Deduzir ou induzir
Luciano Pires -No Podcast Café Brasil 385 – Deduzir ou Induzir, parti de um texto de Mark Zegarelli chamado Think Logically para construir uma reflexão. Vamos a ela.
Dedução rima com redução, guarde isso com você. Dedução rima com redução. Deduzir é começar com um conjunto de possibilidades e reduzi-lo até que poucas opções restem. E aí escolher entre elas. É assim que trabalha a mente de Sherlock Holmes, por exemplo, o famoso detetive. Num caso de assassinato ele examinava todos os suspeitos, o açougueiro, a empregada, o sócio e a viúva. No final da história ele chegava a apenas um suspeito, por exemplo: “A vítima morreu na banheira, mas foi carregada até a cama. Uma mulher não conseguiria arrastar o corpo. Nem o açougueiro, que tem um problema físico. Portanto, o sócio deve ter cometido o crime.”
Essa é a dedução: uma redução.
Já a indução é o contrário: é um aumento. Ao induzir, você começa com um numero limitado de observações e vai aumentando-o através de generalizações. Por exemplo, de quando em quando você depara com a notícia de um caso de pedofilia envolvendo um padre. E conclui: todo padre é pedófilo. Sacou? Toda loira é burra. Todo do político é ladrão. Isso é indução: a partir de pequeno conjunto de possibilidades extrapolar para um universo maior.
A lógica permite que você raciocine dedutivamente com confiança. É ela que permite que você navegue por premissas, pelos fatos ou ideias iniciais a partir das quais se inicia um raciocínio, eliminando as conclusões inválidas e chegando o mais próximo da verdade possível. A lógica e a dedução estão, portanto, intimamente conectadas.
Mas, a dedução funciona muito bem é na matemática, por exemplo, onde praticamente não existem área cinzas. Quatro mais quatro dá sempre oito. Todos os números são pares ou ímpares. Se você quer provar que um número é par, divida-o por dois. Não há o que discutir. Essa deduções são fáceis de serem feitas.
Com a indução o bicho pega de verdade. A indução é logicamente falha. Encontrar 5, 10 ou 1000 pessoas legais numa cidade não significa que todos naquela cidade são legais. Ouvir cinco podcasts ruins não significa que todo podcast é ruim. Assistir a um filme ruim do Leonardo di Caprio não significa que todos os filmes dele são ruins. Parece tão óbvio, não é? Pois é… Mas dê uma olhada em volta e você verá a quantidade de gente que funciona por indução. Especialmente nas mídias sociais…
Bem, eu aprendi sobre dedução e indução em 1975, quando a sonda Viking 1 foi enviada para Marte. Naquela época eu mantinha correspondência com um dos grandes astrônomos amadores brasileiros, Jean Nicolini, lá de Atibaia, um especialista no planeta Marte. Nicolini me escreveu dizendo algo que marcou.
Havia uma grande expectativa sobre a Viking encontrar vida em Marte, estava todo mundo assanhado. E Jean escreveu assim: “Existem duas possibilidades para a Viking: encontrar vida ou não. Mas a única possibilidade que dará certeza definitiva será o sim, existe vida, encontramos uma prova. O ‘não existe vida’ não nos dará certeza alguma, pois é impossível, a partir das amostras encontradas numa pequena área, induzir sobre o que existe no resto do planeta.”
Ao deduzir, poderíamos dizer que “não há evidências de vida em Marte”, ou seja, não encontramos provas de que existe vida em Marte. Mas as provas podem existir em algum outro lugar do planeta. Ao induzir, poderíamos dizer que “há evidências de que não existe vida em Marte”. Estaríamos projetando para todo o planeta uma conclusão tirada com base numa pequena amostra recolhida, o que é um erro.
Aquilo me fascinou! Um tremendo esforço, milhões gastos, a mais alta tecnologia e tudo que teríamos seria a incerteza sobre se existia vida ou não em Marte? Pois é. Era possível deduzir a partir da amostra. Mas era impossível induzir.
Agora preste a atenção que vou dar um nó na sua cabeça: é muito mais fácil provar que a afirmação “não existe vida em Marte” é falsa. Basta encontrar uma evidência. Já para provar que “existe vida em Marte” é falso, só tem um jeito: revirar o planeta inteirinho, o que é impossível.
Sacou? Vamos conviver com a dúvida pelo resto da vida. É impossível induzir com certeza.
Muito bem… Aí você dirá: “Pô, mas já faz 40 anos que a gente explora Marte e não achou nada lá. Isso prova que não tem vida lá.”
E eu respondo: “Tem certeza?”
Se você for honesto, só terá uma resposta: “Não. Não tenho certeza.” Mesmo não encontrando evidências por 40 anos, continuamos com a dúvida. Pode ser que um dia apareça uma bactéria no fundo de um fosso e pronto! 40 anos de certezas cairão por terra.
De novo: conclusões indutivas são perigosas, pois generalizar uma premissa verdadeira pode levar a uma conclusão falsa.
Agora olhe em volta. Veja a quantidade de gente que induz coisas, especialmente nas mídias sociais. A partir de um fragmento de verdade, criam um cenário completo repleto de certezas absolutas. Negam aquilo que não se adapta à narrativa que construiram ou compraram e seguem exibindo orgulhosamente suas certezas.
Quanta arrogância.