Um bosta
Luciano Pires -Em 2015 palestrei num grande evento onde assisti uma apresentação do BNDES. Não me lembro se era evento do SEBRAE, mas a apresentação foi entusiasmante. Tava tudo lá: o banco criado para fomentar o empreendedorismo, que poderia garantir financiamento barato a quem quisesse se aventurar a construir um negócio. Até então a ideia que eu tinha do BNDES era do banco inacessível, feito para empresas grandes. Mas aquela apresentação me encantou. O BNDES era pra mim!
Estava lá , num dos primeiros slides: “Fundado em 1952, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é um dos maiores bancos de desenvolvimento do mundo e, hoje, o principal instrumento do Governo Federal para o financiamento de longo prazo e investimento em todos os segmentos da economia brasileira. Para isso, apoia empreendedores de todos os portes, inclusive pessoas físicas, na realização de seus planos de modernização, de expansão e na concretização de novos negócios, tendo sempre em vista o potencial de geração de empregos, renda e de inclusão social para o País.”
Quando voltei a São Paulo fui atrás, perguntei ao gerente do banco com o qual trabalho e ele me disse que poderia arranjar o contato. Não demorou, estavam os dois aqui na minha frente, o gerente do meu banco e o representante do BNDES. Contei a história do Café Brasil, mostrei o estúdio, expliquei que estava buscando meios para expandir o negócio e que o BNDES, pela apresentação que assisti, poderia ser a solução. Mostrei os planos e as ideias de investimento. De quanto eu precisava?
-Ah, uns R$ 500 mil reais dariam para botar o trem andando.
O cara do BNDES então começou a mostrar o que podia ser feito, que tamanho eu devia ter, que só podia ser para compra de equipamentos, que eu podia escolher o cartão BNDES, que a prestação de contas era um inferno burocrático… e no final concluiu:
– No seu caso, é melhor levantar o dinheiro com o seu banco aqui.
O gerente do banco então me mostrou o que podia fazer: talvez (atente para o talvez) um empréstimo garantido por um imóvel meu, igual a tudo que eu já havia visto por aí, com aqueles juros vampirescos, etc e tal.
Mas e o BNDES? E aquelas taxas de juros baixinhas? E aquele monte de dinheiro à minha disposição?
Esqueça. Não é para meu bico. Sou só um empreendedor brasileiro, que tem uma microempresa, que usa o Simples, que tem 2 funcionários. Não importam meus planos, não interessa o que pretendo ou como pretendo ser. Aquele dinheiro barato que o palestrante mostrou naquela apresentação não é para meu bico. Para ter acesso a ele você tem de ser grande. Faturar milhões. Gastar milhões. Ter milhares de empregados. Ser amigo das pessoas certas. E o mais importante: não precisar do empréstimo.
Aos milhares de pequenos empreendedores como eu sobra o quê? O banco, o “meu” banco, louco para me depenar enquanto jura que me ama.
Escrevo estas linhas no momento em que recebo a notícia de que Eike Batista, procurado pela Polícia Federal por suspeita de lavagem de 100 milhões de dólares, foi avisado da batida policial e se mandou para Nova Iorque, onde estaria hospedado no apartamento de um renomado advogado carioca na Trump Tower.
Naquele mesmo 2015 da apresentação sobre o BNDES que me animou, Eike foi convocado para falar na Câmara dos Deputados sobre a situação dos R$ 10 bilhões em financiamentos obtidos por seu Grupo EBX, que faliu em 2013.
O BNDES deu 10 bilhões pra ele.
Parece que estou ouvindo os dois gerentes quando saíram do meu escritório:
– Mas é um bosta mesmo.