu anos atrás e hoje está de volta aos negócios, bem sucedido.
Quem desenvolve a resiliência tem mais condições de enfrentar desapontamentos, lidar com perdas e se adaptar a mudanças. A “alma” do resiliente é a capacidade de enxergar os obstáculos como componentes críticos do sucesso. O resiliente tem grande senso de controle sobre seu destino, sabe que pode contar com ajuda de outras pessoas quando necessário e toma iniciativa para resolver seus problemas. Atitude positiva, otimismo, habilidade para controlar emoções e receber as críticas e falhas como algo positivo para fazer melhor. O resiliente aprende com os erros.
Isso é resiliência. Vamos à brasiliência.
Em minha palestra A Fórmula da Inovação, quando trato da “proposta de valor”, dou um exemplo perfeito da brasiliência. Faço um exercício com a plateia, mostrando imagens de um resort, provavelmente no Tahiti, com um casal saboreando o café da manhã numa área coberta, dentro do mar, numa piscina natural, transparente… Maravilhosa!
Em seguida mostro a imagem de uma cidade do interior do Brasil, durante uma inundação. A água pela cintura das pessoas, uma tragédia. A imagem mostra uns caras que fizeram uma boia com uma câmara de ar de caminhão, colocaram um guarda sol em cima, uma tábua como mesa, cervejas e… pronto! Baita festa, curtindo o momento. Um contraponto perfeito aos turistas do Tahiti! E então falo da diferença entre expectativa e realidade.
Mas o momento principal é no final da reflexão, quando coloco as duas imagens lado a lado. Na imagem do Tahiti, naquele paraíso, aparecem turistas europeus, sérios, nenhum sorriso! Na imagem do Brasil, no meio da tragédia, todos com copo na mão, sorrisos largos, abraços, a maior diversão. Quase dá para ouvir o samba. E comento:
– Tá vendo porque o Brasil nunca vai quebrar?
O brasileiro inventou a brasiliência, uma singular capacidade de viver tomando porrada e continuar sorrindo.
O brasiliente faz piada das coisas mais trágicas.
O brasiliente confia que um deus ou um santo há de dar um jeito.
O brasiliente deixa para amanhã os problemas mais graves ou complexos.
O brasiliente acredita em promessas, por mais absurdas que pareçam.
O brasiliente não aprende com os erros, os releva. E comete outra vez.
O brasiliente acha que o que é de todos, não é de ninguém.
O brasiliente não tem paciência para fazer contas.
O brasiliente troca tristeza por alegria, seja onde ou como for.
O brasiliente, até por falta de comparação, se conforma com o meia boca, pois “dá pro gasto”.
O brasiliente tem como estratégia de vida, a esperança de que tudo vai melhorar.
E um dia, lá na frente, machucado, maltratado, roubado, esfolado, zonzo, mas vivo, o brasiliente, com um copo de cerveja na mão e um sambinha ao fundo diz: tá vendo como no fim dá tudo certo?
Brasiliência é uma forma de ver a vida, que faz com que as pessoas, mesmo sofrendo, se sintam felizes.
Deveria ser uma baita qualidade.
Mas dói pra caramba.