LíderCast 140 – Carlos Nepomuceno
Luciano Pires -Luciano Pires: Muito bem, mais um LíderCast. Vocês sabem que o meu cabelo é igual, mas a minha voz mudou, porque eu estou num estado assim, semi gripal. Então hoje está um pouco mais aveludada. Mas é em função dessas coisas da vida. Que quase me fez dançar com essa entrevista aqui, que a gente já marcou, remarcou, trimarcou. E cada vez era um rolo. Mas finalmente eu consegui pegar essa figura, que chegou até aqui, digamos assim, por indicação de alguns ouvintes, por eu ter visto o trabalho dele também. A gente acabou fazendo contato. Nem sei como é que começou o contato. Eu acho que foi um dos nossos ouvintes. Eu não me lembro quem foi que botou a gente em contato. Estamos aqui conversando. Três perguntas fundamentais, que são as únicas que você não pode chutar.? Eu quero saber seu nome, a sua idade e o que você faz?
Carlos Nepomuceno: O meu nome é Carlos Nepomuceno. Eu sou jornalista. E hoje eu trabalho, tenho uma escola na internet, que a gente chama de bimodais. A ideia é ajudar as pessoas e as empresas a lidar melhor com esse mundo digital. Um mundo está acabando e outro está começando.
Luciano Pires: Muito bom. Você nasceu onde?
Carlos Nepomuceno: Eu sou carioca de Botafogo. Botafoguense.
Luciano Pires: Que beleza. Diga uma coisa: o que seu pai e sua mãe faziam?
Carlos Nepomuceno: Meu pai era milico, coronel, família…
Luciano Pires: Coronel?
Carlos Nepomuceno: Família toda de militar. E minha mãe é funcionária pública. E aí eu, lá na época da infância assim, minha mãe era a única mulher que trabalhava no prédio. Porque todas as mulheres eram…
Luciano Pires: Esposas de militares.
Carlos Nepomuceno: De militares. Exatamente. Então eu tive uma infância um pouco diferente da galera. Uma relação assim, muito com as pessoas que trabalhavam em casa. A gente conversava muito. Porque era uma coisa assim, meio diferente. E também sou daquela geração que ainda teve infância em play. Então eu tinha um play, tinha futebol, tinha bora de gude, tinha uma série de coisas e tal. Então isso eu acho que é uma diferença, assim, em termos de geração.
Luciano Pires: Sem dúvida.
Carlos Nepomuceno: Te dá um jogo de cintura muito grande.
Luciano Pires: Você tem irmãos?
Carlos Nepomuceno: Tenho um irmão. Tenho família, tenha uma esposa, três filhos. Um de 30, médico. E dois gêmeos, de 21. Um faz… um é economista e a outra é arquiteta.
Luciano Pires: O que você… como era teu apelido quando era criança?
Carlos Nepomuceno: Godinho.
Luciano Pires: Gordinho?
Carlos Nepomuceno: Não. Godinho.
Luciano Pires: Godinho?
Carlos Nepomuceno: Por quê? Não sei. Mas virou esse apelido, ficou, então o pessoal mais antigo, dos mais antigos me chama de Godinho.
Luciano Pires: Godinho?
Carlos Nepomuceno: Isso.
Luciano Pires: O que o Godinho queria ser quando crescesse?
Carlos Nepomuceno: Cara, jogador de futebol. Eu acho que todo mundo. Jogador de futebol e tal.
Luciano Pires: Como resistir? Como resistir ao entrar num cinema e assistir o Jornal 100? Na abertura? Tan-tan-tan e não querer ser jogador de futebol?
Carlos Nepomuceno: É. É uma coisa engraçada. Que hoje em dia, a gente… é tanto futebol. Você vai assistir futebol, você vai… tem o paperview direto. Então ou você ia ao jogo ou ouvia no rádio ou ficava uma semana depois, para ver os gols, se passasse o jogo que você queria ver.
Luciano Pires: Isso aí.
Carlos Nepomuceno: Que geralmente o jogo que passava era um jogo clássico. Então era outra… outro mundo.
Luciano Pires: Sim. Eles já trabalhavam – sem a gente saber – já trabalhavam a escassez, cara. Aquele negócio era escasso. E aquilo era uma coisa mágica.
Carlos Nepomuceno: Não, e a coisa do rádio. Eu sempre fui botafoguense. Assim, então eu era, desde muito cedo, todo mundo ia dormir: ah, vai dormir, etc. e tal. Eu botava o radinho debaixo do travesseiro e ouvia o jogo até o final do jogo, quarta-feira. Eu me lembro assim, de ouvir o jogo. E o time do Botafogo naquela época era um time, era quase que praticamente a seleção brasileira. Então era um time espetacular.
Luciano Pires: São outros mundos, cara. É uma coisa diferente. Eu comento muito. O meu filho adorava futebol, eu ia no estádio e tudo. Eu parei. Não quero nem saber. Eu acho que o Brasil andou jogando ontem. Eu acho que o Corinthians – que é o meu time – está disputando uma final. Acho. Você pergunta para mim, eu nem sei com quem é, cara. Porque eu me desliguei completamente do futebol. Porque eu brochei. Eu brochei, cara. Os caras vêm falar: mas o que aconteceu? Eu falei: cara, eu tenho um puta de um defeito, terrível. Eu vi o Rivelino jogar bola. Eu vi o Zico jogar bola. Eu vi Falcão jogando bola. Eu vi Sócrates jogando bola. Cara, não dá para ligar a televisão e ver isso e querer dizer que isso é jogador de futebol, cara. Para bicho, o cara está preocupado com a tatuagem, com o cabelinho. E o outro estava se matando em campo e fazendo aquelas coisas. Outro dia passou um jogo antigo, Brasil e Inglaterra, na Copa de 82, eu acho que foi uma coisa assim. Estava passando na TV Cultura. Eu parei para olhar aquele jogo, eu falei: cara, o que aconteceu naquele campo em cinco minutos, se acontecesse hoje, os jogadores que estavam lá seriam imediatamente vendidos para a Europa por 100 milhões de euros. Porque os caras faziam naturalmente, aquilo que hoje não acontece mais. Então a pessoa: ah, é que o futebol mudou. Bom, tá bom. Mudou e ficou feio pra caralho. Eu não consigo mais seguir. Porque eu tenho na memória aquilo que foi há um tempo atrás. E isso me brochou, cara. Me brochou e eu, hoje eu sou MMA, UFC. Porque lá os caras dão o sangue.
Carlos Nepomuceno: É. Mas para mim é um espaço de estar com os filhos. Os garotos assistem. Então às vezes, a gente vai ao jogo juntos. A gente assiste o jogo junto, comenta. Então, é um momento de família. Então assim, eu não sei se de repente, se eles não tivessem essa… se eles não gostassem de futebol, se eu continuaria acompanhando do jeito que eu acompanho.
Luciano Pires: Então, você está usando para um outro objetivo? Você está usando para uma outra coisa.
Carlos Nepomuceno: É… então assim…
Luciano Pires: Mas vamos lá, o que o Godinho queria ser quando crescesse?
Carlos Nepomuceno: Ah, eu acho que era jogador de futebol. Eu acho que era um pouco isso.
Luciano Pires: O fato de ter um milico em casa, você não mudou a ideia? De: pô, vou seguir carreira?
Carlos Nepomuceno: Ninguém da família. Foi uma fase assim, que nenhum dos primos. Meu avô era militar, era general. O meu pai era coronel. O meu tio, irmão dele era coronel. Aí a irmã dele foi casada com um coronel. Então eu sou de uma família de milico mesmo. Então tem uma série de coisas que marcam. Coisa de horário, coisa de disciplina. Uma série de coisas. Mas ninguém dos primos. Nenhum primo seguiu a carreira. Foi assim, um… porque eu acho que o meu pai também e os outros todos ficaram muito marcados assim, porque ou era ser militar ou ser militar. Então o meu pai, por exemplo, tinha outras vontades. E meu avô falou: não, não tem muito. É aqui. Não tem muito… então, meu pai já veio com essa ideia de não… meu pai já veio com essa ideia de não forçar o filho a não fazer o que ele quisesse. E aí então, teve muita liberdade nesse sentido e tal.
Luciano Pires: Como que é ser filho de militar em pleno regime militar?
Carlos Nepomuceno: Cara, até uma determinada época, eu pensava muito que nem meu pai. Eu me lembro que quando eu morava em Brasília. Tinha uma coisa assim de eu ouvir algumas pessoas falando, de chegar até a comentar com meu pai: tem um cara, um professor lá, que está fazendo uns troços em sala de aula e tal. Nunca dedurei. Mas cheguei sempre a… então tinha assim, essa coisa. E eu morei em Brasília. Então teve toda uma história ali. Mas depois que eu vim para o Rio, que eu morei Brasília-Rio, Brasília-Rio. Quando eu vim para o Rio, aí eu me envolvi, já na faculdade, no acadêmico, lá numa escola que a gente estudou. Aí já fiz um boletim. O boletim chamava A Bigorna. Aí já comecei a colocar o meu lado de inquietude. Então eu tenho uma inquietude. Eu sempre fui muito inquieto. E aí, a partir dali eu comecei a fazer. Inquietude. A gente fez um jornalzinho na escola. Que era uma escola de militares, de coronéis. Foi uma quizomba, deu uma confusão danada. E depois eu fui para a PUC. E na PUC, aí já fui doutrinado…
Luciano Pires: Virgem Maria, na PUC?
Carlos Nepomuceno: Aí já fui doutrinado. Aí virei marxista Nutella.
Luciano Pires: Filho de milico?
Carlos Nepomuceno: Filho de milico. Mas meu pai também nunca chegou e… foi deixando. Foi deixando. E aí eu, foi um pouco essa história. Todo mundo. Eu acho que a gente vive isso. Aí comecei a ter o meu caminho.
Luciano Pires: Então, um dia o Godinho saca que talvez futebol não seja a praia. E está chegando a hora de ele decidir o que ele vai ser quando crescer. Você foi para algum caminho? Você buscou uma faculdade?
Carlos Nepomuceno: Não. Aí eu – daquelas dúvidas todas e tal – então quando eu fiz esse boletim lá no colégio. Eu falei: cara, eu acho que eu vou ser jornalista. Aí comecei com jornalismo. Aí fiz a faculdade. E aí era uma época assim, de realmente assim, uma época assim, que a gente começou. E ali na faculdade a gente já tinha – a minha turma, por exemplo – era uma turma que era assim: a gente era independente. A gente era rebelde, mas não queria se aliar àquelas tendências. Aquilo ali era muito regime militar. Desde cedo eu achei isso.
Luciano Pires: O outro lado. O outro lado?
Carlos Nepomuceno: Os militantes dos DCEs e tal assim. Era uma coisa também muito milico aquilo, muito. E eu já era inquieto. Aí eu na própria, na faculdade, comecei a fazer teatro. Muitos anos fiz teatro. Então aí eu já comecei a ter um outro tipo de… então eu era muito independente. A minha cabeça sempre foi muito independente. Sempre quis pensar pela minha própria cabeça etc. e tal, pa-pa-pa. Aí quando saí da faculdade, aí eu entrei para fazer…
Luciano Pires: Jornalismo?
Carlos Nepomuceno: É. Aí não tinha muito trabalho. Aquela coisa assim.
Luciano Pires: Você se formou em jornalismo?
Carlos Nepomuceno: Formei em jornalismo.
Luciano Pires: Tirou o canudo de jornalismo?
Carlos Nepomuceno: Tirei. Tirei.
Luciano Pires: Que ano era isso?
Carlos Nepomuceno: 82. Aí não tinha muita coisa e tal. Aí um amigo meu falou: pô, eu estou fazendo uns freelas aí para um caderno de informática. Para um jornal de informática. Aí fui para o jornal de informática. Não entendia nada, nada, nada. Eu não sabia o que era. Eu me lembro que a primeira matéria que eu fiz, o cara falou: ah, a gente está aqui usando uma linha discada, que era linha discada, de discar.
Luciano Pires: De discar.
Carlos Nepomuceno: Aí eu fiz o artigo. O cara usando a linha de escada. Aí mostrei para o cara: meu irmão, quebra o meu galho, dá uma olhada aí. O cara: não é nada disso e tal. E aí a gente começou. Aí eu fui da primeira geração dos jornalistas de informática do Brasil.
Luciano Pires: Que legal.
Carlos Nepomuceno: E a gente ia para congresso e tudo. Era uma galera ali. Foi a primeira geração. Foi… aí eu comecei a mexer com tecnologia. Eu comprei meu primeiro computador muito cedo, em 83, 84, eu já tinha computador, coisa que ninguém tinha em casa. E aí eu já comecei a pegar esse barato técnico. E aí entrei nessa história.
Luciano Pires: E decidiu que ia seguir no jornalismo? Ia ficar nele?
Carlos Nepomuceno: É. Aí já tinha essa coisa. Aí o PT estava surgindo. Aí começou a aparecer a oportunidade de trabalhar em sindicato. E aí eu fui trabalhar em sindicato.
Luciano Pires: No Rio?
Carlos Nepomuceno: No Rio.
Luciano Pires: Você foi trabalhar no sindicato?
Carlos Nepomuceno: Fui para o sindicato. Teve uma prova para o Sindicato dos Bancários. Aí eu fui admitido lá, para ser jornalista lá. Depois trabalhei no Sindicato dos Radialistas e depois trabalhei no Sindicato dos Trabalhadores da UFRJ. Eu trabalhei em três sindicatos.
Luciano Pires: Cara, jornalista de sindicato?
Carlos Nepomuceno: Foi.
Luciano Pires: Que tamanho era a barba?
Carlos Nepomuceno: Cara, eu nunca tive barba não.
Luciano Pires: Então você estava fora do modelo.
Carlos Nepomuceno: Estava… não, mas ali… é… não… eu sempre fui marxista Nutella. Porque eu sempre tive assim, então eu comecei. Eu cheguei e tentei inovar naquele tipo de jornalismo. Então, por exemplo, eu cheguei lá, quando eu virei editor, eu cheguei lá na UFRJ, por exemplo, a gente fez um jornal. A gente pegava uma foto enorme e fazia umas coisas totalmente diferentes e tentava sempre criar umas coisas, etc. e tal, pa-pa-pa. Mas cara, foi ali que eu comecei a realmente conhecer o marxismo. E comecei a perceber…
Luciano Pires: Na prática?
Carlos Nepomuceno: Na prática. É. Então teve várias situações bizarras, cara, bizarras em relação… ali, quer dizer, então o que o pessoal está conhecendo do PT agora, eu conheci lá dentro. Coisas bizarras, cara, bizarras. E…
Luciano Pires: Você não acha que você vai sair daqui impune, soltando um bizarro e não entrando em algum detalhe, né?
Carlos Nepomuceno: Não.
Luciano Pires: Nós vamos tentar entender um pouco mais…
Carlos Nepomuceno: Bizarro assim: eu estava numa reunião de funcionários, aí critiquei uma menina. Aí a menina estava… ela era… tinha… ela namorava um cara que era do sindicato, que era casado, mas ela era amante do cara. Eu não sabia. Aí no dia seguinte os caras me mandaram embora. Porque eu tinha discutido com ela e o cara ficou chateado comigo. Aí a galera toda que estava nesse projeto da imprensa, entrou em greve dentro do sindicato. Aí me readmitiram. Aí no dia que fizeram isso, foi o dia que eu resolvi sair desse… eu falei: cara, isso aqui não… isso aqui é coisa de maluco. Isso aqui não é uma coisa… não é aqui que eu vou ser feliz. Aí…
Luciano Pires: Isso foi oitenta e?
Carlos Nepomuceno: Não, isso aí já foi 93, 92.
Luciano Pires: Meu amigo, a minha experiência com eles foi em 79. Para você ter uma ideia. Foi pré PT. Não tinha PT, 79 em São Paulo, o movimento estudantil, aquela loucura, a volta do irmão do Henfil, não sei o quê. Eu na rua com o cabelão aqui, placa na mão. Eu era do Diretório Central dos Estudantes do Mackenzie, que é considerado, era a escola da direita. E tinha a USP lá, que era à esquerda, aquela pauleira. Eu era editor do jornal do Diretório Central dos Estudantes. E participei de várias plenárias.
Carlos Nepomuceno: Você estava na linha marxista?
Luciano Pires: Não, que marxista. Eu nem sabia quem era. Para mim Marx era os irmãos, era o Grouxo e o… eu estava lá numas de… eu era jornalista. Eu estava ali especulando. Muito novo ainda. E vou participar de algumas plenárias. Que estava começando um movimento gigantesco e depois terminou com o final da ditadura. Começa com a linha de frente, que eram os estudantes, depois vêm os metalúrgicos e aí amplia para a sociedade. E aconteceu de eu participar de algumas plenárias. E nessas plenárias eu vi o marxismo na prática. E eu vi cara virando para o outro e falando: cara, se você não concorda comigo, eu vou quebrar a tua perna. E eu vi cara apanhando, bicho. Sabe, apanhando, porque no argumento não ia, entendeu? Eu não concordo. O cara apanhava. Quando eu olhei aquilo, eu falei: bicho, desculpa, cara. Essa argumentação não. E dali para frente eu tomei uma ojeriza, cara, que quando o PT nasceu, eu olhei para aquilo e falei: cara, isso é tudo aquilo que eu vi. Eu tenho certeza absoluta que quem for contra vai apanhar. Vão quebrar o carro do cara. Vão te sacanear. Vão detonar a reputação do cara. Essa turma eu não quero nem chegar perto, por que… e daí para frente, eu nem cheguei. Não deu nem tempo de eu entrar. Porque eu assisti a coisa acontecendo e daí para frente eu nunca mais, nem sequer me aproximei de qualquer linha marxista, nada. Porque para mim ficou claro que aquilo não funcionaria. E a tua experiência não é a única que eu escuto. Eu tenho a minha. Eu tenho várias pessoas que eu já conversei aqui, que olha aqui: vamos botar na prática? Quando põe na prática, o castelo cai.
Carlos Nepomuceno: Não, aí pois é. Aí assim cara, eu decidi sair. Foi ótimo para mim, porque eu comecei a… eu já estava acessando a internet nessa época. Eu já tinha comprado, o meu primo tinha trazido um modem superprecário, eu acho que de 2.400. Eu já estava acessando a internet no IBASE. Aí apareceu um anunciozinho e eu falei para a minha mulher: cara, esse anúncio aqui vai mudar a minha vida. Aí mandei a mensagem para os caras, dizendo que eu estava interessado em trabalhar na rede nacional de pesquisa no IBASE. Tinha uma vaga, de pessoas que tinham experiência no movimento social, que era o meu caso, que eu trabalhava em sindicato e que tivesse experiência de internet, que também era o meu caso. Aí cheguei lá achando que tinha lá, sei lá, 80 caras. Não tinha ninguém. Só tinha eu. Aí 93, eu comecei a trabalhar com internet. Foi… não era nem internet o nome ainda. Eu fui contratado como bolsista do Alternex, que foi o primeiro provedor de acesso do Brasil. Então – só fazer um parêntese – esse cara que me mandou embora, ele se suicidou na frente do sindicato. O cara era tão maluco, que ele se suicidou, num carro. Não sei se por causa dessa mulher. Ele pegou uma arma e se matou. Então cara, aquilo ali era uma doideira, cara. Então aí comecei a trabalhar com internet. E aí, a partir daí, em 93… eu sou da geração, da primeira geração mesmo, da internet no Brasil. A galera que teve assim, pode ter aí uns 150, 200 caras que estavam ali nesse primeiro input. Eu já tinha sido a primeira geração de jornalistas. E aí o primeiro input. Então a gente, pô, para você ter uma noção: eu resolvi fazer uma homepage, do Alternex. A homepage que eu fiz – tinha 10 homepages no Brasil – foi a 10ª. Nós fizemos a divulgação, eu chamei um pessoal de poesia que eu conhecia, chamei um cartunista que eu conhecia etc. e tal, fiz a homepage, botei tudo, fiz um evento lá e lançamos. Foi a 10ª homepage do Brasil. Ninguém sabia. Eu peguei umas homepages e fui fazendo reengenharia. Fiz eu sozinho ali e tal. E aí dei curso e tal. E aí começou dali e tal pa-pa-pa, então…
Luciano Pires: Sem acesso aos programas, aquela coisa…
Carlos Nepomuceno: É, não, ali… ali…
Luciano Pires: Isso me lembra Chateaubriand botando uma televisão no ar e importando televisores, por que ninguém tinha como assistir. O cara bota a transmissora e ninguém assiste, porque não existe televisão. Imagina o comecinho como que era.
Carlos Nepomuceno: Aí O Globo me convidou para escrever e aí eu comecei a escrever coisas que ninguém tinha acesso. Só eu tinha acesso. Então ficava complicado, porque eu tinha que explicar para as pessoas algo que elas não podiam acessar. Aí queria falar do programa de e-mail que eu estava usando, que ninguém tinha acesso, eu tinha que falar do troço. Aí, a partir dali eu comecei a trabalhar com essa história. Criamos uma comunidade para ajudar gente a desenvolver. Desenvolvemos o primeiro kit de acesso à internet, pelo Windows, que o acesso era só pelo DOS. Nós desenvolvemos o primeiro kit de acesso. A pessoa instalava em casa e a gente botava. E a comunidade ajudando e as pessoas ajudando. E a gente foi melhorando. O cara instalava todos os programas que precisava. E aí fiz o primeiro curso de… cara, muita coisa. Aí fiz o mestrado. Trouxe todos os professores do mestrado para conhecer a internet. Ninguém conhecia. Aí começou, foi ali que começou a brincadeira. Aí em 95 eu montei a minha empresa, foi a primeira empresa de consultoria do Brasil também.
Luciano Pires: Então, você até então, trabalhava em algum lugar?
Carlos Nepomuceno: Sindicato.
Luciano Pires: Sindicato. E depois?
Carlos Nepomuceno: Era editor do sindicato.
Luciano Pires: E depois numa?
Carlos Nepomuceno: Aí recebi essa bolsa. Aí como bolsista eu fiquei ali dois anos. Aí cheguei a coordenador do Alternex. Fui o primeiro jornalista. Porque era só técnico. Eu fui o primeiro cara de humanas que coordenava o Alternex. Aí eles tiveram lá uma história, venderam para uns caras que eram uns banqueiros, uma história dessa. E aí eu falei: cara, vou montar minha empresa.
Luciano Pires: Então bicho, então, uma família de militares, que não tem empreendedor lá, pelo que você falou aí, não tinha ninguém empreendendo lá? De onde vem essa história de: vou ser dono da firma?
Carlos Nepomuceno: Minha mãe. Minha mãe dizia para mim: meu filho, você só vai conseguir se dar bem se você fizer o teu próprio negócio. A minha mãe dizia isso para mim. Que ela via que eu era muito inquieto. Então eu sempre estava inventando uns troços diferentes. E aí eu falei. E aí eu montei o meu negócio. Foi em 95. Comecei dentro de casa. Aí cara, eu comecei a fazer as primeiras homepages do Brasil. Fui eu que fiz. Eu fiz a homepage do supermercado Três Poderes, de um site lá de entrega de documentos, depois fiz o Mister Pizza. Por exemplo, a booknet do Jack London, que foi o primeiro site de comércio eletrônico, foi projetado no quarto de empregada, lá em casa. Eu projetei tudo, desenhei tudo, depois o pessoal da ESM desenvolveu. E aí, cara, aí comecei. Maluco, cara. Aí comecei a fazer tudo que você possa imaginar de internet. Tudo, tudo.
Luciano Pires: Sim, com a bolha…
Carlos Nepomuceno: Não, foi antes. Foi antes da bolha.
Luciano Pires: Não, com a bolha inflando. Ela começando a inflar?
Carlos Nepomuceno: Isso foi antes da bolha. Antes da bolha. A bolha foi 2000, entendeu? Aí comecei a fazer site, site, site e tudo, ba-ba-ba. Aí meu filho, nasceram os gêmeos. Aí eu montei um escritório em Copacabana. Aí tinha uma galera que trabalhava comigo, dava aula lá, etc. e tal. E aí começou. Então, eu acompanho internet de a gente comemorar, que o nome internet apareceu na novela. Sabe? De explicar para o cliente e dizer: olha, a internet vou explicar, é isso, isso e isso. Aí o cara dizia: ah, legal. Quanto é que custa fazer? O que eu ganho? Aí eu explicava e tal para fechar com o cliente. Então assim, desde o início, tudo, tudo, tudo.
Luciano Pires: Você teve uma ideia lá atrás, do que viria a ser essa coisa da internet, cara? Ficou claro para você que essa coisa ia mudar a história da humanidade, cara?
Carlos Nepomuceno: É. Eu sempre achei. Eu sempre percebi que a coisa ia ser gigante. Eu sempre tive essa sacação. Eu sempre tive assim, uma visão de cenário sempre… obviamente você tem que colocar isso aí 95, 2000; 20 anos quase atrás. Mas assim, então essa coisa de você acompanhar tudo e de ver cada fase, cada programa, cada coisa. Aquilo vai te dando uma bagagem. Então aí hoje, quando a gente fala de coisas assim, a pessoa não passou por tudo que a gente passou, desde o início até agora. Então você vê o círculo completo. Então isso é uma coisa. Então, eu percebia que tinha uma coisa ali, um potencial.
Luciano Pires: E aí, cara, você está com a empresa a milhão, as coisas estão ficando cada dia mais demandadas, porque a internet começa a ganhar espaço, a bolha surge. Gente ficando milionária em cada esquina, vendendo sites por valores inacreditáveis e tudo mais. E você no meio desse furacão. O que eu faço da minha vida?
Carlos Nepomuceno: Não, aí o que acontece? Aí eu comecei a dar aula. Fui convidado para dar aula lá no Rio, no MBA. E aí um aluno – que foi marcante – um aluno me perguntou: o que a minha empresa faz diante desse mundo digital? Ele me fez essa pergunta. E eu tentei responder a ele e não fiquei satisfeito com a resposta. Aí eu comecei uma aventura, Luciano. Aí começou uma aventura. Porque eu resolvi responder essa pergunta a sério. É aquela coisa assim, como se você estivesse assim, Jesus chegou e chegou para você e disse: agora você tem que responder essa pergunta, porque essa é a sua missão. Entre aspas. Então eu falei: cara, vamos entender isso. Aí eu escrevi um livro com o professor Marcos Cavalcanti, que era o coordenador do curso, em 2006. Peguei o livro e fui para dentro das empresas. E aí nesse livro…
Luciano Pires: Como chamava o livro?
Carlos Nepomuceno: Conhecimento em Rede. Foi o primeiro livro sobre transformação digital no Brasil. Que hoje você ouve falar em transformação digital. Mas é o primeiro livro que tenta ajudar as empresas.
Luciano Pires: Que ano?
Carlos Nepomuceno: 2006 a gente lançou o livro. E aí o livro tinha um – todos os meus três livros são iguais – tinha um cenário e tinha uma metodologia de sugestão. E naquela época tinha uma sugestão de metodologia que era o seguinte: uma empresa tinha que criar dentro de um departamento, uma área para experimentar colaboração, para fazer o tal do conhecimento em rede, de as pessoas ficarem participando umas com as outras e tal. Aí fui para dentro de uma série de empresas. E aí as empresas começaram, as pessoas começaram a me dar retorno. E eu comecei a perceber que a coisa não ia funcionar. E o que me matou nessa história? Isso é uma discussão bacana, Luciano. Um garoto chegou para mim, numa das empresas que eu estava fazendo um curso. Ele falou assim: Nepo, na boa. Quando ele falou “na boa”, eu senti que existia um certo clima de escopeta na pergunta. Aí ele falou assim: na boa, isso que nós estamos fazendo é mudança de processo ou é só comunicação? Cara, aí malandro, sabe o que eu fiz? Peguei o livro e joguei fora. Eu falei: cara, eu não estou entendendo nada do que está acontecendo. Aí aquela pergunta me jogou de novo para o meu laboratório. Eu já estava fazendo doutorado. Eu falei: cara, então espera aí. É essa toda a história que tem nessa confusão toda, que esse menino me perguntou. Porque se é mudança de comunicação, os processos continuam iguais. Se é mudança de processo, por que a comunicação mudando, muda o processo? Aí eu comecei a ver que eu tinha que ir mais fundo na história.
Luciano Pires: Você reparou que os dois momentos de virada que você está me contando partem de duas perguntas? De dois garotos, cara, de dois pupilos? A partir de duas perguntas você faz virada na tua vida?
Carlos Nepomuceno: É. Não. Porque eu trabalho com a ideia de certeza provisória. E eu acredito que é o seguinte, o cara que se coloca como… e eu me coloco como cientista, é assim que eu me vejo. Eu acho que o cientista, ele procura entender a professorinha. A professorinha é a vida. E a professorinha fala através dos seus alunos ou fala através dos fenômenos. Então eu sempre levo muito a sério o que os meus alunos falam para mim. Porque eu fico querendo ver se a professorinha está falando comigo. E a professorinha fala comigo através dos meus alunos. Então os meus alunos dizem para mim se eu estou errado, se eu estou certo. Se eu estou no caminho adequado ou não. Porque a professorinha, o importante é você se aproximar da professorinha. E a professorinha não gosta que você chegue perto. A professorinha é tímida. Ela é, sabe, se esconde. Gosta de uma escuridão. Então você tem que ficar o tempo todo ali sentando, perto dela, pedindo: por favor, me dá uma dica aí. Me conta como que é essa história, que você está aí escondida, etc. e tal. Aí a professorinha, através dos meus alunos, vai me dizendo. Então, naquele momento ali eu falei: cara, joga fora. O meu livro amarelo. Eu fui para o livro azul, que é o Gestão 3.0. Aí, nesse momento, eu tento quebrar, entender. Responder à pergunta desse aluno. E aí nesse momento eu percebo que aí vem a virada da história. É uma novela, Luciano, uma novela. Em que você está assistindo uma novela em que tem uma pessoa que diz que é mãe e tem uma pessoa que diz que é filha. E aí, no final da novela, no último capítulo, você descobre que a filha é mãe. E a mãe é filha. Você já imaginou uma novela desse tipo? Uma novela doida, cara. Mas é. Por que, então, qual foi a história? A história foi a seguinte, como é que eu respondi a esse menino? Demorei cinco anos para escrever o outro livro, 2006, 2013. Sete anos eu demorei para escrever o livro. E tudo isso, com muito esforço. Estudando muito. Eu percebi que é o seguinte, que a sociedade, a primeira coisa que muda profundamente a sociedade é a chegada de uma nova mídia. A mídia é a mãe. E o modelo, os processos administrativos são filhos da mídia. Então quando ele me perguntou: o que está mudando? É mudança de processo ou é mudança de comunicação? Então, como é que eu respondi para ele no meu livro azul? Eu disse para ele assim – eu respondi para ele, mas ele não estava mais perto de mim – aí eu falei para ele: não, olha só como é que funciona a coisa. Eu aumento a população. Essa população precisa de um novo modelo de comunicação para poder resolver os seus problemas e aí tem uma revolução de comunicação. E depois da revolução de comunicação, eu tenho uma revolução administrativa e muda os processos. Então, primeiro muda a comunicação. E geralmente, a comunicação muda fora das empresas.
Luciano Pires: Põe isso numa perspectiva histórica, você consegue botar ela no Gutenberg?
Carlos Nepomuceno: Consigo voltar. Vou voltar sim. 70 mil anos. Eu tenho a sociedade. É uma sociedade nômade, que só gesticula. Eu começo a falar, sofistico a linguagem. Eu sofistico a comunicação. E a partir daí eu consigo criar a agricultura, a domesticação dos animais, o que me permite estar nas aldeias. Eu não preciso mais ficar pulando de um lado para outro, caçando e comendo fruta nas árvores. Porque eu produzo o próprio negócio. Aí o que permitiu acontecer isso foi a oralidade. Salto para 7 mil anos atrás, surge a escrita manuscrita. A escrita manuscrita permite com o livro, que é a Bíblia, bibliografia, biblioteca, que é o livro. Surge a Bíblia. E a partir daí eu crio as grandes religiões monoteístas. E a partir daí eu crio as civilizações e as tribos. Tem o recado de Jesus: amai-vos uns aos outros. Todos são iguais perante Deus. E as tribos começam a fazer negócio entre elas, cria prosperidade. É um tipo de liberalismo entre as tribos. Que Jesus, de alguma forma, essa visão cristã permite os comércios entre as tribos. Por que o que acontece? Você tem uma tribo. Você tem trigo. Eu faço moedor de trigo. O que eu faço? Como a sua tribo é inimiga da minha, eu só tenho uma alternativa, eu invado a sua tribo para roubar o trigo. Ou você me invade para roubar o moedor. Agora, se eu crio um Deus que diz: olha, nós estamos aqui na mesma vibe. Aí eu falo: vem cá, meu irmão, você não quer fazer um jogo comigo? Eu te dou três moedores de negócio e tu me dá 10 quilos de trigo. O que tu acha? Beleza e tal. E começa a negociação entre as tribos. Prosperidade. Então, essa ideia de: todos são iguais perante Deus e amai-vos uns aos outros, foi uma coisa fundamental para a sociedade continuar crescendo. E aí depois nós viemos então, caminhando. Aí depois a gente tem a escrita impressa. Aumentando a população. Já estamos falando de 450 milhões de pessoas. O planeta todo. Aí surge a escrita impressa. Aí surge…
Luciano Pires: A imprensa. O jornal.
Carlos Nepomuceno: O Gutenberg. Aí 1450, a escrita impressa. Aí Lutero começa o processo todo e a gente começa, então a sociedade moderna. E aí a gente vem com uma outra ética, que é: todos são iguais perante a lei. Vamos criar uma sociedade em que a gente possa conviver em sociedade. Tribos diferentes vivendo nos mesmos lugares. Cada vez vivendo e trocando cada vez mais. Aí a gente começa a sociedade moderna. Então, todas as grandes revoluções urbanas – de longo prazo – começam com a nova mídia, por uma necessidade demográfica. Essa necessidade demográfica gera a revolução midiática. E a revolução midiática é o primeiro passo de uma revolução civilizacional, que é o que a gente está vivendo agora. Então, revoluções civilizacionais, elas acontecem naturalmente na história do ser humano. E o que aconteceu quando eu comecei a estudar esse assunto? Não havia uma ciência. E aí é o problema: a gente tem uma crise científica. Não há uma ciência para explicar o digital. Porque aí o cara tenta entender o digital pela comunicação, pela informação, pela economia, pela política, pela sociologia e não consegue entender. Porque você tem que fazer um comparativo histórico, que é o pessoal do Canadá que meu deu a base. E você tem que fazer o comparativo histórico e dizer o seguinte: o que acontece numa sociedade quando vem uma nova mídia? Por que vem uma nova mídia? E o que é novo a partir de uma nova mídia? O que realmente é novo a partir dessa nova mídia?
Luciano Pires: Qual tinha sido a mídia anterior, que provocou uma revolução? Foi a televisão?
Carlos Nepomuceno: É. Aí tem uma coisa interessante. Porque o que acontece, Luciano? Aí tem uma história interessante. Por exemplo, a revolução da prensa, ela é uma revolução de mídia mais descentralizadora. Então ela vai trazer um novo modelo de administração. Você sai da monarquia e vai para a república. Você sai do feudalismo e vai para o livre mercado. Você sai de uma religião mais concentrada para uma religião mais descentralizada, que são os protestantes. Cada um lê a Bíblia e cada um cria a sua própria igreja. Tudo vai na descentralização. Então você vai criando. Só que aí, olha só que engraçado. É a revolução da prensa que permite, a partir de 1800, o salto demográfico de um para sete bilhões. É o mérito do livre mercado que permite que a gente aumente a população. Só que o aumento da população demanda uma mídia descentralizadora. Como a mídia descentralizadora não veio, veio o rádio e a televisão, e aí veio a concentração do século passado. Então você vai aumentando a população. Você vai criando cada vez mais complexidade. E aí no século passado você tem que lidar com essa complexidade e você não consegue. Aí o que acontece? Aparece uma mídia centralizadora, aí você cai, você tem um retorno. Você volta para uma coisa primitiva, que é o nazismo e o comunismo.
Luciano Pires: Por que você chama de mídia centralizadora? Por que centralizadora?
Carlos Nepomuceno: Porque ela é vertical.
Luciano Pires: Explica melhor.
Carlos Nepomuceno: O rádio e a televisão é assim: é um para muitos. O Hitler baseou toda a sua ideia de nazismo, toda a propaganda foi baseada primeiro no rádio e depois no cinema. Então você começa a verticalizar a comunicação. E todo o modelo, todo o sistema social, político e econômico tende à centralização. Porque cada vez você vai ter menos gente falando. Cada vez mais as pessoas vão criando um conceito. As pessoas que estão dentro dessa centralização vão se beneficiando desse modelo. E a partir desse momento, você cria uma verticalização. Aí você tem a violência. Aí você teve o nazismo, você teve o comunismo. Você teve uma certa centralização do próprio capitalismo. E a gente saiu do século passado, talvez como um dos séculos mais violentos da história do ser humano. E a minha explicação é um pouco essa. Porque você precisaria de uma mídia descentralizadora e não veio. Então você aumentou a violência. Então, tem uma coisa interessante que é o seguinte: como você aumentou a complexidade, significa um bilhão, três bilhões de pratos de comida, sete bilhões, vinte e um bilhões de pratos de comida. Então se você vai aumentando a complexidade é o seguinte, o que eu tenho que dizer para você? Querido, olha só, China, quer um sapatinho? Marrom. Quer uma túnica? Cinza. Quer um carro? Preto. Que é aquela frase do Henry Ford: pode escolher qualquer cor, desde que seja preto. O que você faz? Você sufoca as pessoas à diversidade, para resolver o problema da complexidade. Então ou você resolve o problema da complexidade descentralizando o poder ou centralizando o poder. O problema é a complexidade. Porque a gente precisa comer todo o dia. Então, o que acontece? Naturalmente vai se fortalecendo o conceito e tal. Portanto a gente sai do século passado com uma concentração. E você vai centralizando esse troço. Então, o que acontece hoje é que a gente não consegue entender o papel das tecnologias, da mídia e da demografia. A gente acha que o ser humano – quando a pessoa fala, digamos, esquerda e direita – o cara fala: esquerda e direita. Aí fala: esquerda e direita no século 18, no século 19, no século 20, no século 21. Existe a esquerda e a direita. Não. A história é um espiral. É assim que eu vejo a história. A história é um espiral em que você tem como fatores fundamentais na história, duas coisas fundamentais: o aumento demográfico, uma nova mídia. E uma terceira coisa, que são novos modelos de administração. Então, modelo de administração que funcionou para um “x” de habitantes não funciona mais. Os valores que funcionaram para aquele, não funcionam mais. E você tem que ir mudando. Alguns valores são básicos: não matarás, não roubarás, etc. Esses são básicos. Esses continuam sempre. Mas tem coisas que você tem que fazer adaptações, porque vai aumentando a população.
Luciano Pires: Sim. Interessante essa tua tese. Você está falando aí e está me brilhando o olho aqui, da internet, desses sistemas hiperlink, que te obriga… você não consegue mais navegar do ponto A para o ponto B sem passar por um ponto X. Para cada lado tem alguma coisa te levando e você… é de uma riqueza tão grande, que a gente não consegue processar isso. É impossível. O cérebro humano não consegue processar esse tipo de coisa. E isso cai num momento – eu repito para todo mundo isso – em que nós estamos no meio do furacão. E a gente não consegue enxergar o furacão. Nós estamos no meio dele. Há uma mudança, onde eu tenho uma geração gigantesca de gente criada por um modelo antigo, que vem com as técnicas, com os Peter Drucker da vida, traz tudo aquilo que o passado nos ensinou. Com uma geração nova, que nasce já, direto no tablet. E os dois estão se chocando nesse momento. Uns tem uma visão completamente aberta para tudo. E o outro tem aquela visão da hierarquia, do processo como sempre foi, da disciplina militar, do primeiro isso, depois aquilo. Eu vou na escola, módulo A, módulo B. Conectar: primeiro vem o A, depois vem o B. Isso está tudo sendo destruído agora. Nós estamos no meio dessa destruição. Então fica muito complicado para um velho de 60 anos olhar para isso e falar: cara, é assim que vai ser. Cara, eu não consigo nem entender o que os caras estão falando. Pega essa molecada jogando game no vídeo game, no telefone, assistindo Netflix, passando o pé no gato, trocando e-mail. É tudo ao mesmo tempo agora. Eu olho para aquilo, eu falo: eu não consigo nem entender o que está acontecendo aí. E nós estamos no meio dessa divisão. Eu estou colocando isso para você, porque eu vivo um drama meu, diário. Eu faço os podcasts e eu tenho que vender podcasts para possíveis patrocinadores de podcast. E o podcast é um híbrido, cara. É um produto que tem um pouco da economia tradicional e tem muito da economia digital no meio. Ele tem uma parte dele que é o rádio, um microfone, com alguém falando e produzindo conteúdo. E uma outra parte, que é um universo gigantesco, onde os dois se somam. E eu vou conversar com um cara que não consegue entender. Ele tenta olhar para o podcast e falar: isso aí eu vou comparar com uma revista. Não, cara, não é uma revista. Qual é a tiragem? Não, não tem tiragem, cara. Sabe quantos estão ouvindo? Não importa quantos estão ouvindo. Importa a qualidade de quem está ouvindo. Mas e quando que escuta? Quando quiser. Então, ele tem um lance de liberdade ali, que você quando choca diante de um cara de uma agência de publicidade, por exemplo, o cara dá um nó na cabeça dele. Porque todos os modelos que ele tinha até então, de medição, caem por terra, diante de uma coisa totalmente nova, que ele não sabe direito o que é. E ele tem que provar para alguém que a pessoa vai investir dinheiro numa coisa que ela não entende. Então para mim é o meio do furacão. Um pouco a história da minha vida. Eu acho que é perto da tua também. Eu vivo na transição. Eu fico sexualmente maduro no fim da revolução sexual e na chegada da AIDS. Então é no meio de um para outro. Eu acabo não aproveitando nem um, nem outro. As coisas vão acontecendo assim. Deixa eu botar aqui. Essas coisas aqui a gente corta. Me fala mais um pouquinho disso que você falou, essa diferença das mídias, que você colocou. Você tem uma mídia que é… como é que você chamou? Mídia?
Carlos Nepomuceno: Centralizadora.
Luciano Pires: Centralizadora. E você tem a mídia descentralizadora. Me dá um exemplo da descentralizadora?
Carlos Nepomuceno: Eu acho que a prensa, ela foi descentralizadora. Talvez, a chegada da oralidade. Ela foi…
Luciano Pires: Só para botar o que me incomoda aqui. A prensa, por exemplo, ela é uma mídia que serve a muito pouca gente. Porque pouquíssima gente sabe ler, quando ela surge. Ela surge, ela começa a te possibilitar se comunicar com muita gente, mas pouquíssima gente consegue ler, naquela época. A maioria absoluta das pessoas eram iletradas, não conseguiam ler. Então, ela atinge uma camada muito pequena da população. Hoje em dia muito mais gente sabe ler. Pouca gente sabe entender o que está lendo. Mas você já tem. Então, quando você fala que ela é uma descentralizadora, me dá um choque. Porque para mim, só uma camada muito pequena da população é que conseguiu se beneficiar daquela prensa, daqueles livros que estavam sendo impressos e distribuídos na época. E tinha um povaréu, que não tinha a menor ideia do que estava acontecendo. E aquela pequena elite provoca as mudanças a partir daqueles poucos livros, que poucas pessoas começam a ler. Isso é descentralizador?
Carlos Nepomuceno: É, porque assim, se você fotografar o início, aí sim. Mas na minha tese de doutorado, por exemplo, eu tenho um dado lá, que de 1400 a 1500 circularam na Europa – do zero, que não tinha nada – seis milhões de exemplares. Então, ela obviamente vai pegar uma primeira camada. Depois, com o movimento da reforma protestante, como o Lutero começou a defender a ideia de que as pessoas tinham que ler a Bíblia e as pessoas tinham que ter acesso direto à palavra de Deus, cada igreja tinha uma escola do lado. Então aí surgiram as primeiras escolas. Então todo mundo que era protestante, de alguma forma, começou a ler. O que é um pouco a tradição do povo judeu, que também para o cara fazer o Bar-Mitzvá, o cara tem que ler a Torá. Então isso vai criando uma população, que aos poucos, cada um vai lendo e aquilo vai influenciando. Então realmente, se você olhar ali 1450, 1500. Mas se você olhar 1550, 1600, 1650. Então você tem que entender como o time ali é diferente. Você tem que aí trabalhar com alguns séculos. Então, por exemplo, é a chegada da prensa que permite, 350 anos depois, você criar a república. Você não ia conseguir criar uma república se as pessoas fossem analfabetas. As pessoas demandaram a república porque já existia uma maturidade. Então é isso que é o interessante. E é isso que está acontecendo com o Brasil hoje. Primeiro você cria essa mídia descentralizadora. As pessoas começam a ter acesso. E aí, aos pouquinhos, as pessoas vão começando a se empoderar e as pessoas vão saindo de um estágio praticamente analfabeto. Analfabetos em relação a uma série de coisas e elas vão ganhando escala. E tem uma coisa que é fundamental, Luciano, que as pessoas não se dão conta. Olha só, vamos pegar o Brasil, 210 milhões de pessoas. Se eu tenho uma mudança de, digamos, de empoderamento de mídia e de percepção da realidade mais sofisticada, em cada pessoa, 0,2%, se eu multiplico isso por 210 milhões. Isso faz uma diferença gigantesca. Que as pessoas falam para você, falam assim: o brasileiro tem que ter consciência e tal. Mas se cada brasileiro crescer 3, 4% em termos de empoderamento de mídia, isso multiplicado por 210 milhões é um impacto tremendo. É isso que as pessoas têm que entender. Não é que cada pessoa vai agora virar…
Luciano Pires: 100% mudei. Não. É uma pequena onda.
Carlos Nepomuceno: Não. É um pouquinho de cada um, que vai fazendo a diferença. O cara começa a mudar pequenas atitudes no geral. Isso eu não leio mais. Isso eu não aceito mais e tal. E quando você chega, por exemplo, numa eleição, que aquilo vai num somatório. É um movimento de massa que o cara não consegue enxergar.
Luciano Pires: Que é o que está acontecendo agora. Esse é o momento que nós estamos vivendo agora.
Carlos Nepomuceno: Tem uma coisa que eu mudei na internet. No início, no primeiro livro, a gente faz uma imagem de tsunami. A internet é um tsunami. Aí é bonito, bacana, mas não é assim que funciona, que ela é muito mais perversa do que isso. É o que eu acho que o Alckmin aprendeu nessa eleição. A internet, a melhor metáfora é a seguinte: a internet é cupim no armário. Quando você abre o armário não tem mais armário. Toda a ideia de armário. Você só fica com a maçaneta na mão. Porque as coisas vão acontecendo silenciosamente. Você não sabe o que está rolando no WhatsApp, você não sabe o que está rolando no Facebook. Você não sabe o que cada pessoa está acessando. Você não sabe o que as pessoas estão… você não tem mais o controle. Você não consegue visualizar a mudança. E num determinado momento, quando chega uma determinada hora você diz assim: gente, vamos agora fazer tal coisa? Aí aparece milhões de pessoas na rua em 2013. Aí aparece milhares de pessoas para pedir o impeachment da Dilma. Aí aparece não sei quantas pessoas para votar diferente de 2016. E agora em 2018 aparece um movimento gigantesco que ninguém sabe de onde que vem. Por quê? Porque isso é uma característica da nova mídia. É um processo evolutivo. E aí um detalhe: a gente está apenas começando. Quem acha que o negócio agora então chegou. E agora chegou a um patamar que todo mundo não esperava. Cara, nós estamos no início do processo. As mudanças vão ser muito mais radicais do que essas que estão acontecendo.
Luciano Pires: Isso explica de certa maneira, a eleição chocante do Trump. Chocante no sentido de que até o último dia todo mundo dava como carta marcada que ganhava a Hillary, com base em todas as pesquisas antigas, etc. e tal.
Carlos Nepomuceno: Menos o Nepo.
Luciano Pires: Menos o Nepo. Tem em torno de três ou quatro que eu conheço que falaram: não.
Carlos Nepomuceno: Menos o Nepo. E inclusive o seguinte, os meus filhos tiveram que lavar quase um mês de louça lá em casa. Eu apostei como todos eles. E ganhei deles. Então, eu passei praticamente um mês de louça, sem lavar. Porque eu disse: o Trump vai ganhar.
Luciano Pires: Eu agora, durante… eu fiz aqui o LíderCast com um rapaz que tem uma startup que está lidando com inteligência artificial. Ele estava me explicando o processo que eles têm. Eles montaram um processo de algoritmos que navegam pelas mídias sociais e capturam o zeitgeist, o espírito do tempo, a partir dos comentários. A maquininha vai lá e ela entende, pelo teu comentário, se você gosta ou não gosta. Ela não vai procurar você sim ou não. Voto no A, voto no B. Não. Pelo pensamento do meu…
Carlos Nepomuceno: Pelo clima.
Luciano Pires: Eu entendo que ele está por esse caminho. Ele me deu uma aula aqui. Foi muito legal. E agora, um pouquinho antes da eleição apareceu um pessoal de uma empresa que botou o nome de Encuestas Digitales. Eu não sei se você chegou a ver?
Carlos Nepomuceno: Vi, vi.
Luciano Pires: É um grupo brasileiro…
Carlos Nepomuceno: Que está nos Estados Unidos?
Luciano Pires: Mais ou menos. Que para não ser perseguido pelo TSE, multa, aquele negócio, pa-pa-pa e botam um número que não tinha nada a ver com os números aqui e que chega muito perto do resultado final. E ele vem com essa história. Como que é isso aqui? É até difícil de explicar. Mas ele não faz pesquisa perguntando em quem você vai votar. Ele examina e te dá um número ali. E o cara que me trouxe isso, mostrou, falou: isso aqui é tendência, bicho. No futuro pesquisas serão assim. Você vai estar sendo pesquisado sem responder nenhum questionário. Com base no que você conversa, esse algoritmo descobre como que está caminhando e aponta as tendências. Imagina o que isso significa em termos de marketing, em termos até do escritor. Eu vou escrever, eu vou fazer uma série de televisão. Que série que eu escrevo? Roda o algoritmo aí, nós vamos entender para onde a pessoa está indo. Isso é meio esquisito, porque você começa a produzir para atender uma demanda. E se eu produzo pela demanda, eu acabo fazendo um círculo vicioso. Eu estou produzindo para atender uma demanda. E essa demanda eu atendo. Aí eu produzo um pouco mais e no final, eu termino com sertanojo. Eu termino com sertanojo, com funk, com batidão, etc. e tal. E aquele cara que faz o inovador, o cara que cria coisa original, vai sendo escanteado cada vez mais.
Carlos Nepomuceno: Não, eu acho que não. Eu acho que isso já acontecia na televisão. E assim, por exemplo, você pode pegar esses dados todos e, por exemplo, perceber um nicho de tendência. Porque, por exemplo, você pode ter um dado assim: eu quero escrever um livro que vende rápido e tal. Aí você fala assim: não, mas eu quero criar um negócio que vai demorar um pouco para vender, mas vai fazer um sucesso daqui a não sei quanto tempo. Aí o cara pode se basear nisso, por exemplo, a partir dessas visões, assim. Então eu não acho que isso… isso não determina que todo mundo vai ter que fazer isso. É uma opção que a pessoa que a pessoa pode ter. Não é determinante. Porque as pessoas podem dizer – como sempre foi – o cara, sei lá, o cara, muitas vezes, o cara escreve um livro que não imagina que vai bombar e bomba. Sempre vai ter um maluco assim, sabe? Que o cara vai fazer. Vou fazer desse jeito e vou…
Luciano Pires: A minha tese que eu quero colocar aqui. Uma vez, eu escrevi um texto a respeito lá. O pessoal que tem um leitor digital, Kindle, por exemplo, quando você está lendo no Kindle…
Carlos Nepomuceno: Marcar?
Luciano Pires: Marcar. E essa marcação – muita gente não sabe disso – ela sobe para a nuvem e vai lá para a Amazon. E você consegue, antes de comprar um livro, perguntar. Vem cá, deixa eu ver o que a turma marcou. E aí o sistema de mostra. Isso aqui são as marcações desse livro aqui. Um esquema muito bem elaborado de inteligência artificial dá uma olhada nisso aí. E a partir das marcações, pode escrever um best-seller inigualável. Só feito das coisas mais marcantes ali. E se você não ficar esperto, você vira refém disso. Eu vou passar a consumir essa coisa feita para se aproveitar das marcações que todo mundo fez. De novo, nós temos aí todo mundo consumindo o sertanojo. Cabe a mim não entrar nesse jogo. Cabe a mim estar fora desse jogo. Que tem tudo a ver – de novo – com o que está acontecendo hoje no Brasil com as eleições. Então, se eu piscar, eu estou na fakenews. Eu acredito em tudo que estão dizendo aí. E nós estávamos conversando antes de vir para cá. Aquele lance que é o seguinte: todos os ataques feitos ao Bolsonaro dizem respeito a coisas que ele pode vir a fazer. Talvez ele faça, pode ser que, ele disse que vai. Nenhum ataque disse o seguinte: ele efetivamente fez. Aqui está a lei que ele criou. Aqui está o processo que ele montou. Aqui está o cara que ele agrediu de fato. Só tem o: talvez aconteça. O que é uma narrativa. Então essa loucura toda acontece em função de uma narrativa: cuidado que o Brasil pode ficar assim. E não tem nada que você coloque que fale: não, realmente, por tudo que eu estou vendo aqui, que esse cara fez, pode ser. Não, esse cara não fez nada disso. Ele falou. Tem bravata pra cacete. O que tem de bravata não acontece mais. Narrativas conduzindo para a gente… essa loucura que nós estamos vivendo hoje aqui: eu odeio você, porque você vai votar no cara que eu não gosto. Eu cortei você da minha relação de amizades. Não quero mais papo com você. Você não acha que essa coisa é meio… aliás, a pergunta na verdade, é diferente. Como é que eu me protejo disso? Como é que eu garanto que eu não vou romper meus laços sociais em função dessas narrativas?
Carlos Nepomuceno: Bom, o que tem aí é o seguinte, minha tese sobre o Bolsonaro. Eu estou estudando o Bolsonaro há dois anos. Também ganhei a minha lavadinha de louça nesse fim de semana. Disse há um ano atrás que o Bolsonaro ia para o segundo turno. E aí estava o meu filho lá, lavando louça de novo. A garotada… covardia. Mas tudo bem. Então, mas aí é que a garotada não acredita e fica com raiva. Eu falei: então vamos apostar. Não vamos ficar brigando por causa disso. E aí o pessoal vai e a gente brinca. Então também lavou a louça. Então, eu estou estudando o Bolsonaro há dois anos. Porque eu percebi que havia ali um movimento interessante. Então eu comecei e não vim apoiando o Bolsonaro em dois anos, hoje eu estou apoiando. Mas eu estava mais com o João, acompanho o Novo e tudo. Então eu comecei a estudar o fenômeno Bolsonaro, porque o Bolsonaro, ele começou a ter um tipo de aderência, que a primeira coisa que acontece é o seguinte – então, como eu tenho acompanhado o Brasil – eu estou percebendo esse movimento no Brasil de uma certa revolução, que começa em 2013, passa pelo impeachment. Eu acompanhei esse processo todo, fotografei e me envolvi como cidadão também. Depois com o negocio do impeachment, depois o Lula. As eleições de 2016 e tal. Então o Brasil está vivendo – então aí vamos desenvolver uma tese sobre o assunto – o Brasil está vivendo o que eu chamei, inclusive fiz alarde hoje, o que eu estou chamando de revolução republicana tardia. Eu só consigo enxergar essa revolução republicana tardia se eu entendo a mídia como um fator fundamental de mudança. Então, o que está acontecendo no mundo? O mundo é o seguinte, os países desenvolvidos fizeram a sua revolução republicana há 200 anos atrás. O que é a revolução republicana? Qual é a pedra fundamental de um país que se diz moderno? A pedra fundamental é: todos são iguais perante a lei. Isso vale, isso é a base estruturante, é o DNA inicial de uma república. Todos são iguais perante a lei. A partir dali você consegue construir um país, digamos, contemporâneo. Então essa é a base, que é o que eu chamo de ética coletiva estruturante daquela civilização. Então você tem três éticas. Você tinha a ética tribal: todos são iguais perante a lei, menos a nossa tribo. Menos…
Luciano Pires: O nosso inimigo?
Carlos Nepomuceno: Não, o nosso inimigo não, porque eu posso matar o meu inimigo. Porque todos são iguais perante a lei, desde que seja da nossa tribo. Tanto que os judeus – se você vai pegar ali, uma determinada época – eles emprestavam dinheiro para as pessoas que não eram judias e não podiam emprestar dinheiro para as pessoas que eram judias. Porque é a ética tribal. Todos são iguais perante a lei, desde que seja da tribo. Se não for fora da tribo. Então, essa ética funcionou para um tamanho de população. Esse tipo de ética, ela evolui. As outras não evoluem. Coisas básicas do tipo: não matarás, etc. e tal, vale sempre para aquela tribo. Então, sei lá, a tribo canibal pode comer a outra tribo, mas não pode comer a própria tribo. Se não todo mundo acordava de noite: será que vão me comer? Entendeu? Então, o cara tem que poder dormir. Então tem aquela ética. Então aquilo ali funcionou. Aí veio a revolução de mídia e atualizou a ética, que veio, cristão: todos são iguais perante Deus. E aí então se construiu uma sociedade baseada nesse tipo de coisa. As tribos pararam de se matar. Mas ainda existia o rei, que era o cara que tinha o poder absoluto. Então: eu não. Todo mundo segue a regra. Mas eu sou. E aí veio a ética liberal, que deu os países contemporâneos. Então todos os países hoje: Alemanha, Canadá, Holanda, etc. e tal, pa-pa-pa. Eles não estão discutindo essa questão: todos são iguais perante a lei. Para eles, quando eles olham para o Brasil, eles acham e esses intelectuais, esses manés todos que estão querendo avaliar o Brasil, eles acham que o Brasil é uma república. E aí eles começam a fazer uma avaliação do Brasil assim, o negócio da droga: é muito atrasado esse pessoal. Está falando que não quer droga. Aborto? Não. Isso é muito atrasado. E eles estão com uma agenda que é contemporânea, deles. Só que eles não enxergam que o Brasil ainda é uma monarquia. Porque a ética estruturante do Brasil é: todos são iguais perante a lei. Menos o Renan Calheiros. Menos o Maluf. Menos o Temer. Menos as empreiteiras. Menos o PCC e menos o PT. Que é uma aliança que houve, de todas as máfias do Brasil. Fizeram uma aliança e fizeram um governo mafioso. O movimento da Lava Jato e o movimento de 2013, impeachment, prisão do Lula, 2016 e 2018 é um movimento de revolução republicana. Há uma unidade, uma união entre brasileiros republicanos que querem garantir no Brasil: todos são iguais perante a lei. Se você analisar todos os movimentos cantam o hino, levantam a bandeira, protegem o Sérgio Moro. Prende o Lula. Prende o Maluf. Não tem bandido de estimação. A nossa bandeira não será vermelha. Tudo é republicano. E nós estamos então, de baixo para cima, criando a nossa república. Então é uma revolução republicana tardia. Não é esquerda e direita. É monarquia mafiosa, com o PT também nessa linha, que os marxistas são monarquistas, tirânicos, de um lado. E a galera republicana do outro. Quando as pessoas dizem, por exemplo, o negócio do Hitler, que o Bolsonaro é igual ao Hitler e aí falam assim: a população também elegeu Hitler, tal e tal. Mas a coisa que é engraçada é o seguinte: o Bolsonaro é muito mais perto do Lutero. Por quê? Porque o Lutero, ele inicia o processo da reforma protestante. E a base da reforma protestante é as pessoas lendo as coisas. Então as pessoas vão lendo e elas vão modificando a sua consciência a partir da leitura e vão a partir daí criando um movimento de baixo para cima. A reforma protestante foi feita de baixo para cima. Tanto que no filme Lutero – tem no Youtube, quem quiser assistir – o Lutero, ameaçam assassinar ele, mais ou menos parecido com o Bolsonaro. E colocam ele num castelo. E a reforma protestante acontece sem o Lutero. Começa um mata, mata lá, todo mundo quebrando as igrejas todas. Pegando os padres, matando todo mundo. E o Lutero estava encostado num castelo. Ele não participou de nada. Então não foi um movimento que tinha um centro que estava querendo. Que é diferente do Hitler. O Hitler tinha um centro, tinha um contexto e veio de cima para baixo. Então, a gente está fazendo uma reforma. Nós estamos fazendo uma revolução republicana tardia, em que o eixo central dessa eleição do Bolsonaro e desse movimento que começa em 2013 é: o Brasil quer ser um país republicano em que todos são iguais perante a lei. Essa é a base estruturante da república. Depois que a gente conseguir garantir isso, a gente pode ir caminhando para as outras coisas. As outras prioridades vêm depois. Então um pouco essa é a minha análise. Então, quando a gente fala isso em relações pessoais – que foi o que você me perguntou – o que acontece é o seguinte: eu me afastei de todos os meus amigos petistas. Todos. Aí a pessoa falou assim: Nepo, você brigou por causa de política? Eu falei: não. Eu não briguei por causa de política com nenhum amigo meu. Porque a discussão política é o seguinte: você acha que tem que botar um esgoto aqui não sai onde? Você acha que tem que botar um ponto de ônibus? Você acha que tem que botar uma praça ali? Política é uma questão operacional. O debate que existe no Brasil hoje é um debate ético. Existe uma galera que defende uma ética tribal, monárquica, em que todos são iguais perante a lei, menos o Lula. E que eles defendem isso, dizendo isso aí é a ética que eu defendo. E existe uma galera que diz: não, não temos bandido de estimação. Então são duas éticas diferentes. O que leva a ética que eles estão falando? A ética que eles estão fazendo dá em paredão. Se você analisar o desdobramento dessa ética, eles vão justificar o seguinte: nós, porque somos especiais, teremos o direito, já que o Lula não pode ser preso e tal, no diapasão disso, você vai acabar no paredão. Você vai dizer: bom, ele pode fazer o que ele quiser, inclusive…
Luciano Pires: Exterminar quem…
Carlos Nepomuceno: Como o Maduro está fazendo. Eu posso exterminar. Eu posso te prender. Eu posso te exilar. Eu posso fazer o que eu quiser. Porque eu sou especial.
Luciano Pires: E preparo um ambiente que me garante que eu posso fazer. Porque o STF está a meu favor. Está todo mundo. Eu posso fazer. Como é que você explica essa histeria que nós estamos vivendo aqui hoje, cara? Que o negócio é histérico. Se eu chegar e falar assim: bom dia, hoje é dia 17. Eu estou fodido, cara. Em seguida me detonam no Facebook. E é histérico. Porque você olha aquilo e fala: cara, não tem argumentos com pé e cabeça. Tem histeria. Como é que você explica essa histeria aí? Você falou alguma coisa em torno de uma certa…
Carlos Nepomuceno: É. Eu também demorei, eu estou estudando. Quer dizer, estudei o Bolsonaro durante esses dois anos. Li. Às vezes… chegou um cara para mim: o Bolsonaro é isso. Eu falei: quantas entrevistas você ouviu do Bolsonaro? Nenhuma. Quantos textos você leu, das pessoas ali, próximas do Bolsonaro? Nenhuma. Quantas lives você viu do Bolsonaro? Eu já vi, desde que eu estou estudando, sei lá, você pode botar aí umas duzentas e tantas horas de vídeos do Bolsonaro. Ele com o Olavo de Carvalho. Ele sozinho nas lives dele, etc. e tal. Ele assim, nas intimidades dele, etc. e tal, para eu poder formar um juízo. Eu não gosto de ser emprenhado. Então eu comecei a estudar e estudo a fundo. Eu sou meio obsessivo. Então eu fui formando o meu conceito, para ver até o risco que existiria, etc. e tal. E fui conhecendo a figura. Por até – pelo nosso início de papo – por eu ser filho de militar eu conheço a caserna. O militar é… o Bolsonaro é um militar típico. Se você entrar lá num quartel onze horas da noite, o pessoal antes de dormir, todo mundo é Bolsonaro. Ele não é um cara diferente daquela galera da tropa. Ele é a média da tropa. O que as pessoas não gostam é que alguém da tropa está assumindo. Mas ele é da tropa. Aquelas brincadeiras, tudo é da tropa. Entendeu? Não é nazista. É tropa. É a cultura mediana de uma caserna, em que você tem 800 homens dormindo junto. É mais ou menos isso. É que nem aquele clima de pelada, está entendendo? Banheiro de pelada ou cerveja depois da pelada. É mais ou menos aquilo. Um pouco diferente aqui. Mas é aquilo ali. Então isso aí não pode confundir o que é uma cultura, digamos assim, de maneira geral, popularmente falando, em que tem essas brincadeiras e tal, de uma coisa que o cara diz: eu não gosto, eu vou matar, vou bater. Se o cara passar na minha rua eu vou dar um tiro no cara. Isso é completamente diferente. Que o brasileiro não faz isso. Então o que eu acho que acontece é: a mídia centralizada, ela criou uma bolha. Isso é uma característica de um fenômeno como esse midiático. Você criou uma bolha da mídia centralizada em que, se eu estou perto da mídia centralizada, eu tenho influência, eu controlo tudo. E aí criou-se uma espécie de alucinação coletiva em função dessa mídia concentrada. E essa alucinação coletiva, as pessoas, tem gente que realmente acha que o Bolsonaro vai criar um campo de concentração. Não é marketing da campanha. Se a gente analisar o PT – e aí eu fiz uma live recente sobre isso – se a gente analisar o PT. Porque aí você vai falar: qual é a diferença de um cara esperto e de um maluco? O cara esperto não come dinheiro. O maluco come dinheiro. O que significa isso no popular? Se o PT tivesse acreditado que o golpe e a prisão do Lula era uma questão, se a Dilma, etc. e tal, lindbergh etc. e tal tivessem acreditado que aquilo ali era marketing, era só marketing, na hora dessa eleição, eles teriam feito que nem a Gleisi Hoffmann. Todo mundo saía para deputado e depois ia dizer. E estava todo mundo eleito. O que mostra que eles eram malucos e eles acreditavam no discurso deles? Porque eles saíram para o senado. Então eles comeram dinheiro. Porque eles se prejudicaram. Eles não tiveram estratégia. Eles acreditaram no discurso deles. Então, nesse momento, eu percebi que não se trata de marketing. É alucinação. A Gleisi foi espertinha. Eles não. Então, essa alucinação coletiva, como é que você resolve isso, Luciano? E aí uma recomendação para os teus ouvintes. É o seguinte: foi golpe. Então, se eu tivesse mudado a coisa e eu digo agora para as pessoas em relação ao Bolsonaro o seguinte: não foi golpe. Então vamos fazer o seguinte: vai ter eleição em 2018 e vamos deixar a população julgar. O Lula é honesto. Vocês estão defendendo um conceito. Vamos deixar a população julgar. Porque é mais gente pensando e analisando e vai votar e vai avaliar o que você está falando. Aí deixa a população julgar. O Bolsonaro é nazista. Vai ter campo de concentração. Beleza. Não vamos se estressar por causa disso não. Vamos deixar passar um ano, dois.
Luciano Pires: Nepo, mas a população elegeu Hitler. A população matou Jesus.
Carlos Nepomuceno: É o que eu estou falando: então você tem uma hipótese – que é uma hipótese bacana, que você está propondo, é uma hipótese – você está dizendo que o Bolsonaro é, três pontinhos. Mas isso é uma hipótese. Porque na prática, ele não está ainda matando judeus. Por enquanto. Porque é o que você está dizendo. Ele ainda não está matando judeus, não está matando negros, não está matando mulheres. Ele não está escravizando ninguém. Ele não está jogando ninguém no mar ainda.
Luciano Pires: Mas há possibilidade da narrativa.
Carlos Nepomuceno: A possibilidade. Então, o seguinte, então tudo bem. Então, se você está dizendo que existe essa possibilidade, como ele já está eleito e não tem como mudar, a não ser que matem o cara agora, vamos esperar. E daqui a um ano, vamos fazer a avaliação e vamos ver se essa alucinação que você está vivendo agora, não é igual à alucinação do golpe, não é igual à alucinação que o Lula é honesto, não é igual à alucinação de que vocês iam eleger o Lula e que o Haddad ia ser eleito facilmente. Vamos esperar. Vamos ver a realidade. Então, o que eu acho que vai acontecer aos poucos é que existe… eu faço uma distinção entre vários tipos de marxista, eu não chamo o pessoal de esquerda, não existe esquerda, uma coisa importante; eu não chamo de esquerda porque não existe esquerda, não existe um filósofo chamado Zé de Esquerda, existe um filósofo chamado Marx. Karl Marx. Então se o cara defende aquelas ideias, a gente tem que dar nome aos bois. O cara é marxista. Eu sou liberal. Eu parto de Adam Smith. Eu não tenho vergonha de dizer que eu sou liberal. Tenho um conceito, tenho uma ideia, tenho uma proposta de mundo. E eles são marxistas. Mas eles se escondem na esquerda. Porque fica uma coisa superflexível. Você chega para um cara de esquerda e pergunta: meu irmão, você é marxista? Não. Eu sou de esquerda. Mas qual é o filósofo que você se baseia. Marx. Então é marxista. Então tem o marxista que eu chamo marxista serial killer, de apartamento. O serial killer de apartamento é aquele cara que… é o Fidel Castro, que você está dormindo, o cara te mata. Depois que eles viram que não estava dando certo essa história, eles criaram o serial killer de barzinho. Que é o cara que fica no barzinho, inclusão social, bacana e tal. Aí tu entra no carro dele, o cara te leva para o beco. Está entendendo? Então você, voluntariamente entra no carro do serial killer. Então é um cara todo jeitoso. Ele vai falar coisas bacanas para você. Você vai acreditar. Esse cara aqui é o Stédile, é o Zé Dirceu, é o Boulos.
Luciano Pires: Um maluco.
Carlos Nepomuceno: O serial killer de apartamento. O serial killer de barzinho é o Haddad, é um cara assim, mais light, não sei do quê. Esse cara não vai comandar o pelotão de fuzilamento. O Stédile vai. Depois você tem o marxista Nutella, que é a galerinha que você conhece que está acreditando que o PT, que ele é bom, que ele é bacana, que essa história de Venezuela… você bota um… como é que bota? Aquele detector de mentira. Aí você fala: você quer que o Brasil vire uma Venezuela? Ele vai dizer: não. E vai ser verdade isso. Só que ele não percebe que ele é uma peça de uma engrenagem que no final tem um serial killer que vai trucidar todo mundo.
Luciano Pires: Puxando as cordinhas lá.
Carlos Nepomuceno: Então esse cara é um mané, otário, que está indo na onda. Então essa galera aqui até a eleição de 2018 era o que o pessoal chama de petistas. Aqui, que acredita no Lula, no golpe, etc. e tal. O marxista Nutella. Quando o Bolsonaro começou a ter chance de ganhar apareceram duas modalidades novas de Nutella, que eu chamei o super Nutella e o hiper Nutella. O super Nutella é aquele cara que coloca no Facebook: eu sou antipetista, mas vou votar contra o Bolsonaro. Agora eu sou Haddad. Esse é o super Nutella, que ainda está sob influência do marxismo, mas fica ali, não sei o quê. E o hiper Nutella é o cara do voto nulo: não. Aí arranja uma desculpa qualquer. Todos influenciados pelos marxistas. Então a gente tem uma influência fortíssima do marxismo na sociedade brasileira. Essa influência é diferente para cada pessoa. Não é uma coisa assim, que aí quando você ouvir alguém dizer: Nepo, você está dizendo isso? Eu não acredito nisso. Isso é uma fantasia da sua cabeça. É porque o cara é marxista Nutella. Ele não tem noção de onde que ele está, qual é a história toda. E nós, agora, Luciano, a gente tem que encarar esses caras como aqueles caras do Santo Daime, está entendendo? Que o cara toma Santo Daime, fica lá viajando na maionese e quer botar fogo na casa, achando que não vai pegar fogo. E aí você tem que ser uma espécie assim, de papai dos adolescentes. Fala: não, não, está bom. Está certo. Está tudo certo. A gente vai caminhando e vamos ver no que vai dar. E aí a gente vai mostrando na prática. Aí o hiper Nutella vai começar a acordar um pouquinho mais… vai ser o primeiro que vai acordar. Vai ser o que vai falar: realmente, eu estava vacilando. Depois vai ter o super Nutella, que talvez chegue também. E os outros três? Os outros três vão…
Luciano Pires: Esses não têm…
Carlos Nepomuceno: Não tem saída.
Luciano Pires: Não tem saída.
Carlos Nepomuceno: Não tem saída. Então eu acho que são as minhas viagens que eu estou fazendo em relação a essa eleição, cara.
Luciano Pires: Mas é, cara. E é uma doideira. Eu escrevi um livro, eu publiquei em 2009 que tinha textos de 2007 em diante. Quando eu falava dessa coisa, dessa divisão que estava acontecendo no país. E falava: esse negócio vai dar merda um dia. Vai dar merda essa confusão. A gente não vai conseguir num determinado momento conversar civilizadamente mais, porque vai ser defesa de narrativas. Eu bato muito nessa questão da narrativa. O que acontece? Quando eu vejo uma narrativa, eu falo: cara, me dê o fato. Eu quero ver o fato que suporta essa narrativa. Se não tem fato, não tem narrativa. Se não tem fato, não tem narrativa. E eu tenho visto muito isso. Você falou uma coisa para mim, que foi fundamental. A minha filha outro dia chegou para mim e falou: pai, eu fui dormir seis horas da manhã. Porque eu passei a noite inteira assistindo todos os vídeos que eu podia, do Bolsonaro. Eu: por quê? Ela falou: porque minha turma toda odeia o cara. E eu ouvi tanta coisa, que eu queria ver como que era. E eu fui assistir e eu mudei de ideia. Eu acho que não é tão ruim assim não. O que aconteceu? Ela foi à fonte primária e ela ouviu da boca do cara, no contexto que aquilo foi dito. Ela falou, ele falou um puta absurdo. Mas olha o contexto. Justifica o absurdo que ele falou? Não. Mas explica. Por que ele deu aquela porrada? Por que ele xingou uma mulher? Porque teve uma coisa acontecendo antes. E alguém corta aquele pedacinho e cria uma narrativa. Eu acho que o Brasil tem um case para entrar para a história agora. Um case de manipulação de mentes. Um case de manipulação de narrativas. Um case de construção de uma história, que é muito parecido com o que aconteceu nos Estados Unidos. A diferença daqui para lá é que é favas contadas que o Bolsonaro está com a mão na taça. E lá era o contrário. Até a última hora o Trump não ia ganhar de jeito nenhum. Mas é uma narrativa. E depois que o Trump ganhou, a gente olha o que está acontecendo lá. Cara, já faz dois anos?
Carlos Nepomuceno: É.
Luciano Pires: E ele apanha todo dia. Todo dia. E como ele não dá o braço a torcer e fala besteirada, ele continua alimentando. Não evoluiu essa história nos Estados Unidos. Você pega, deixa eu ver os números dele. Ele mostra os números. Aí você fala: mas não é que as coisas estão encaixando? Aí, quando você comenta, o pessoal da narrativa vem e fala: não, isso é por enquanto. Calma. Lá na frente a coisa vai piorar. Sempre: poderia, seria, vai acontecer. Talvez. Sem base em fatos.
Carlos Nepomuceno: É. Que eu acho que acontece o seguinte, cara, eu acho que, por exemplo, eu acho que aqui a gente tem uma série de problemas aí, que essa bolha, ninguém defende a monarquia, porque não se beneficia dela. Então os artistas se beneficiam. A mídia se beneficia. O cara do bolsa família se beneficia. O servidor, muitos dos servidores públicos se beneficiam. Então, tem muito de, digamos assim…
Luciano Pires: Proteção…
Carlos Nepomuceno: Corporativa. Então, eu acho que o Brasil precisa desse choque, porque toda essa bolha, ela é construída a partir de determinados benefícios que estão escravizando o resto da população, com os impostos. Então no momento que, por exemplo, a mídia tiver que viver de empresas e de assinantes, de público, ela não vai poder fazer o que ela está fazendo. Porque o que ela está fazendo agora nessa reta final é tipo assim, a gente não precisa de fakenews na internet. A própria mídia cria o fakenews. É uma coisa tão desequilibrada. Você vê determinadas jornalistas, sei lá, o caso da Miriam Leitão, por exemplo, ela escreve sobre economia num jornal. E o mercado já fez a precificação em que, o Bolsonaro ganhando, o dólar cai e a Bolsa sobe. Então o mercado já precificou o Bolsonaro. E ela continua batendo no Bolsonaro. E ela deveria ser uma pessoa que deveria ser respeitada pelo mercado. Se O Globo dependesse do mercado para sobreviver, certamente aquele mercado diria: eu preciso de outro colunista no lugar da Miriam Leitão. Porque a Miriam Leitão, ela está distorcendo uma coisa que está atrapalhando, eu ganhar dinheiro. Por que o cara vai ler caderno de economia?
Luciano Pires: A Jovem Pan já percebeu isso, você viu? A Jovem Pan mudou um monte de gente lá, cara. Aquele trem é muito esperto. Eles sacaram isso e foram mudando. O colunista que ia na batidinha, eles falaram: cara, desculpa bicho, isso aí é contra tudo o que nós estamos vendo aí. Aí eles mudaram. Tanto que ela é um ponto fora da curva.
Carlos Nepomuceno: É. A Jovem Pan eu acho que é um caso. Inclusive agora, essa última semana, eles estão mudando de novo. Por exemplo, a Vera Magalhães, ela está nesse discursinho com o pessoal ali do pingo nos is. Está indo superbem. Está bem equilibrado. Mas ela começa com aquele papo dela assim, tipo: olha só, eu queria… a gente… não vamos discutir Venezuela e nazismo. Vamos discutir os programas de governo. Aí você fala assim: não, espera aí. Você está comparando duas coisas. Uma coisa é um projeto que teve o Fórum de São Paulo em 1990, que teve dinheiro desviado, que teve dinheiro enviado para os caras, que hoje existe uma ditadura real na Venezuela, que o governo atual mandou um marqueteiro, que é o mesmo marqueteiro do presidente daqui. O presidente daqui apoia lá, etc. e tal. Existem 800 fatos concretos em que o Brasil estava indo para Venezuela. E você está dizendo que existe um negócio. Não, não vamos discutir as duas coisas. Como se as duas coisas fossem criadas…
Luciano Pires: Ou uma ou outra? Ou uma ou outra?
Carlos Nepomuceno: E não: isso aqui é real e isso aqui é fantasioso. E ela não consegue ver. Por quê? Intoxicação marxista. Então é o que eu digo: é marxista Nutella ou super Nutella. Então isso é um fato concreto. E isso a gente só está enxergando agora. Têm pessoas que estavam escondidas no seu marxismo, que o marxismo aflorou rapidamente.
Luciano Pires: Meu caro, isso aqui é um programa de liderança e empreendedorismo, o fundo.
Carlos Nepomuceno: É isso? Então não deu certo.
Luciano Pires: Não, deu. Se deu. Tudo que você está falando aí está dentro de um contexto que está impactando no dia a dia da gente aqui. Você me deu um livro de presente agora a pouco chamado?
Carlos Nepomuceno: Administração 3.0. Por que e Como Uberizar Uma Organização Tradicional?
Luciano Pires: Isso aí. Então eu bati o olho ali e falei: uberizar. Olha só. Cinco anos atrás ninguém teria a menor ideia do que você está falando. Nem sei o que é Uber. Hoje a minha vida anda por causa do Uber. E você escreveu com uma visão meio interessante, uberizar uma empresa. Me conta o que é, do que se trata isso?
Carlos Nepomuceno: Bom, olha só, para mim, a grande novidade que a gente tem com a chegada da internet é a chegada de um novo modelo administrativo. Esse novo modelo administrativo surge a partir de uma nova linguagem. Que linguagem é essa? É a linguagem dos rastros. Então, analisando as mudanças de mídia ao longo do tempo, que é a ciência que a gente desenvolveu, Antropologia Cognitiva, a gente vai perceber que vão chegando novas linguagens. E essas novas linguagens vão permitindo que a gente consiga quebrar determinado limite e ir para outro. Então, se eu comparar cooperativa de táxi com o Uber, a cooperativa de táxi tem uma linguagem, que é uma linguagem baseada na oralidade e na escrita. Então tudo que acontece ali vai rolar através carta ou voz, e-mail, qualquer coisa vai ser. Não gostei de tal motorista. Vai para o diretor, o diretor analisa, toma uma decisão. E tudo vai. Eu quero um táxi, não sei o que, aí liga, não sei o quê. Tudo é voz e tudo é texto. Então era a limitação do modelo de administração que a gente está chamando de gestão. Para mim, gestão e administração não são sinônimos. Beleza. Aí quando a gente fala de Uber, aquilo é curadoria. Não tem gerente, não precisa ter gerente. E eu uso uma nova linguagem. Qual é a nova linguagem que o Uber usa? É uma linguagem dos rastros. Aí o cara vai dizer: mas dentro do Uber tem gente que trabalha, que tem gerente. Mas se eu pegar uma empresa, digamos, atual, tradicional e disser: eu vou atender São Paulo inteira com, sei lá, 100 mil motoristas de Uber, eu precisaria para aqueles 100 mil motoristas, sei lá, um conjunto aí de 300 gerentes. Eles não têm gerente nenhum para os 300 mil motoristas. Como é que eles conseguem isso? Eles podem ter gerente na plataforma, mas não na operação. Então, como é que eles conseguem isso? Eles criam uma linguagem dos rastros, que cada pessoa avalia o motorista e o passageiro, e aquilo, de baixo para cima, permite uma descentralização da administração. Então são dois modelos. O problema disso tudo aí é o seguinte: são dois modelos incompatíveis, Luciano. Quando a gente passou da monarquia para a república, eu consigo perceber a mudança do rei para um primeiro-ministro e dos nobres para os parlamentares. É mais ou menos parecido. É mais sofisticado, mas é radical. Mas não é disruptivo. Agora é disruptivo. Por quê? O modelo de administração que a gente tem hoje, que é de gestão, ele é mais próximo dos mamíferos. E o modelo da curadoria é mais próximo dos insetos, das formigas. As formigas trabalham assim. O Waze é formiga total. Eu, através dos rastros, as pessoas vão ajudando umas às outras. Então, esse modelo – e aí que vem uma crise nas empresas – ele é incompatível com o modelo atual. Se eu plantar um pé de Uber, de cooperativa de táxi. Você pode fazer designer thinking, meditação, qualquer coisa, não vai nascer Uber. Então nesse livro, o que eu digo para a galera? Gente, tem que criar uma área separada. E nessa área separada, criar como se fosse uma empresa nova, que vai experimentar a curadoria, que vai experimentar a linguagem dos rastros, que vai experimentar um novo modelo, uma nova cultura administrativa. Vão ser duas áreas. Essa área continua funcionando, atendendo os clientes que querem ficar nisso. E você tem que criar uma área que eu brinco que você tem que pensar no cliente que está na barriga da mamãe. Esse cliente vai ser curadoria praticamente. Ele só vai querer curadoria. Aí tem um vídeo que eu fiz – fez muito sucesso – que eu digo o seguinte, para fazer o pessoal entender: a TV Globo é a televisão tradicional. O Netflix é uma radicalização da TV Globo. Por quê? Porque eu mudo o canal. Mas eu continuo controlando o conteúdo. Então, é uma gestão na internet. Eu mudo a plataforma, mas continua igual. E a TV Globo só pensa, a tara da TV Globo é virar um Netflix. E eu já conversei com algumas pessoas lá de dentro, eu falo. Mas isso tudo é gestão. Onde você vê a curadoria? É o Youtube. Por que o Toutube é curadoria? Porque não controla o conteúdo. É internet e não controla o conteúdo. Ali eu tenho um novo modelo. E ali eu uso os rastros. Então, são três modelos. Mas o pessoal não gosta de Netflix. Gosta. Mas gosta de Youtube. Então, o que seria, do ponto de vista competitivo, se eu fosse contratado pela TV Globo, o que eu diria para eles? Eu melhoro a TV Globo para os assinantes, para o pessoal que assiste TV Globo ainda, que é uma classe ainda que está bem, digamos assim, antiga. Eu faço o Netflix, mas eu faço Youtube também. Eu tenho três áreas da TV Globo que atua em três coisas diferentes. Com isso eu fecho o círculo. Eu garanto que eu tenho clientes em todas. E eu começo a roubar, resgatar os clientes que foram para o Netflix e resgatar os clientes que foram para o Youtube. O que a TV Globo faz? E olha só que engraçado, Luciano. E eu já conversei com algumas pessoas. Sabe o que o cara disse para mim? Não, Nepo, a gente não pode criar o Youtube porque isso não tem a ver com a nossa filosofia. Eu falei: legal. Então você faz o seguinte, todo bebê que nascer, você dá um cartãozinho para ele, dizendo: olha, você não pode aceitar a filosofia que está vindo aí e tal, porque essa filosofia não é legal. A filosofia legal é da TV Globo. Então, os caras estão perdidos. Eles estão vivendo de certa forma, o que a gente discutiu na política, na administração. Eles estão vivendo uma espécie assim, de delírio coletivo.
Luciano Pires: É uma questão de tempo. Abril já foi.
Carlos Nepomuceno: Já foi.
Luciano Pires: A Globo foi.
Carlos Nepomuceno: A Globo – não sei se você sabe – mandou uma porção de gente embora.
Luciano Pires: Ontem eu vi: 75 jornalistas lá do Extra, mais não sei quem lá. Eu também fiz um texto recente, eu falei de duas experiências minhas na Globo, uma na Vênus Platinada, que é o prédio lá. Onde é?
Carlos Nepomuceno: No Jardim Botânico.
Luciano Pires: No Jardim Botânico. E a outra no PROJAC. Eu visitei os dois.
Carlos Nepomuceno: Recreio.
Luciano Pires: Na Vênus Platinada, eu entrei naquele prédio e eu fiquei embasbacado, porque eu passei por vários andares e tinha ilhas de edição assim, centenas, ultrassofisticadas. Todas vazias. Ninguém. Eu falei: cara, mas o que está acontecendo aqui? Não, não, mais tarde isso aqui vai encher. Agora está vazio. Então, a maior parte do dia aquilo está tudo vazio. E, de repente, enchia. Vou gravar lá um programa. Sentado, esperando, olhando em volta, uns 20 caras, bicho. Um cara puxando cabo, outro botando a lâmpada, não sei o quê. Eu falei: cara, não é possível. Aí eu vou no PROJAC. E vejo aquela coisa faraônica. Nepo, não há mais dinheiro no mundo que pague uma estrutura como essa, cara. Não tem como você… não dá para você pagar uma ilha de edição que fica parada 17 horas por dia e depois vai a milhão durante cinco, seis horas, entendeu? Não dá. Não tem quem pague o exército de carpinteiros que estão dentro do PROJAC ganhando um salário para construir aquela estrutura. Aquilo é… a Abril provou. Acabou. Vai desmonta. Não há mais receita para isso tudo aí. E é isso que você falou: parece que os caras não enxergam. Eu fui ver uma área deles de evolução, os caras discutindo o que vem pela frente, o rádio digital e tudo mais. Mas calcado nesse modelo de: vamos ter tudo verticalizado aqui. Eu tenho tudo aqui dentro de casa. Eu não preciso de ninguém de fora. Eu pago uma estrutura gigantesca. Que vai acabar o dinheiro. Por isso que eles estão desesperados, se o Bolsonaro ganhar.
Carlos Nepomuceno: É. Eu acho que vai ter aí. Eu não sei se ele vai conseguir fazer isso. Essa é uma das minhas dúvidas. Umas coisas eu tenho certeza. Essa é uma dúvida. Eu acho que se ele realmente cortar esse dinheiro, que é fácil, das empresas estatais bancando essas mídias para poder meio que comprar o apoio de alguma forma, velada ou não. Porque a crise já existe em função relação com o leitor e com o assinante, etc., etc. O que sustenta muito tem a ver com o Estado. Se o Estado tirar isso, você vai ter aí uma coisa muito interessante. Porque as pessoas vão ter que ir em direção ao cidadão. O que a gente vai viver agora, na minha opinião, é o seguinte, a gente vai ter aí um ciclo muito interessante, que é: várias organizações que estão de costas para a sociedade – é isso que acontece depois no modelo de administração que a gente está criando – é o retorno do consumidor. O consumidor que era o rabo que estava balançando o cachorro, o cachorro está assumindo de novo o rabo. Essa que é a mudança que a gente está fazendo. O rabo está balançando o cachorro em todas as áreas. As empresas têm mais poder que o consumidor. O funcionário público tem mais poder que o consumidor. Todo mundo tem mais poder que o consumidor. E o consumidor não tem poder nenhum. O cidadão está dizendo: não, a gente tem poder também. A gente pode eleger as pessoas.
Luciano Pires: E esse quadro que você está descrevendo, vai lá no Adam Smith. Isso não tem nada a ver com o que ele pregava lá atrás, com a coisa, o mercado é que determina. A meritocracia. O mérito é se eu conseguir agregar valor para as pessoas. Eles vão me retribuir com o mérito. No momento que eu me torno o bam-bam-bam, o rei da cocada preta, eu sou dono da operação e foda-se você, boto o preço que eu quiser, te atendo do jeito que eu quiser e dane-se, porque você não tem alternativa, você vai ter que ficar comigo. Não é mais nada. Não tem mais nada a ver com o desenho original. Isso não é capitalismo. Isso é outra coisa: uma tirania de mercado.
Carlos Nepomuceno: É monarquia. É monarquia que finge ser livre mercado. Agora, a projeção disso – e eu tenho acompanhado isso também – o grande movimento que está surgindo, que vai crescer fortemente é o movimento liberal. O que vai bombar no Brasil, essa coisa do Partido Novo. O próprio Bolsonaro falando de liberalismo, etc. e tal, pa-pa-pa. E o liberalismo – isso aí é uma coisa que eu cheguei à conclusão – é o seguinte: eu não chamo de liberalismo. Eu chamo de descentralismo. O descentralismo é um movimento da espécie, praticamente espontâneo, por uma necessidade básica. Não é compatível… ontem eu estava assistindo uma palestra do Maurício Vargas falando do Reclame Aqui. Ele é o presidente do Reclame Aqui. E ele estava falando desse conflito entre os consumidores e as empresas. O modelo do Uber, o modelo do blockchain é justamente o seguinte: não há possibilidade de diálogo de uma população com o poder de mídia que ela tem hoje, negociar com organizações que não foram preparadas. É como se fosse assim, é assim: eu posso ter uma TV Globo, eu posso ter um modelo todo de empresas. Mas eu não posso dar para o cidadão, a consciência que ele está tendo hoje. É incompatível. O cidadão hoje olha para o congresso nacional, ele não aceita. Ele não aceita. Ele não aceita mais o PT. Porque o PT fez sentido com a mídia concentrada. O PT foi o primeiro a dizer que ele era contra a mídia concentrada. Mas foi um dos principais beneficiados da mídia concentrada. Porque ele tomou conta de todos os espaços da mídia concentrada, fingindo que a mídia concentrada era inimiga dele, quando na verdade, era uma aliada. Você vê isso claramente agora. Então, a gente está começando um ciclo no Brasil – e eu falei isso nas minha lives, no Facebook, eu faço o Andando – eu falei para a galera o seguinte: se preparem, momento do cabo Daciolo: glória a Deus.
Luciano Pires: Glória a Deus.
Carlos Nepomuceno: É isso aí.
Luciano Pires: Glória a Deus.
Carlos Nepomuceno: Glória a Deus. Então, momento do cabo Daciolo. Então o que acontece? Apertem os cintos. Apertem os cintos para o Brasil que vai acontecer a partir da eleição do Bolsonaro. Você não vai reconhecer mais o congresso nacional. Não imaginem que o congresso nacional vai ser parecido com o que você sempre sonhou com um congresso nacional. O congresso nacional vai ser aquela coisa assim, de você ter orgulho do congresso nacional. A galera que está indo para lá, essa garotada nova que está indo, o pessoal do MBL, esse pessoal do Partido Novo, esse pessoal que foi eleito, claro, uma parcela desse pessoal do PSL, que eu não conheço todo mundo. Muitos senadores que estão indo, essa galera não vai aceitar o que está rolando não, cara. Vai criar uma quizomba lá dentro. Esses parlamentares que foram reeleitos, eles foram reeleitos ali, com o dinheiro que eles conseguiram levantar. Então, eles também vão entrar lá, tipo assim: gente, eu não quero ser, digamos, o velhinho aqui que está querendo o velho congresso. Então vai ser um ciclo de mudança. Esse governador de Minas, o Zema, é muito bom esse cara. Você vai ter o próprio Bolsonaro. Se o Dória ganhar em São Paulo, aqui em São Paulo, também acho que é um cara espetacular. O pessoal jogou aqui em São Paulo – São Paulo é muito exigente – jogou pedra no Dória. Mas o Dória fez a melhor prefeitura – em um ano e pouco – a melhor prefeitura de São Paulo. O cara cheio de ideia. Acompanhei o Dória também, porque achei que ele ia ser o próximo presidente. Então eu acompanhei o Dória da mesma maneira que eu acompanhei o Bolsonaro. O Dória fez uma prefeitura espetacular, liberal, digital e social. O Dória preencheu. Claro, tem o PSDB, ele devia ter saído do PSDB, tem uma série de coisas aí.
Luciano Pires: É uma transição. Nós estamos numa transição.
Carlos Nepomuceno: É uma transição.
Luciano Pires: Convivendo com esses partidos…
Carlos Nepomuceno: Antigos…
Luciano Pires: Dinossáuricos. Para esse novo caminho que não aceita essas coisas.
Carlos Nepomuceno: E as pessoas não conseguem enxergar, por que o que acontece? Porque tem que enxergar dessa maneira – na minha opinião – nós temos hoje no Brasil, dois polos: a ética tribal, todos são iguais perante a lei, menos as tribos. E a república, todos são iguais perante a lei.
Luciano Pires: Ponto.
Carlos Nepomuceno: Ponto. Então essa que é a luta. E é isso que é o Bolsonaro. E o Bolsonaro, ele vai criar a estrutura para começar toda uma outra série de mudanças, que só vão ser possíveis com essa base fundamentada. E não adianta… se fosse, por exemplo, intervenção militar. Isso não resolve o problema. Uma república só se sustenta quando uma parcela enorme da população está dizendo o tempo todo: queremos república. Queremos república. A república não se estrutura com um golpe. Quem faz golpe é o marxismo. Que aí depois faz a tirania. Quem faz golpe é a monarquia. A república precisa das pessoas. Senão, não é república. Ela é base. Não existe liberalismo sem empoderamento das pessoas. Porque as pessoas vão ganhar poder. Então, isso aí que é a estrutura. E eu acho que a gente está caminhando nessa direção. Então eu sou super otimista. Já sou otimista desde muito tempo e continuo otimista. E digo para a galera, momento cabo Daciolo: apertem os cintos. Porque as mudanças que vão vir aí são inesperadas, inesperadas.
Luciano Pires: Meu caro, quem quiser acompanhar o grande Nepo? Vamos lá, como é que você chega até as pessoas?
Carlos Nepomuceno: É. Isso aí. Bacana. Então olha só, eu tenho uma comunidade bimodal no WhatsApp.
Luciano Pires: O que é bimodal?
Carlos Nepomuceno: Bimodal é a consciência que algo está acabando e que a gente tem que tentar entender e ajudar. E tem algo que está começando. Então, é uma atitude em relação ao mundo, em que eu tenho que saber que eu estou lidando com esses dois mundos. Hora eu tenho que ter paciência com o que está acabando e hora eu tenho que ter, digamos assim, inquietude, atitude para ousar. Então eu tenho saber que eu estou lidando. Então, o professor, o profissional, o pai, o eleitor, todo mundo tem que ter essa visão bimodal. A gente está vivendo uma mudança civilizacional e nós somos a primeira geração. A gente tem que ter essa visão bimodal. Então o cara tem que dizer. Eu estive agora, fazendo uma palestra aqui para um banco. Eu disse: galera, tem que ter uma galera que vai atender o cliente de 60 anos. Tem uma galera que vai atender o cliente de 50 anos. Tem uma galera… e que tem que melhorar o serviço de 30. Mas eu tenho que ter uma galera aqui que tem que pensar no menino que não nasceu. Isso é bimodal. E cada pessoa tem um perfil diferente. Eu tenho um cara que é mais quieto e tem o mais inquieto. O inquieto tem que ir para o menino que está na barriga. E o mais quieto tem que ficar aqui com o pessoal mais velho. Então, têm perfis diferentes, tem uma lógica, isso que é ser bimodal. Então, as minhas comunidades, o que eu estou tentando trabalhar com o pessoal? É passar essa visão bimodal e estruturar as pessoas dentro desse conceito das novas teorias. A gente está criando um movimento que é muito mi-mi-mi, não está resolvendo. Então a gente tem teorias, tem ciência. Respondendo a esse mi-mi-mi do mercado, construindo uma coisa. Parecido com o que você está fazendo aqui. Construindo comunidade, construindo coisas bacanas, sem querer fazer marketing vazio, sem querer… o Nepo, a cara do Nepo. Eu não boto minha cara. Eu quero que as pessoas ganhem coisas. Então, como é que eu trabalho? Eu tenho feito cursos pelo WhatsApp e tem as comunidades. Então o pessoal me manda um e-mail. Desculpe, e-mail não. Me manda um WhatsApp que é (21)9960-86422. Vou repetir: (21)9960-86422. Você me manda um whats, já tem automático, já tem um link para a comunidade que ainda tem. Nós temos hoje, já estamos entrando agora, provavelmente, o pessoal já vai entrar agora no bimodal 6. Já estamos com cinco comunidades cheias, no 6. Temos leituras compartilhadas. Tem os cursos que a gente faz regularmente. Tem alguns debates que as pessoas têm feito. E tem os meus artigos diários, que eu coloco as coisas, as discussões todas. E que a gente está debatendo as coisas.
Luciano Pires: Tuas lives estão no Face, é isso?
Carlos Nepomuceno: Isso. Aí isso é profissional. Aí tem o debate político. Debate político, Facebook, Carlos Nepomuceno. Você entra lá.
Luciano Pires: Facebook/Carlos Nepomuceno?
Carlos Nepomuceno: Isso. Ali sãos as lives políticas. Eu separei bem. Então a política é uma coisa. Para não confundir as coisas. Então ali no Facebook, todo dia de manhã eu caminho ali cinco e pouco da manhã na Lagoa. A galera já me conhece lá na Lagoa. Eu caminhando com o negócio e comentando coisas e passo. Aí, uns 30 minutos, 40. Aí a galera fala: Nepo, essas suas lives são muito grandes. As minhas lives são formativas. Elas não são informativas. Então eu faço uma análise. Eu faço uma discussão filosófica. Eu faço um embasamento. Então eu estou formando a galera. Porque eu não quero discutir: o Bolsonaro tropeçou na esquina. O que você achou do tropeço dele? Ele caiu, não devia ter caído? Não. Eu faço sempre uma análise tentando criar base para as pessoas poderem ter uma discussão menos inflamada e mais sustentável. Então isso aí está funcionando também. Tem sido bem bacana o retorno.
Luciano Pires: Canal no Youtube você tem?
Carlos Nepomuceno: Tenho também. Youtube é Carlos Nepomuceno. Aí no Youtube já entra essa parte toda das leituras compartilhadas, estão todas lá, todas as coisas. E tem o Linkedin. O Linkedin são os artigos. O epicentro de tudo isso é WhatsApp. No Linkedin tem todos os artigos. Todo dia eu escrevo um artigo, praticamente todo dia. Raríssimo eu não escrever. Em que o meu aluno coloca uma coisa, uma discussão, aí eu boto lá e a gente conversa.
Luciano Pires: Muito bom. Caminhos não faltam para chegar no grande Nepo. Meu caro, dá para ficar com você aqui umas 25 horas.
Carlos Nepomuceno: Qual é a sua avaliação do nosso papo?
Luciano Pires: O papo é sempre fantástico, cara. Porque eu tenho uma coisa, que eu não sei, eu te falei no começo: não tem pauta. Não tem caminho. A gente começa a conversar e vai para onde for o papo. E não tem como não ser sempre um papo legal. Se eu tivesse uma pauta aqui que eu falasse: bom, agora eu vou olhar, vou ver se eu cumpri a pauta ou não? Aí eu consigo avaliar: deu, não deu? Não é assim, cara. Como não tem pauta, se o papo é bom, cara, a coisa vai rolando. A gente vai. Você quer saber o que aconteceu aqui? Nós já falamos uma hora e trinta e nove minutos, sem pauta. Tem que ser um bom papo. Eu acho que foi muito legal. Tem coisas que eu gostaria de mergulhar mais fundo. Tem coisas que você falou aí que são interessantes. Mas não dá. Num papo como esse aqui vai ficar…
Carlos Nepomuceno: Não, a minha proposta é: na minha próxima vinda a São Paulo a gente faz a parte dois.
Luciano Pires: Vamos lá. Dá para ver. Isso já aconteceu e não tem porque não acontecer de novo. Meu caro. Seja bem-vindo, viu? Aproveite aqui o embalo de São Paulo. Nós estamos em contato aí, talvez você venha a ser o isqueiro do nosso Portal Café Brasil.
Carlos Nepomuceno: É isso aí.
Luciano Pires: Espaço para divulgar as ideias é o que eu mais faço questão de dar para as pessoas. Então, vai ser sempre bom.
Carlos Nepomuceno: Eu que te agradeço. É um papo ótimo. A gente já está aí nessa parada, eu acho que desde abril ou março.
Luciano Pires: Por aí.
Carlos Nepomuceno: E agora conseguiu e foi bem legal. Eu fiquei em São Paulo para isso.
Luciano Pires: Nossa, grande honra.
Carlos Nepomuceno: Achei bem bacana.
Luciano Pires: Legal. Um abraço;
Carlos Nepomuceno: Um abraço, meu irmão.
Luciano Pires: Muito bem, termina aqui mais um LíderCast, a transcrição deste programa, você encontra no LíderCast.com.br. para ter acesso a esta temporada completa assine o cafebrasilpremium.com.br e receba imediatamente todos os arquivos. Além de ter acesso ao grupo cafebrasil no Telegram, que reúne ouvintes dos podcasts Café Brasil e LíderCast, que discutem em alto nível, temas importantes, compartilhando ideias e recebendo conteúdos exclusivos.
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