Empolgados com a China
Gustavo Bertoche - É preciso lançar pontes. -Amigos, acho impressionante como alguns brasileiros voltam extraordinariamente empolgados de suas viagens à China.
Eles voltam encantados com a quase ausência da circulação de moeda física nas grandes cidades (e a impossibilidade de transações privadas), o reconhecimento facial onipresente (a realidade bruta e simples do Grande Irmão), a Huawei e a sua tecnologia 5g (que possibilita a coleta de dados de todo o ambiente, incluindo sons e imagens, de modo contínuo), o score social como política de distribuição de privilégios e punições, o sistema educacional hipercompetitivo, a sinergia entre empresas e Estado…
Tudo isso me parece tão distópico, tão terrível, que nem seria preciso falar também da censura permanente, da ausência da liberdade política e da liberdade religiosa, da espionagem onipresente – a cidadãos e a estrangeiros -, do expansionismo bélico, da extração de órgãos de presos vivos para transplantes, da rejeição explícita da noção iluminista de “direitos humanos” – compreendidos como “eurocêntricos”…
Aqueles que avaliam um regime político por seu sucesso econômico, em nome de um “pragmatismo”, são exatamente os mesmos que negociariam com traficantes de escravos ou com Hitler – que, por sinal, jamais sonharam deter tanto poder, tanto capital e tanto controle sobre tantas pessoas quanto detém o complexo político-industrial encabeçado pelo PC chinês.
Finalmente, a utilização da máxima de que “dinheiro não tem partido”, entendida como princípio de indiferença moral em relação ao capital, me parece a marca do que há de mais abjeto na humanidade, que é a disposição de obter sucesso econômico à custa do controle e do sofrimento de outros seres humanos: a troca dos sonhos, dos afetos, das vidas por moedas.
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Acreditam ser ateus muitos dos adoradores do bezerro de ouro.