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Luciano Pires -

Luciano Pires: Bom dia, boa tarde, boa noite. Bem-vindo, bem-vinda a mais um LíderCast, o PodCast que trata de liderança e empreendedorismo com gente que faz acontecer. Hoje o convidado é Danilo Cavalcante, que se define como historiador por formação, doador de memórias por vocação. Danilo tem realizado um trabalho incansável de criação e distribuição de conteúdo com temática liberal conservadora, usando os recursos de redes sociais, cinema e o dia a dia, para discutir os grandes e polêmicos temas e ideias que ocupam nossos tempos. Muito bem, mais um LíderCast. Eu sempre começo o programa contando para as pessoas como é que o meu convidado veio parar aqui. E aqui foi interessante, porque eu não conhecia nada do trabalho dele. Quando, de repente, eu sou convidado para um evento, cujo nome era Oxigênio.

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: Da Giovanna. A Giovanna me dá um alô: Luciano vem aqui, um evento aqui em São Paulo. O Danilo vem aí. Eu: que Danilo? O Danilo Cavalcante. Ele faz um trabalho legal. Aí eu dei uma olhadinha nas publicações dele e falei: que legal. O cara fala um pouco de cultura pop, de cinema. Mas é uma abordagem diferente. É uma linha mais conservadora. Garotão. Eu falei: uma hora dessa isso vai dar samba. E aí nós fomos lá e fizemos o evento. Participamos de uma mesa ao mesmo tempo. E naquela troca rápida de informações: uma hora que você estiver em São Paulo vem aí. Vamos gravar. E pronto. Esse é o máximo de contato que eu tive com ele e ele teve comigo. E aí foi uma questão de acertar a visita. Quase gravou aqui. Só não gravou porque ele teve um percalço no meio do tempo. Que todo mundo vai pensar que é a pandemia. Mas não é a pandemia. É que ele casou. E aí tirou uns dias de lua de mel e tudo mais. Mas vindo a São Paulo, vamos trocar uma ideia. Então foi assim que ele chegou aqui. É uma indicação da Giovanna. E nós vamos trocar uma ideia hoje aqui. Eu começo o programa com três perguntas, que são as fundamentais. E são as únicas que você não pode chutar. O resto você chuta à vontade. Essas três têm que ser… o seu nome, a sua idade e o que você faz?

Danilo Cavalcante: Primeiro: o meu nome é Danilo Cavalcante. Eu tenho 23 anos. E eu atuo na internet há uns 10 anos. Agora, no dia 26 de novembro vai completar. Produzindo conteúdo, ensinando aí o pessoal um pouco do conservadorismo, fazendo uma abordagem um pouco mais cultural. Não me atentando aos pormenores da Ciência Política, da Filosofia. Mas tentando trazer para a realidade do dia a dia das pessoas.

Luciano Pires: Esse sotaque é gaúcho?

Danilo Cavalcante: De forma alguma. Que ofensa. Mas bah… eu não falo bah, eu falo oxente. Mas menino.

Luciano Pires: Nasceu aonde?

Danilo Cavalcante: Eu sou natural de Recife. O sotaque não deixa mentir.

Luciano Pires: Que legal. Tem irmãos? Como é a tua família?

Danilo Cavalcante: Filho único. Único herdeiro.

Luciano Pires: O que seu pai, sua mãe fazem? Qual é a praia dos dois?

Danilo Cavalcante: Minha mãe é dona de casa. Quando ela engravidou, o meu pai disse para ela: você não precisa mais trabalhar. Deixa comigo. Eu vou tomar conta das finanças da casa.

Luciano Pires: E você cuida da prole.

Danilo Cavalcante: É. Cuida da prole. E digamos que ela disse que eu fiz ela sofrer um pouco no parto. E ela não quis mais ter outro.

Luciano Pires: É mesmo?

Danilo Cavalcante: E aí meu pai trabalha como promotor de vendas da Danone. E tem algumas casas que ele construiu ao longo do tempo, que ele tem como patrimônio dele, alugadas.

Luciano Pires: Sim. Eu ia perguntar para você como é ser filho único. Mas para responder uma pergunta dessa, você tinha que ter tido irmãos.

Danilo Cavalcante: Mas aí é que está. É engraçado. Porque eu cresci com os meus primos. Por isso que eu digo: eu nunca tive vontade de ter irmãos. Saudade. Ou falta de algo que eu nunca tive. Porque meus primos, eles meio que substituíram isso. A gente brigava. Dava tapa um no outro. Dava murro. Arranhava. E cinco minutos depois estava conversando, brincando.

Luciano Pires: Esquema de irmão.

Danilo Cavalcante: Tinha ciúme e tudo mais. Então era… eu digo que eu não tive irmãos de sangue de fato, mas meus primos meio que fizeram esse papel aí.

Luciano Pires: Como era teu apelido quando era criança?

Danilo Cavalcante: Vário. Tinham muitos. Milho Verde. Floquinho Verde. Porque eu era todo amarelo. Amarelo. Dandan, Dirilo, Durilo, enfim. Várias variações conseguiam fazer. Uma análise combinatória de Danilo.

Luciano Pires: Eu acho que Milho Verde é o apelido mais interessante que eu já tive aqui nas 200 e tantas entrevistas. Eu quero saber o seguinte: o que o Milho Verde queria fazer quando crescesse?

Danilo Cavalcante: Isso é engraçado demais. Porque quando eu era criança eu já quis ser astronauta, biólogo, médico veterinário. Por um bom tempo, todo bicho que eu via na rua, eu queria trazer para casa. O primeiro bicho de estimação que eu tive foi um periquito. Ele veio voando para o terraço da minha casa. Eu peguei ele e disse: vou criar. Aí depois eu peguei outro. Formei um casal. Eles deram filhotes. Só que com o tempo, eu fui entrando ali no Ensino Médio e eu percebi que eu era um desastre em Biologia. Eu disse: não tem como eu seguir uma carreira com algo que eu odeio    que é Biologia. E que eu não vejo nenhum sentido na minha vida. Daí eu migrei para Direito. Depois pensei em Engenharia Química. Porque eu vivia meio que um conflito no Ensino Médio. Eu sou de quê? O pessoal tem a mania de dizer. Eu sou de humanas? Eu sou de exatas? Eu não conseguia entender. Eu era bom em Química, eu era bom em História, eu era bom em Português. Eu não conseguia pensar muito bem nisso. Aí quando chegou no 3º ano, que eu disse: eu vou fazer TI. Nada a ver uma coisa com a outra. Eu vou fazer TI. Porque eu quero sair do Brasil. Eu quero ir morar no Canadá. Logo o Canadá. Eu não sei de onde eu bolei esse plano aí.

Luciano Pires: Para você que está nos ouvindo aí. Se você não souber o histórico dessa figura aqui. Qual é a visão política de mundo dele, você não entendeu essa referência do Canadá. Porque para brasileiro, quando você fala Canadá. Aquele lugar é maravilhoso. Mas nós vamos chegar lá.

Danilo Cavalcante: Vamos chegar.

Luciano Pires: Vamos lá.

Danilo Cavalcante: Aí quando eu estava já no fim do Ensino Médio, eu tenho uma insônia à noite. Eu estava mexendo no celular. A gente ficou sem wifi naquele dia. Eu virei para cá na cama, virei para lá e não conseguia dormir. Eu comecei a pensar na vida. Se eu morrer amanhã? Eu vou ter feito o que da vida? Tem sentido no que eu faço? Eu vejo valor naquilo que eu faço? Eu vou servir às pessoas naquilo que eu faço? Eu vou gostar de fazer aquilo também?

Luciano Pires: Você tinha 16 anos de idade?

Danilo Cavalcante: 16.

Luciano Pires: Certo. Esse conflito aos 16 anos?

Danilo Cavalcante: Foi. Aos 16. E aí eu comecei a lembrar do Ensino Médio, da escola. Eu disse: quais foram os professores que eu mais gostei? E aí o professor que eu mais gostei, de todos, foi um professor que eu tive de História. E veja só que coisa engraçada. Ele não era de esquerda. Não era comunista. Não era ateu. Ele era católico, conservador e um cara de direita. E houve uma aula – eu nunca vou esquecer – que a gente estava tendo sobre a União Soviética. E aí o professor falando. Ele passou um documentário: A Verdadeira História do Comunismo Soviético. E eu vi aquilo. Eu disse: professor, como é que o regime socialista matou mais de 20 milhões de pessoas e só se fala de nazismo? Só que esse meu professor não gostava de usar a sala como palco político. Então ele deu aquela resposta meio só para fazer que deu. Quando terminou a aula eu fui até ele. Eu falei: professor, por que isso? E aí ele foi me explicar todo o histórico da educação, do viés esquerdista e tudo mais. E disse: por causa disso aqui. Eu: aonde eu aprendo mais sobre isso? E aí naquela noite, eu comecei a perceber a influência que ele teve na minha vida e na vida de outros alunos, sem ser proselitista. Eu falei: como eu posso impactar muitas vidas, sem precisar fazer algo que eu não vejo valor, não vejo sentido? Ainda naquela noite, eu saí da cama. Isso era umas três e meia da manhã. Eu fui num quarto onde eu tinha os meus livros. Peguei Os Sertões, do Euclides da Cunha. E comecei a ler. Isso é bom demais. É isso que eu quero para a minha vida. Eu quero poder ler as coisas que me interessam de verdade. E poder compartilhar com quem quiser ouvir. E foi assim que eu decidi que eu ia cursar História. Por um histórico também do meu pai, que ele me ensinava História em casa. Eu    para as aulas de História na escola, só para meio que revisar. Porque eu aprendi de fato com o meu pai, em casa.

Luciano Pires: Que legal. Você então botou na cabeça que você ia ganhar a vida contando história?

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: Ou sendo um professor de História.

Danilo Cavalcante: Sendo um professor.

Luciano Pires: Então estava definido que você ia para uma universidade fazer uma faculdade, licenciatura em História.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: E fez isso?

Danilo Cavalcante: Fiz. Na UFPE.

Luciano Pires: E aí, quando você começou a cursar era aquilo?

Danilo Cavalcante: Então? Eu peguei no 2º semestre, a segunda entrada, que se chama. Então, eu passei seis meses em casa. Eu tinha acabado de fazer uma cirurgia no joelho. É uma coisa que eu só falei uma vez na internet até hoje. Eu fiz o ENEM em cadeira de rodas. Eu contraí condromalácia patelar dos 15 para os 16 anos.

Luciano Pires: Como é o nome desse treco?

Danilo Cavalcante: Condromalácia. Basicamente é uma inflamação na cartilagem do joelho, na patela. E essa condromalácia se expande muito rápido. Porque o médico disse para mim: você tem que fazer uma fisioterapia. Eu estudava integral, de manhã e de tarde e à noite eu fazia cursinho de segunda a sábado. Eu disse: mãe, eu não vou fazer isso agora não. Eu vou focar nos meus estudos. Quando passar o ENEM eu vou e foco nisso do joelho.

Luciano Pires: Mas o que gerou isso? Pancada?

Danilo Cavalcante: O histórico disso é geralmente você ter esse tipo de doença lá pelos 40 anos de idade. No meu caso, o que catalisou o processo foi que nesse 3º ano específico, eu andava muito para lá e para cá, com muito peso nas costas. Porque eu levava comida. Eu passava o dia inteiro na rua. E muitos livros, apostilas e tudo mais. Não tinha onde ficar guardando no meio da rua. Eu chegava no Centro do Recife, na estação, na integração. Eu tinha que andar 25 minutos para chegar no lugar do pré-vestibular. Porque eu não esperava o ônibus, senão eu ia atrasar. E eu gostava de chegar antes da aula para poder comer com calma e tudo mais. Aí essa pressão no joelho diária, voltava para casa de ônibus, em pé, todo dia com aquele peso, sem ninguém pedir a bolsa. Pessoal que estiver assistindo aqui, se você ainda anda de ônibus, pegue a bolsa de quem estiver em pé. Porque isso aí ajudou. Contribuiu. Quando houve um dia, eu estava voltando do pré-vestibular, eu estava em pé no ônibus. Eu já estava chegando perto de casa, que eu fui andar. Eu não consegui andar. Eu estava em pé. Fui para dar o passo e não consegui dobrar o joelho para passar. Eu: rapaz…

Luciano Pires: Com dor?

Danilo Cavalcante: Com dor. Muita dor. E sem conseguir fazer isso. Sem dobrar. Não vou gerar pânico agora. Não vou falar para ninguém para me ajudar. Peguei o braço e saí suspendendo o corpo pelo ônibus. Desci. Liguei para o meu pai. O meu pai estava no trabalho ainda. Não podia vim me buscar. Minha mãe tinha saído, também não pode. Eu fui andando devagarzinho na rua de casa. Um trajeto que demora geralmente três minutos, dois. Eu demorei quase meia hora. Bem devagar. O joelho uma bola. Vamos fazer uma ressonância. Fui no médico. Fiz a ressonância. Saiu do grau 1 para o grau 3. Em coisa de seis meses. Aí o médico disse: tem que operar. Se não operar essa fissura vai se alastrar. E você vai ficar sem cartilagem e vai ficar sem andar. Vai dar uma artrose, com 16 anos. Eu disse: tá bom. Então vamos cuidar. Eu fiz todo o processo…

Luciano Pires: Essa foi a explicação médica?

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Eu acho que não foi por isso que você teve isso aí. Porque um moleque de 16 anos, que está preocupado com legado, ele já tem 40 anos.

Danilo Cavalcante: Quando ele falou isso, eu: beleza. Vou operar. Só que a minha preocupação era o quê? O ENEM está chegando. Tem que operar ou muito antes do ENEM ou depois do ENEM. Aí eu corri com todos os exames, coisa de um mês. E aí o plano me liga: sua cirurgia vai ser daqui a dois dias. Não. Vai ser amanhã, na verdade. A sua cirurgia vai ser amanhã. E dois dias depois era o ENEM. Aí eu: vou ter que fazer. Eu estava preocupado. Porque ia ficar sem andar. Beleza. Vou fazer. Chegou lá no médico, eu falei: doutor, nem que eu vá de maca. O senhor vai ter que me liberar. Porque não tem mais como mandar eles virem aqui me monitorar. Eu vou ter que ir lá. Fique tranquilo. Aí eu fiz a prova e tudo mais. Quando eu me formei… isso eu estava na entrada. Eu precisava de um tempo para fazer fisioterapia, uma série de processos de tratamento. Daí eu tive esses seis meses para estudar em casa. Então eu fiquei esses seis meses estudando muito. E só confirmando que era aquilo que eu queria. E me preparando para o que eu ia enfrentar na universidade. Eu acho que foi o momento que eu percebi realmente: é isso que eu quero. Na universidade, na primeira semana de aula, que eu percebi, eu disse: vai ser difícil, vai ser puxado no negócio aqui. Eu vou ter que fazer vista grossa em alguns momentos e combater em outros. Mas é isso que eu quero.

Luciano Pires: Mas o que eu queria saber é o seguinte: aí você entra e começam as aulas. Quando começaram as aulas, você tomou contato com o conteúdo programático, com os professores. Era aquilo mesmo? Ou você tomou um susto lá? Porque de repente…

Danilo Cavalcante: Aí foi quando todo o glamour que eu tinha idealizado caiu por terra. Porque primeiro eu pensei: aqui eu vou ter acesso a um material bibliográfico robusto…

Luciano Pires: Com professores iguais àquele que eu tinha; que me marcou. Vários iguais.

Danilo Cavalcante: Exato. Ou que, pelo menos, tenha um mínimo de abertura para o diálogo e para um debate de fato, genuíno. Aberto a ideias diferentes. E quando eu cheguei – na primeira semana – o diretório acadêmico faz meio que uma sabatina. Os professores não entram em sala. Eles pegam um tema. Por exemplo, o feminismo, negro, mulheres, enfim. E todo dia tem um tema diferente. Já para mostrar. Meio que criar um nivelamento. Dizer: esse aqui é o nosso pensamento. Vocês vão ter que se adequar a isso. Eu já levei aquele susto de cara.

Luciano Pires: Quem que faz isso?

Danilo Cavalcante: O DA, o Diretório Acadêmico.

Luciano Pires: Os próprios estudantes?

Danilo Cavalcante: Os próprios estudantes.

Luciano Pires: Já vão enquadrar a estudantada.

Danilo Cavalcante: Já vão. Engraçado que um semestre depois uma turma entrou. Depois eu vou até chegar nesse mérito aqui. Mas eu já comecei a [inint 00:14:30] que eu era o fascista. E que eu estava liderando o movimento olavista na UFPE. E foi assim que eles me apresentaram para uma nova turma.

Luciano Pires: Que ano era isso?

Danilo Cavalcante: 2017.

Luciano Pires: Ontem. Foi ontem.

Danilo Cavalcante: E foi assim que eles me apresentaram para uma nova turma.

Luciano Pires: Que você era olavista.

Danilo Cavalcante: Que eu era olavista. Só que eles não sabiam que a gente já estava fazendo um rebuliço lá dentro. E essa turma que entrou tinha um monte de conservador. Para um curso de História ter 10 conservadores é extraordinário.

Luciano Pires: Que escola era?

Danilo Cavalcante: UFPE.

Luciano Pires: Foi lá que teve aquele lance do diretório?

Danilo Cavalcante: Eu que organizei.

Luciano Pires: Que tirou um diretório de esquerda que estava lá?

Danilo Cavalcante: Não. Ali…

Luciano Pires: Onde foi isso? Foi em Minas Gerais? Teve um que foi um case maravilhoso.

Danilo Cavalcante: Lá a gente tentou fazer isso. Posso falar depois para você a história, no que deu. Mas o de lá, a gente exibiu o filme do Olavo. A primeira vez que foi exibido.

Luciano Pires: Foi lá que deu aquela confusão?

Danilo Cavalcante: Foi. Eu que organizei com os meus amigos.

Luciano Pires: Maravilhoso. Aquela pancadaria. Que doideira.

Danilo Cavalcante: Mas quando teve esse início, que eu percebi que não haveria essa abertura – eu já vinha me preparando para isso – foi aí que eu tive que ponderar: em quais momentos eu me posiciono? Em quais momentos eu só escuto e fico lá na minha? E tentar conseguir aí aliados para dar conta da situação.

Luciano Pires: Legal cara. Quando eu converso com os caras mais maduros, eu tenho alguns papos aqui maravilhosos. Rodrigo Gurgel. Tem um LíderCast com ele que é imperdível. E acabei de gravar agora com o Paulo Moura, que é uma delícia. E são caras que têm um histórico. Gente mais madura. O cara que já está com seus 50 anos de idade. E eles têm uma história mais ou menos parecida. Esses caras vêm, entram para a esquerda. Criam toda a sua juventude na esquerda. E um belo dia, começa a acontecer fatos. E o cara começa a falar: o que eu estou vendo não é o que me falaram. O que eu estou vendo acontecer não é o que me disseram. E aí eles têm uma mudança. Vira a chave. E o cara vira de lado ali. Então é natural eu ver isso acontecer. Se eu tiver que te contar a minha história. A minha história não é assim. Não houve um momento que virou chave. Eu fui virando devagarzinho. Como todo garotão, eu também tinha aquelas ideias todas. Nunca fui militante de coisa nenhuma. Mas eu estava em São Paulo. Eu era editor do jornal do Diretório Central dos Estudantes do Mackenzie em 1979, com estudante na rua. Erasmo Dias dando cacetada na molecada. O cabelão aqui. A volta do irmão do Henfil. Eu estava lá, no meio do ambiente, numa universidade que é o Mackenzie, que era considerada uma universidade reacionária. Porque era lá que estava o comando de caça aos comunistas, de 1968. E eu estava em 79. E a herança continuava lá ainda. Mas já ali eu já não tinha mais ilusão nenhuma. Eu já estava com a cabeça muito feita lá. Você não passou por isso. Você não teve o flerte da esquerda, para depois virar…

Danilo Cavalcante: Sim…

Luciano Pires: Mas foi muito rápido. Porque se em 2017 você já tinha mudado de lado.

Danilo Cavalcante: É. Foi o seguinte: eu cresci na minha família sabendo que o meu bisavô era comunista. Ele foi membro do PCB, filiado mesmo. E ele foi torturado e morreu no regime.

Luciano Pires: Era amigo do Julião lá? Andava com o Julião?

Danilo Cavalcante: Provavelmente. Mas o que acontece? O que eu cresci ouvindo foi: minha família vivia muito bem. Tinha terras. Vai ter uma festa no fim de semana. Mata um boi. Esse era o nível do negócio. Porque era…

Luciano Pires: Onde isso? Em que lugar?

Danilo Cavalcante: Jaboatão dos Guararapes. Que ficou conhecido na época como Moscouzinho, lá em Pernambuco. Que traziam os caras para treinar lá o pessoal. Lá da União Soviética.   E aí quando ele faleceu. Ele morreu. Levou choque no testículo e tudo mais. A minha família se desestabilizou. E aí pegaram todas as terras dele, as posses e saíram vendendo. Distribuíram entre os irmãos e tudo mais. E quando eu fiquei sabendo disso – todos diziam – a impressão que me passava era: ele foi morto por ser comunista. Depois disso a família se desgraçou materialmente. E aí a gente precisa trazer sempre a memória desse bisavô como algo virtuoso e o comunismo como algo bom. Então eu comecei – com os meus 14 anos – me declarar como comunista.

Luciano Pires: Sem saber o que era?

Danilo Cavalcante: Eu só sabia que era igualdade. Igualdade. Comunismo é bom. Aí em 2013 – com 15 anos – teve aquela revolta dos 20 centavos. Que aí mobilizou o Brasil: não é só por 20 centavos.

Luciano Pires: O nosso papo aqui é inacreditável. Você está falando para mim de 2013. Foi anteontem. Para mim isso aqui não é história. Isso aí foi anteontem. Se eu olhar pela janela é capaz de eu ver ainda os caras ali. E para você, 14 anos em 2013.

Danilo Cavalcante: Aí quando houve aquilo, eu falei: pai, eu vou para o protesto. Porque eu quero lutar pelos meus direitos. E não é só por 20 centavos. Só que o meu pai é aquele cara que ele não é romântico com política. Eu diria até que ele é um tanto fatalista. Hoje em dia, eu entendo por que. Mas na época, ele: filho, não vai que isso não vai dar em nada. Ele disse isso para mim. Eu: não pai, eu vou. Tinha uma PEC para ser aprovada. O que é uma PEC? Ele me perguntou. Eu olhei para ele nos olhos dele. Eu tenho habilidade de digitar no computador sem precisar olhar. Então eu paguei de doido. PEC. Quando ele foi perguntar, eu olhei assim: Proposta de Emenda à Constituição. Só que eu não sabia o que era. Eu estava indo lutar por algo que nem eu sabia o que é que eu estava indo lutar. No fim das contas eu argumentei muito. Eu era muito chato com isso, de argumentar. Eu falei: a vida inteira me interessou a História. E agora eu estou na minha vez, no meu momento, de fazer História. A contragosto, ele deixou eu ir. Eu fui. Eu passei por todo aquele movimento. Depois fui para outro protesto. Eu acreditava na revolução e tudo mais, ao ponto de estar disposto a levar bala de borracha, essas coisas assim. Só que quando passou um ano após isso… e o meu professor desse tempo era anarquista. E ele soube da história do meu bisavô. Chegou ao ponto de saber que eu gostava de Chico Buarque. E ele levou um dia para sala de aula um rádio, bem antigo, para tocar. Um toca-fitas lá. Para tocar: Amanhã Vai Ser Outro Dia. Ele mandou todo mundo fazer silêncio. E disse que era uma homenagem a mim e ao meu bisavô. Eu fiquei emocionado. Achei aquilo extraordinário.

Luciano Pires: Pausa. Atenção você que nasceu em Marte. Escuta um trechinho da música que ele está falando aqui. Quer ver?

Música tocando: [00:20:38]

Luciano Pires: Isso é Chico Buarque na veia.

Danilo Cavalcante: Na veia. Quando falava: apesar de você, amanhã vai ser outro dia. Eu ficava: extraordinário. Só que esse professor saiu da escola. E na época, ele tinha me falado para assistir o filme V de Vingança. E o V lá todo anarquista. Eu assisti àquele filme mais de 50 vezes. Eu sabia falar de ponta a ponta. Mas quando chegou em 2014 trocou de professor. E eu percebi um ar diferente nesse meu outro professor. Porque ele não ficava militando em sala. Ele sempre buscava mostrar os dois lados da história.

Luciano Pires: Era História?

Danilo Cavalcante: História. Ele mostrava os dois lados. Ele sempre estava aberto no final da aula, a tirar dúvidas com ele. E aí ele me convidou para dar uma palestra. Quando eu tinha uns 15 para 16 anos, no Sindicato dos Professores da minha cidade. Para eu falar…

Luciano Pires: Por que ele te convidou?

Danilo Cavalcante: Porque a escola recebeu um convite para ele ir lá palestrar e levar dois alunos para apresentar alguma coisa lá, algum trabalho. E aí ele sabia que no meio do sindicato tinha um monte de comunista. E ele me chamou. Ele falou: Danilo vamos lá palestrar? Qual o tema? Ele fez: toma aqui um livro. Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil.

Luciano Pires: Leandro Narloch. Você sabe que esse livro foi lançado em áudio livro.

Danilo Cavalcante: Sério? Não sabia não.

Luciano Pires: Com a locução de quem vos fala.

Danilo Cavalcante: Ah, rapaz…

Luciano Pires: Eu fiz a locução desse livro inteirinho.

Danilo Cavalcante: Maravilhoso.

Luciano Pires: O editor me chamou por causa do meu PodCast. Ele falou: nós vamos lançar o áudio livro. E a única voz que eu consigo entender que seria capaz de fazer é você. Quer fazer? E eu fiz o áudio livro. Eu montei o livro inteirinho. Só que era uma coisa muito louca. Era a Editora Cultura. Ele queria lançar como um aplicativo. Não era um áudio livro que você comprava no CD, como todo mundo fazia. Não. Era um aplicativo. Você comprava o aplicativo e o áudio livro vinha lá dentro. E aí eu fui e gravei. 11 horas de… foi muito legal gravar aquilo lá. Montamos o negócio. Ele montou. Lançou o aplicativo. E não aconteceu absolutamente nada. Não aconteceu nada. Porque o modelo era muito novo. Embora o livro fosse um best-seller. E aí eles foram transformar em CD. E aí caiu num ambiente de editora normal. Aí a editora quer fazer o CD do livro. Liga para mim: tem que fazer umas correções no texto. Manda bala. Mandaram para mim 26 páginas de correção. Eu falei: perfeitamente. Vamos entrar em estúdio. Eu corrijo tudo. Vamos começar de novo. Aí os caras não quiseram fazer. Não tinham dinheiro para gastar. Não existe esse áudio livro, embora ele esteja gravado. Eu não sei onde foi parar a matriz dele. Mas eu fiz o áudio livro. Eu entrevistei o Narloch na época, antes de ele ser famoso e tudo mais. Pré LíderCast. Eu fiz com o Narloch, quando ele estava lançando o livro. Ficou bem legal.

Danilo Cavalcante: Muito bom. Quando ele me passou aquele livro, eu lembro um capítulo que muito me chamou a atenção, que era falando que João Goulart favorecia empreiteiras. Como que o cara tinha um viés mais comunista, ele pendia mais para o comunismo e favorecia empreiteira? Ou seja, o velho: alguns são mais iguais que os outros. E aí quando eu vi aquilo eu: então o comunismo não é bem o que eu pensava. Eu fui pesquisar. O professor disse: Danilo, o tema vai ser: o comunismo brasileiro. Aí eu: beleza. Você indica alguma coisa? Ele…

Luciano Pires: O título da tua palestra era Esculhambando Marx. É por aí.

Danilo Cavalcante: Basicamente isso. E eu não sabia. Eu estou de inocente. Fui todo inocente. Tá bom. Vamos lá. Só que o meu professor não disse se eu deveria falar a favor ou contra. Ele só deu o livro e disse: pode pesquisar à vontade. Do jeito que você quiser.

Luciano Pires: Logo esse livro? A palestra era num sindicato?

Danilo Cavalcante: Foi no sindicato.

Luciano Pires: Meu Deus do céu.

Danilo Cavalcante: Eu tenho o registro até hoje. Depois eu posso até te mandar a imagem.

Luciano Pires: Meu Deus do céu.

Danilo Cavalcante: E eu inocente. Eu não sabia o que eu ia enfrentar. Daí quando eu li. Beleza. Eu percebi que o comunismo não era aquilo que eu pensava mais. Já tinha caído a máscara. Vamos para a palestra. Eu chego lá no dia. Eu pensei que a palestra seria para alunos de alguma escola. Chega na hora, o auditório só tinha – eles chamaram convidados – jornalista, advogado, professor, sindicalista. E eu: caramba meu irmão. Essa é a hora que eu vou apresentar? E aí eu fui. Me chamaram lá para a frente. Apresentei. Falei. Eu disse: o comunismo em tese é isso aqui. Na prática deu nisso aqui. No Brasil aconteceu isso aqui. Terminei a palestra e perguntei: alguém tem alguma pergunta? Alguma dúvida? Ninguém me perguntou nada. Mas um camarada lá – eu lembro até hoje isso – eu tenho. Mas não é para você. É para o seu professor. Professor? Aí meu professor bem tranquilo. Ele falou: o senhor não acha que está deixando esse aluno muito livre para pesquisar sozinho? Para aprender por conta própria? Porque ele está divagando demais em outras coisas. Ele está tendo muita liberdade para pensar nisso aí. O professor fez: e não é o correto? Sim. Basicamente isso. Para desarmar o cara. Eu vou monopolizar o discurso? Não. Deixa ele pesquisar, o menino. Eu só vou direcionar quando for necessário. Então o escândalo foi: como é que esse menino está no Ensino Médio e ele tem a liberdade de procurar algo que está para além da história que é permitida ser contada? Que na minha escola a Comissão da Verdade foi lá. Lacrou bem um monte. Entendeu? E com o tempo eu fui entendendo. Por exemplo, voltando para o meu bisavô. Que o fato de eu não ser comunista não desonrava a memória do meu bisavô. E que o mínimo que eu poderia fazer era de fato entender que ele foi um progenitor. Ele foi um cara que era provedor. Que ele lutou de fato pela família ali. Mas que a ideologia dele estava equivocada. Estava errada. E que se fosse posto em prática iria dizimar a vida de muitas pessoas que pensam diferente daquilo. Então quando eu entendi isso, que tirou esse peso das minhas costas, eu disse: então agora eu posso dar um passo adiante. Agora eu vou ler outras coisas. Eu vou me aprofundar nisso aqui. Conhecer outros autores. E daí para frente, eu fui entendendo outras coisas. Aí no Ensino Médio ainda, eu criei um Clube de Debates na escola, com os meus amigos. A gente pegava um tema, sorteava, tu tens que argumentar a favor. E tu tens que argumentar contra. Depois uma professora de Filosofia viu aquilo e disse: legal. Vou replicar. Ela fez isso na escola inteira. Então foi uma coisa que eu fui tendo acesso meio que… eu acho que é um tanto natural. Você descobre que existe… um mais um é dois. O que é que vem depois do dois? Você vai querer descobrir o três. E uma coisa vai levando à outra. E foi meio que nesse caminho.

Luciano Pires: Você tem essas outras coisas. Então você deu uma baita de uma sorte, porque você começa a ter desenvolvido esse teu olhar todo em 2013, que foi quando uma onda… vamos chamar de direita…

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Eu não gosto. Mas não tem outro jeito. Se você falar outra coisa, ninguém entende. Então vamos chamar de direita. Uma onda de direita chegou no Brasil, com publicações. Já tinha livros. Tinha um monte de autores que para a geração anterior à tua, não tinha nada. Você não tinha nem onde procurar. E em 2013 a porta tinha sido arrombada. Já estava começando a chegar uma pancada de coisa. Tanto que a geração de 2013 está toda aí, pintando e bordando. Então, se você tem a chance de encontrar. E aí está a grande diferença da minha geração para a tua. A minha geração não tinha internet. O que você tinha na mão eram os livros que você encontrava à disposição. Se você quisesse importar um livro era um pandemônio. Não tinha Amazon. Vou pesquisar no Google. Não tem. O que tinha era o que era permitido ter. Então você se desenvolve com uma dificuldade gigantesca de: deixa eu ver outros olhares. O outro olhar estava escondido. Você não podia ver. Então, o que aconteceu a partir de 2013 no Brasil foi que esse escondido começou. Saiu a nuvem da frente. E aí você puxava um Thomas Sowell. Que é isso? Você vai conhecer o cara com 80 anos de idade. Como assim? 80 anos. Pois é. E aí vai. Por isso que tem uma geração nova aí, de uma molecada muito legal.

Danilo Cavalcante: E teve um episódio específico, que me desencantou de vez. Eu estava no 3º ano. Já sabia que eu não era comunista mais. Mas eu organizei um protesto na escola que eu estudava. Porque era uma escola técnica estadual. A escola era referência no estado em termos de aprovação, qualidade de ensino, muitas vezes. Só que a estrutura estava pecando em muitas coisas. Daí eu organizei o protesto. A gente trancou rua. Só não tocou fogo. Mas foi tudo que você imaginar de protesto. Mas antes disso, eu me reuni com a União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco, a UESP, que tem a carteirinha de estudante. Tem lá a marca deles. E na reunião disseram: a gente vai ajudar você a organizar esse protesto. Eu: beleza. Massa. Estão engajados na causa. Duas horas de reunião. Duas horas falando mal do capitalismo. E tudo que eles falavam eu já tinha discernimento para entender que a crítica não era ao capitalismo de fato. Era corporativismo. Era o próprio Estado. E não era o capitalismo, liberalismo de mercado. Eu: os caras me chamaram. Duas horas. Para me enrolar. Para me vender o jornal da revolução de não sei o quê. E me chamar para assinar uma ata de um Partido Comunista que eles queriam fundar. Isso me lembra até o [inint 00:30:23]. A busca não é por uma mudança de fato. Tudo que importa é a revolução. Então eles não querem. Eles não têm um sentido mais elevado da coisa. É a revolução pela revolução. A gente pegou você para te usar. Mas o nosso foco final é a revolução. Estão me usando como bucha de canhão? Aqui não. Dali para frente eu disse: realmente, não tem condição nenhuma de eu levar minha vida [inint 00:30:48] com isso aqui.

Luciano Pires: Você está meio ilhado então?

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Você devia estar ilhado. Se tivesse mil estudantes lá, você vai encontrar naquela época, em 2013, você vai encontrar 10, 15, 20, 100 em cada mil, que, talvez, estivessem dispostos a tomar a quantidade de porrada que você deve ter tomado.

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Você devia sofrer um bullying desgraçado: chegou o reacionário. Chegou o reaça.

Danilo Cavalcante: Teve muito isso.

Luciano Pires: Já era reaça na época?

Danilo Cavalcante: Na época já era. Só que eu consegui ainda… porque assim, convenhamos que o [inint 00:31:21] sempre existiu aqui no Brasil nas últimas décadas. E eu era chamado de peessedebista.

Luciano Pires: O PSDB era grande da direita.

Danilo Cavalcante: Porque na época era coxinha. Era chamado de coxinha. Então eu já era o coxinha. Em 2013 ali já era o coxinha. Continuou em 2014. Isso foi se fortificando. E daí para frente… aí o reaça já apareceu com mais força. Depois agora, o clássico: fascista.

Luciano Pires: Ah sim, a caminho de genocida. É que vai acabar a pandemia, aí o genocida vai perder mesmo. Mas é a caminho de genocida. É impressionante como os caras… esses rótulos… é uma coisa de louco.

Danilo Cavalcante: O poder das palavras. É incrível.

Luciano Pires: É. E a revolução começa assim. É sempre assim. Toda revolução. A revolução boa. A revolução ruim. Toda ela começa com você redesenhar o discurso. Ao redesenhar o discurso você… está no livro do Orwell. Ele fala: vamos reduzir isso aqui ao mínimo. Se ninguém mais souber o significado da palavra liberdade. Não tem mais por que lutar por alguma coisa que eu desconheço.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Aí os caras vão mudar. A palavra errada, por isso. Mas você então chegou a se formar em História?

Danilo Cavalcante: Cheguei a me formar.

Luciano Pires: Pegou o teu certificado na mão?

Danilo Cavalcante: Peguei. Aí que está engraçado. Eu me formei. Peguei o diploma provisório. Que eles depois vão emitir o oficial. Mas eu nunca fui buscar. Mas eu me formei e tudo mais.

Luciano Pires: Você chegou para o seu pai, a sua mãe, meus pais: aqui está. O seu filho está formado. Aqui está. E aí eu tenho que ganhar a minha vida. O que você foi fazer?

Danilo Cavalcante: Essa foi uma fase difícil. Porque quando eu decidi que eu não queria ser só mais um na trincheira ali, eu queria ser alguma coisa mais. Eu entrei na universidade com um foco muito aparente para mim, que era: eu vou entrar. Eu vou fazer tudo que eu puder fazer lá dentro. Vou pegar bolsa de pesquisa, iniciação científica, monitoria, grupo de estudo. Eu vou publicar. Eu vou fazer tudo. Tudo isso eu fiz. Mas chegou um momento que foi um divisor de águas para mim. Uma professora me amadrinhou lá, para eu ser orientando dela. E era a única que eu queria de fato, ela era aberta ao diálogo. Ela deixava eu falar o que eu pensava para ela. E ela criou um grupo de estudos com alguns doutorandos que eram orientandos dela. E ela me colocou. Ela criou só para eu e outro amigo, a gente entrar com ela nesse grupo. Porque ela queria já colocar a gente num nível de debate da pós-graduação. Daí eu entrei nesse grupo. A cada 15 dias a gente se reunia para debater algum livro. E cada um se encarregava de ser o relator do livro. Acontece que no fim de cada reunião, eu saia extasiado. Era altíssimo o nível. Era muito bom. O meu corpo estava na graduação. A minha cabeça estava fora já. Mas eu percebi que eu não tinha liberdade. Terminava a reunião. Eles falavam o que queriam. Eu ficava só rindo. Aquele riso de quenga como diz em Recife. Só… e teve um dia que foi o ápice para mim. Onde um deles chegou para mim. Chegou: vem cá. Abriu a bolsa e puxou uma camisa de Lula Livre. Quando eu olhei para aquilo, eu ri para ele. Não revelei nada. Eu: mas isso não é vida não. Isso não é vida. Porque o planejamento era o seguinte: eu vou entrar nesse grupo. Eu já sabia, por exemplo, qual era a questão da prova do mestrado. Então, eu só teria que levar para eles periodicamente, para eles corrigirem. E eu no dia, destruir na prova. Fazer o doutorado em Oxford, na Inglaterra. Eu volto para o Brasil. Espero um concurso. Passo. Viro professor universitário.

Luciano Pires: Você estava como assistente de uma orientadora. Não estava no teu campo de visão o mestrado, a pós, um doutorado?

Danilo Cavalcante: Já. Isso. Então? Ela estava me treinando para isso já.

Luciano Pires: Mas você não começou a fazer. Você chegou a fazer ou não?

Danilo Cavalcante: Não. Eu caí fora antes. Isso que eu vou dizer. Como foi que eu mudei a chave. Quando eu percebi isso: mas isso não é vida. Só que nesse meio tempo muitas coisas começaram a acontecer. A professora começou a ter um monte de mensagem. Receber mensagens sobre mim. E teve um post específico meu, que viralizou lá. Eu já produzia conteúdo nessa época.  Eu peguei um post do Pondé e compartilhei. Ele basicamente dizia o seguinte: o lavar dos pratos. Você lavando um prato na pia, em silêncio, molda mais o caráter do que você ir para a rua protestar. Porque o senso de dever causa em você, o senso de responsabilidade. Enquanto que na rua, você só pede por direitos. Ou seja, algo muito como uma pessoa mimada: ficar pedindo e não agir. E não cumprir com o dever. Eu postei isso.

Luciano Pires: Como diria Jordan Peterson: arrume seu quarto.

Danilo Cavalcante: Arrume seu quarto. Ponto. Basicamente isso. Daí um grupo lá de pessoas que me odiavam foram falar com a professora, me chamando de fascista e tudo. E mandaram essa minha publicação para uma pós-doutora da USP, que era orientanda dessa minha professora. E essa foi falar com a minha professora para dizer: sabe o que o teu orientando pensa disso aqui? Ela falou: eu sei. E daí? Então, ela comprou a briga por mim. Só que foram três meses que a vida dela foi virada de cabeça para baixo. Para onde ela ia, ela já estava sendo conhecida. Ela ia para a universidade do lado, vizinha Federal Rural. Soube que tu estás orientando um rapaz aí. Ele vai até para a igreja. Ele é de direita? Ela falou: mas vocês não são os comunistas, que defendem a liberdade? Até que um dia eu cheguei para ela e disse: não dá. Eu vi que a tua vida está mudando muito por causa de mim. Você sempre fez a sua parte aí, caladinha, na sua, sem referência. Eu não posso comprometer a tua carreira. E eu não estou disposto a viver uma vida dupla. 12 horas por dia eu sou uma coisa. E as outras 12 horas eu sou outra. Não dá para mim. Eu agradeço muito por tudo que você me ofertou. Eu agradeço demais. Mas não dá. E o que foi o fim da picada para mim foi quando eu soube que o tema que eu ia pesquisar no mestrado, umas 20 pessoas no mundo pesquisavam. E todas se conheciam. E quando você manda um artigo para a revista, você não precisa identificar o seu nome. Pelo menos, o corretor não sabe o nome. Mas eles te conhecem pela tua escrita. Então, se eu me queimo no Brasil, eu me queimo no mundo inteiro entre os pesquisadores. Eu disse: isso não é vida. Eu não vou viver uma dupla vida. Só que naquele momento, os meus pais já sabiam que eu ia fazer mestrado, doutorado. Tudo aquilo que eu comentei. Como é que eu vou falar isso para eles? Que eu desisti. Eu preciso ter alternativa. Eu não posso chegar só com o problema. Eu preciso trazer a solução.

Luciano Pires: Não passou pela tua cabeça fazer o doutorado em outro lugar ao invés de fazer lá? Não. Eu vou para Londrina. Eu vou para Miami. Eu vou para a Sorbonne. Não passou nada disso pela tua cabeça?

Danilo Cavalcante: Não. Porque o fato de todos se conhecerem e o alinhamento ideológico ser bem definido. E outras coisas me fizeram perceber isso na prática. Já me deixou aquilo muito claro. Dizer: não adianta eu fugir. Eu vou ter essa amostra aqui em todos os lugares que eu for. Não tem como fugir disso. A menos que queira enfrentar de frente. Mas o desgaste vai ser muito grande. E eu preciso de uma renda. Então foi aí que eu olhei para a internet. Eu disse: para que eu vou para algum lugar, se eu já estou no lugar que eu devo estar? Só que eu precisava de uma prova para mim. E aí eu lancei um curso na época, eu acho que 2018 para 19. Eu tinha uns 10 mil seguidores. Um curso onde eu ensinava inglês a partir de: História, Filosofia. Na verdade, era o inverso. Eu ensinava História e Filosofia a partir do inglês. Eu usava o inglês meio como uma ponte para chegar no conhecimento lá. E aí eu consegui os meus primeiros 11 alunos, algo assim. Em quatro dias, eu fiz cinco mil reais, aproximadamente. Eu olhei para isso: eu estou começando. Eu fiz quase cinco mil reais em quatro dias. Tudo troncho. Tudo errado. Parte de marketing e tudo mais. E os meus colegas de classe vivem reclamando que estão ganhando 12 reais a hora/aula, 15 reais a hora/aula. Estão se matando. Eu ganhei o que eles ganham em dois meses em quatro dias. Tem algo aqui. Eu vou focar nisso. Foi aí que eu falei com os meus pais. Eu disse: é isso que eu vou fazer. Eu não espero que vocês entendam o que eu estou fazendo. Só saibam que eu sei o que eu estou fazendo. Então nesse meio tempo aí…

Luciano Pires: À noite você foi dormir e ouvia a sua mãe soluçando: vai ser youtuber.

Danilo Cavalcante: O engraçado é que a minha mãe via o que eu passava. Eu evitava falar muita coisa para ela. Mas tinha dia que eu chegava em casa com a cara desse tamanho. E ela: o que aconteceu? Aí eu comentava por alto, às vezes. E ela soube também da pancadaria que teve. O meu pai foi também para a exibição e ele viu lá. Ele filmou e tudo mais. Então ela ficava bem assustada. Temendo pela minha vida e tudo mais. Daí quando eu tomei essa decisão, nessa época calhou de… eu fiz um intercâmbio para Londres. Aí foi um tempo que eu pude meio que me desvencilhar do Brasil. Saí do olho do furacão, daquela eleição de 2018, no final do ano. E pensar. Eu disse: agora eu vou ter esse tempo aqui para pensar.

Luciano Pires: Que período você ficou lá fora?

Danilo Cavalcante: Do dia 31 de dezembro até o início de fevereiro.

Luciano Pires: Foi no olho do furacão.

Danilo Cavalcante: Foi.

Luciano Pires: Você ficou na posse. A posse você estava lá fora?

Danilo Cavalcante: Exato. Eu estava lá fora. E aí eu lembro que quando isso aconteceu: agora eu vou pensar na volta. O que eu vou fazer. Porque o meu plano era… o curso de História na Federal tem nove períodos. Eu fiz ele em sete. Já queria me livrar. Eu terminei um ano antes do tempo. Então eu ia ter um ano pela frente para eu tocar o barco da minha vida e dar um ajustamento no trilho. E quando eu voltei, eu já voltei com um plano na mente, pronto. Eu vou fazer isso, isso e isso. Eu vou terminar o TCC logo. Então basicamente, eu ia para a universidade para cumprir tabela. Só para estar o corpo presente. Mas a mente já estava maquinando várias outras coisas.

Luciano Pires: Qual era o modelo de negócio que você estava na cabeça, quando você… o que eu vou ser quando eu crescer? Naquela época, o que você falou? Serei um produtor de conteúdo? Serei um youtuber? Vou ganhar dinheiro vendendo curso na internet? O que era?

Danilo Cavalcante: No meu caso, o que eu percebi? Eu percebi que inconscientemente, eu criei um método na universidade, que me fez sobreviver a ela e que me fez crescer lá dentro, apesar de eu ser conservador. E quando eu percebi isso, eu tentei meio que fazer um [inint 00:40:53] da coisa. Eu tentei entender a lógica por trás daquilo que eu fiz. Eu comecei a estruturar. E eu percebi que o meu público específico sofria muito com aquilo, dizia: Danilo, eu não aguento mais estar na universidade, porque eu não consigo me posicionar. Eu quero aprender a argumentar por aquilo que eu defendo. Eu quero ter uma rede de amigos em que eu posso ser quem eu sou. E eu: caramba. Isso era tudo o que eu passava. E eu consegui ter tudo isso. Então o meu modelo – agora falando em termos de negócio – foi pensar o seguinte: eu preciso ter uma escola, uma comunidade, em que o meu grande carro chefe vai ser a estrutura de amizade entre as pessoas. E com isso, elas vão ter um ambiente livre para conversar. Elas vão poder estudar aquilo que de fato interessa a elas. E vão poder argumentar em prol de seus valores. E, a partir daquilo, elas não vão mais temer, por exemplo – naquela época não se falava muito disso, mas já existia o fenômeno – o cancelamento. Então elas vão poder dizer: eu vou poder me posicionar como eu quiser. E se eu for demitido amanhã, eu vou ter uma rede de apoio que vai me ajudar a recuperar o emprego. Entendeu?

Luciano Pires: O conceito de uma confraria. É o conceito que hoje em dia está pegando bastante.

Danilo Cavalcante: Tanto que o nome da minha escola no começo era Confraria Conservadora. E aí depois eu troquei para O Farol. Mas era Confraria.

Luciano Pires: Vamos explorar isso aí um pouquinho aqui. Muito bem. Você está no LíderCast. O LíderCast é lançado por temporadas. Os assinantes da Confraria Café Brasil e Café Brasil Premium têm acesso imediato à temporada completa, assim que ela é lançada. Os não assinantes receberão os programas gratuitamente, um por semana. Para assinar, acesse mundocafebrasil.com e conheça nosso ecossistema do Café Brasil Premium através do site ou pelos aplicativos para IOS e Android. Você pratica uma espécie de MLA, Master Life Administration, recebendo conteúdo pertinente, de aplicação prática e imediata, que agrega valor ao seu tempo de vida. São VídeoCasts, sumários de livros, PodCasts, e-books, eventos presenciais. E a participação em uma comunidade nutritiva, onde você faz um networking com gente como você, interessada em crescer. Eu também estou exposto muito há muito tempo. Na verdade, a minha história vem do ambiente corporativo. Eu saio do ambiente corporativo em 2008 para mergulhar nisso que eu faço hoje aqui em tempo integral. E até 2008 eu era um bicho corporativo. A minha cabeça era uma cabeça de negócios, business. Tanto que você pega os meus primeiros PodCasts, 2006, 2007, eu tinha um PodCast, que eu falava bem do Paulo Freire, que ganhou não sei o quê. Porque aquele era um mundo completamente distante do meu. O meu negócio era: vamos focar, vamos fazer acontecer, vamos botar os grandes projetos de qualidade total e tudo mais. E quando eu saio fora e começo a abraçar a partir de 2003, final dos anos 90. Que eu começo a ler outras coisas. Eu tomo contato com algumas literaturas meio doidas aí, que eu começo: opa espera aí. Não é bem assim. Deixa eu olhar esse outro lado aqui. Ali eu comecei a formatar o que eu faria para frente. Então eu fiquei exposto durante muito tempo também, sofrendo esse tipo de… mas eu nunca imaginei que fosse chegar no ponto que chegou hoje em dia. Eu achava que ao longo do caminho algo aconteceria. Porque eu já via esse esfacelamento: nós contra eles; sendo muito bem implementado. Já via esse começo de perseguição. Eu sou da época do Pasquim. Eu vi os caras do Pasquim destruírem a carreira do Simonal. Acabar com o cara. Acabar com vários caras. Gustavo Corção. Os caras detonaram os caras. Já havia naquela época. Mas aquilo era uma coisa que ficava relevada. Aquilo era meio escondido. Mas tinha um cancelamento brutal naquela época lá. E eu achava que em algum momento haveria uma inflexão na curva. Eu falei: uma hora vai dar uma encrenca. E aí a coisa… e quando chegou 2013 eu falei: eu acho que chegou a hora. Daqui para frente a coisa vai mudar. Porque um grande bom senso baixará sobre a sociedade brasileira. E não aconteceu porra nenhuma. Pelo contrário, a coisa piorou muito. Mas quando você fala dessa tua coisa. Você falou um negócio que é muito forte: eu sobrevivi na escola, apesar de ser conservador. Quando você fala isso, já tem uma turma que vem falar: mais um vendo comunista embaixo da cama. Tudo é comunista. Tudo para esses caras é comunista. E as pessoas não acreditam que possa haver algum tipo de perseguição. Então você fala: a escola está dominada. Que dominada? Onde você viu isso? A imprensa está dominada. Que dominada? Então tem um grande número de pessoas que não acredita nisso porque nunca viu o outro lado. Nunca teve chance nem sequer de ouvir as outras ideias. Então quando você coloca esse teu desenho de que: eu construí algo que vai ajudar um grupo de pessoas a conseguir vencer, apesar de… então vamos lá. Apesar de: Agora eu estou jogando o ambiente de hoje. Você vai conseguir ser bem-sucedido apesar de ser gay. Apesar de ser mulher. Apesar de ser negro. Apesar de ser índio. Apesar de ser iletrado. Vai botando aí. Apesar de ser gordo.

Danilo Cavalcante: Anão…

Luciano Pires: Então tem um milhão de minorias.  Mas essa minoria dos conservadores não se aplica. A ela não se aplica. Essa minoria não existe. Então é uma heresia você falar: venci apesar de ser conservador. Você é barata. Tem que pisar. Só que as pessoas não acreditam que isso exista. Porque elas não conseguem entender. Como que pode alguém ser perseguido porque pensa em alguma coisa. E isso está acontecendo cada vez mais. A partir de 2018 então, virou uma loucura.

Danilo Cavalcante: Ali foi o ápice.

Luciano Pires: Vai chegar agora no ponto em que o cara comenta uma história em quadrinho. Perde o emprego. Se bobear, ele vai ser linchado no meio da rua. Como é estar do outro lado? Porque você fez uma coisa. Você pegou esse rótulo do conservador. Vestiu a camisa. Botou boné escrito e falou: lá vou eu. Moçada, querem saber de conservadorismo? É comigo. Eu não fiz assim. Eu peguei isso tudo e incorporei ao meu trabalho. Então eu dou pitaco. Eu trago e ponho ali. Eu vou botando aos pouquinhos. Eu sou muito mais gramsciano do que você. Entendeu?

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Eu entendi muito bem o que foi a pegada. Eu falei: eu vou botar no meu trabalho. Tudo isso que eu estou falando para você. Você estar do lado dessa minoria que sofre essa opressão toda. Essa opressão realmente existe? Você, quando fala: eu venci apesar de ser. O que é esse: apesar de ser? Como é sentir na pele isso? Sua mãe fica preocupada com a tua sobrevivência física? Porque você vai apanhar na rua porque você votou num cara que ninguém gosta. Como é isso?

Danilo Cavalcante: É uma coisa louca. Porque às vezes a pessoa, ela não para pra pensar nisso se, num primeiro momento, ela não viver aquilo. Quando eu entrei na universidade – eu tinha mais ou menos uma noção do que eu iria passar e eu me preparei para aquilo – no momento após aquilo, que eu comecei de fato a ter acesso àquele tipo de informação, àquele tipo de ambiente e eu comecei a sentir na pele foi que eu comecei a entender como é que se configurava aquilo. É meio que uma perseguição velada. Uma coisa que meio que me fez entender melhor aquilo foi quando eu entendi o conceito da espiral do silêncio, da Elisabeth Neumann, a socióloga alemã. Que basicamente, eles têm já um tipo de entendimento, de conhecimento, de visão, que é hegemônica. Ou seja, quem entra na universidade já tem que tomar aquilo ali como certo. Quem entra ali já entende como um acordo que cada dia o rico fica mais rico e o pobre mais pobre. Que a luta de classes é o motor da história. E assim por diante. Existe um (telos 00:48:52) na história e assim por diante. Quando, em alguns momentos, algum amigo meu de classe, por exemplo, se manifestava contra, nesse momento, eu percebia que de fato a democracia pregada – pelo menos em teoria – não existia. Por quê? Vamos lá. Digamos que agora eu levantei aqui um tema e que você discorde de mim. Eu tenho certeza que você não vai me xingar, que você não vai desdenhar de mim, que você não vai zombar de mim. Quando acontecia isso em classe era exatamente o oposto. Teve certa feita que o professor argumentou que a sala de aula não é um ambiente neutro. Eu concordo com aquilo. Hoje em dia, eu concordo com o que ele disse. Só que na época, o tom que ele colocou foi para dizer o seguinte: a sala não é neutra. Eu vou colocar a visão que eu quiser aqui para vocês. Quando ele falou aquilo, uma única visão, monocromática, o meu amigo disse: não professor. A sala de aula pode ser neutra sim. Só que ele queria dizer neutra no sentido de imparcial. No sentido de que: mostre duas visões aí. E deixe que a gente pesquise também. Quando ele falou aquilo a sala inteira. Não vaiou diretamente. Mas ficou rindo dele. Chamando ele de bode. Dando apelido. Agora, se o ambiente está de fato aberto ao diálogo, à conversa, por que quando alguém levanta o dedo e se posiciona contra, acontece isso? Outro episódio meu. Eu fiz uma publicação em 2018. Eu estava na aula. 50 minutos de aula. A aula era para ser sobre metodologia do ensino de história. 50 minutos de aula e o professor só falando mal do Bolsonaro. Só falando mal. Eu peguei o meu celular. Eu estava na internet. Já estava produzindo conteúdo. Eu publiquei assim no meu perfil: a aula era para ser sobre isso. Mas o professor está a 50 minutos fazendo proselitismo contra Bolsonaro. Publiquei. Não aguentei ficar até o final daquela aula. Fui embora. Eram quatro horas de aula. Uma hora eu fui embora. Porque não teve aula. Quando eu chego, na semana seguinte, um colega meu diz o seguinte: Danilo, o professor subiu o teu post. E ele leu na frente da turma inteira, no dia. Eu: caramba. Como é que ele ficou sabendo desse meu post se minha sala inteira estava bloqueada no meu perfil? Porque eu sabia que isso ia acontecer alguma hora. Mas tinha uma pessoa que eu tinha esquecido de bloquear e ela levou para ele.     E nessa aula que eu cheguei, agora, com a cara lisa para a aula, para ouvir o que ele ia falar. Eu levei um livro. Porque eu sabia que não ia ter aula. Ia ser só proselitismo mais uma vez. Eu fiquei lendo um livro. E aí o professor falou assim: tem gente que vai nas redes sociais se posicionar contra o que vê na universidade. Mas quando é chamado para falar em aqui não quer. Aí veja a minha situação naquele momento: eles estavam falando sobre ideologia de gênero. Entendeu? Favorável àquilo. E eles queriam que eu me posicionasse contra. Eu estou num coliseu, todo mundo ali sedento de sangue como a própria [inint 00:51:27] diz. Para que eu vou pedir desculpas? Eles não querem. Eles só querem um motivo para falar: está vendo? Homofóbico. Transfóbico. Fascista e tudo mais. Quando eu percebi aquilo, que a arena foi montada, eu disse: agora que eu vou ficar calado mesmo. Ele quer um motivo para me incriminar aqui ou para me reprovar. Não vou dar esse motivo para ele. Eu fiquei lá, na minha, tranquilo. Mas quando você vai entendendo no dia a dia que para ir para a universidade você precisa esconder um livro – eu escondia os livros que eu levava – eu levava um livro do Olavo, eu levava ele na bolsa. Para você conversar sobre certos temas, falar baixo. Eles não podem ouvir. E no momento em que eu decidi me posicionar, que foi no fim de 2017, quando a gente exibiu o filme O Jardim das Aflições. A partir de então, a minha vida não foi mais a mesma na universidade. Por quê? Porque quando eu exibi o filme, eu dei minha cara a tapa. Eu peguei o meu perfil na internet, ancorei como evento – no Facebook tinha isso, para ancorar como evento – ancorei no meu perfil. A gente colou cartazes. A gente conseguiu parcerias. Foi todo um alvoroço. Lotou o auditório. E depois daquilo o meu rosto ficou marcado.

Luciano Pires: Só uma pausa aqui. Para quem – de novo – mora em Marte. Ele está se referindo a um filme do Josias Teófilo, que é o filme chamado O Jardim das Aflições. É um filme sobre o trabalho do Olavo de Carvalho. Ele foi lá e fez um filme que é um documentário. São imagens do Olavo. E é uma das raras peças do Olavo que não tem caricatura. Ela não é caricatural. Ela pega o cara e mostra…

Danilo Cavalcante: A filosofia…

Luciano Pires: A filosofia do cara e tudo mais. Portanto, não é um filme que bate no Olavo. E todo mundo que odeia o Olavo, automaticamente, passou a odiar o filme. Então, quando o Josias foi lançar o filme, ele tentou exibir o filme em vários lugares. E houve uma reação terrível. Teve um festival de cinema que os concorrentes saíram fora, se recusaram a participar se o filme do Olavo – tinha mais dois filmes – eu não me lembro se era do Plano Real.

Danilo Cavalcante: Sim. Eu acho que foi do Plano Real.

Luciano Pires: Do Plano Real. Se esses filmes concorrerem. Não era assim. Era: se esses filmes concorrerem, eu me recuso a botar o meu filme para concorrer. E os caras resolveram sair fora. E aí o Josias tentou então exibir esse filme em locais específicos. E um local onde ele queria exibir era dentro das universidades. E aí começou o rolo. Porque havia um piquete para impedir a exibição do filme. Olha o tamanho da loucura. Nos Estados Unidos estava acontecendo um negócio muito parecido. Os caras que eram de direita e que iam falar na universidade eram recebidos com piquete para impedi-los de falar. Você não pode entrar no auditório para falar. E quando eles começavam a falar, o pessoal invadia o auditório. Fazia uma gritaria, para impedir que a ideia fosse exposta. É o cale-se. Cale a boca. É a espiral do silêncio no…

Danilo Cavalcante: No mais alto ápice.

Luciano Pires: No ápice. E ali aconteceu. E lá foi engraçado. Porque tem mil filmagens. O pessoal lá. Um grupo indo atacar. Foi uma loucura.

Danilo Cavalcante: Foi uma loucura.

Luciano Pires: O filme foi exibido ou não?

Danilo Cavalcante: Foi exibido. Um sucesso a exibição. Só que teve algumas coisas engraçadas nesse período. Porque quando a gente começou a organizar e o rosto da gente começou a ficar marcado. Teve um professor que – virou até meme – ele publicou lá, que eles iriam passar com um trator no dia da exibição, para destruir os fascistas. Então começaram a criar toda uma movimentação contra a exibição. E começaram – como sempre fazem – a propagandear mentiras. As famigeradas fake news. Para intensificar o que estava acontecendo. Ou seja, disseram que seria um filme pró-ditadura. E em Recife existe um ferrão muito forte contra a ideia de ditadura militar. Porque a Comissão da Verdade tem muita força lá. E porque dentro da universidade eles criaram esse sentimento amplo de dizer: vamos demonizar tudo que remete àquele período. Ponto. Quando eles disseram isso, não quiseram nem saber a sinopse do filme. Só disseram: é um filme terraplanista. É um filme de um louco. E que vai ser pró-ditadura. E aí o grande PCO que, de vez em quando acerta umas dentro, ultimamente está acertando bastante inclusive.

Luciano Pires: As duas pontas da ferradura se juntando.

Danilo Cavalcante: É engraçado demais. As duas pontas da ferradura. Exatamente. Mas nessa época o PCO estava muito loucão. E aí eles criaram um evento contra o nosso, no mesmo dia e horário do nosso. Veja só. A gente criou o nosso e eles criaram um em resposta, no mesmo dia, na entrada do auditório. Eles queriam confusão.

Luciano Pires: Claro.

Danilo Cavalcante: Eles queriam confusão. E aí eles começaram a mobilizar a universidade contra o nosso evento. A gente fez todo um esquema de segurança. A gente buscou – não conseguimos – um segurança. Porque a própria universidade recusou dar um segurança para a gente. Ou seja, poderia ter sido evitado desde o princípio o problema. Mas aí, quando o filme foi exibido é onde eu percebi nesse dia. Eu até conversei com a minha namorada na época, agora minha esposa. Eu disse: a gente está dentro do furacão. E a gente está vendo o que a mídia faz. Duas versões diametralmente opostas foram ditas naquele dia sobre o que aconteceu. Uma completamente favorável à galerinha lá do PCO, que estava contra a gente. E outra que não estava favorável a gente. Mas que só descrevia os fatos. Entendeu?

Luciano Pires: Sim.

Danilo Cavalcante: O evento era para ser pacífico e tudo mais. Eles chegaram… detalhe: os dois maiores jornais do estado fizeram a matéria. E o jornal que fez uma matéria contra a gente só entrevistou pessoas que eram contra o evento. Muito imparcial o negócio. Só que não. Então quando isso aconteceu vamos agora para casa. Vamos cuidar da vida. Beleza. Eu volto na semana seguinte. Eu ia dar uma aula na monitoria. O professor não foi nesse dia. Eu vou dar uma aula na monitoria. É uma coisa engraçada. Porque eu adentrei o curso de tal modo, que eu virei monitor da turma que eu comecei o curso. Eu quis ter esse prazer de olhar para eles: eu sou professor de vocês agora. Mas nesse dia o professor não foi. Quando eu fui dar a aula, eu me levantei. A sala foi esvaziando. E eu falando e o pessoal saindo da sala. Eu fiquei falando só com uns gatos pingados dentro da sala. Por mim, tudo bem. Estou fazendo meu papel. Só que quando eu terminei e o outro monitor foi fazer a parte dele, eu notei uma movimentação estranha na porta. Eu: tem algo estranho acontecendo. O pessoal não voltou. Tem algo estranho. Aí eu falei para um amigo meu: sai da tua sala aí. Vem na frente da minha, que tem alguma coisa acontecendo. Eu não posso sair agora. Senão, eu vou dar bandeira. Ele saiu e mandou uma foto. Aí tinha um cartaz. O cartaz tinha a foto de uma pessoa levando um murro no rosto, um desenho. E tinha escrito: esmague o fascismo. Minha fama já era de fascista. Para mim, aquilo foi muito claro. Final de período. A universidade estava um breu. Silêncio total. Escuro. Eles vão me pegar.

Luciano Pires: Você ia apanhar lá.

Danilo Cavalcante: Vão me pegar. Na hora eu disse: bicho vamos embora daqui agora. A gente pegou a bolsa e ó… saiu literalmente correndo nesse dia, da universidade. Então, se alguém diz que não existe perseguição ou que não existe uma espiral do silêncio. Que não existe um tipo de movimento alinhado para que pessoas que pensem numa linhagem mais conservadora sejam caladas, eu não sei mais o que eu posso dizer para provar isso para vocês.

Luciano Pires: E tem uma coisa importante que você está dizendo que é o seguinte: você está falando de um nicho. Você está contando um caso que acontece dentro de uma sala de aula, numa universidade. Isso você pode levar tranquilamente para qualquer outro tipo de ambiente. Isso pode acontecer num hospital, num escritório, em qualquer lugar. Evidentemente, eu não estou me referindo a um grupo reunido para bater num médico fascista. Mas esse grupo reunido para tirar um sarro do cara que fez o post por algo que ele falou e tudo mais, cria essa espiral do silêncio, que nada mais é do que você passar a se autocensurar.

Danilo Cavalcante: Constrange a pessoa.

Luciano Pires: Eu não vou mais falar aquilo que eu falaria. Eu não vou escrever aquilo que eu escreveria. Então, eu tenho visto isso acontecer comigo. Na idade que eu estou. O meu esquema do Café Brasil, que eu montei, eu tenho uma Confraria. Eu tenho um grupo fechado no Telegram. E nesse grupo do Telegram, eu falo à vontade. As pessoas que estão lá pagam para estar lá. Pagam uma bobagenzinha. Mas estão lá e pagaram para estar. Então, pessoas que foram lá, que é aquele lance do stand-up comedy. Eu paguei para ir ver o cômico, que é um idiota. Ele vai falar só merda. Mas eu paguei para estar lá. Eu sei o que vai acontecer. Então, a disposição da plateia para com ele é completamente diferente de uma plateia que está todo mundo lá e o cara aparece do nada. E ali eu paguei para estar lá, logo eu estou sabendo o que vai acontecer. Então ali eu posso colocar à vontade as divagações ali.   Quando eu pego um post legal que eu fiz ali e eu falo: eu vou levar para o Facebook. Eu mudo o post inteirinho. Eu boto açúcar nele. Eu destilo. Eu boto água. Ele fica suavezinho. E aí eu vou no Facebook com ele. Porque eu sei que se eu botar o post igual eu botei, no Facebook, aquilo vira um inferno. Vira um negócio pavoroso. Isso é o efeito da espiral do silêncio. Eu me policio. E deixo de falar aquilo que eu ia falar. Por que a sociedade perde como um todo? Porque você impede que as ideias sejam discutidas do jeito que elas são. Eu não vou sentar aqui para, hipocritamente, ficar trocando uma ideia hipócrita com você. Aqui ninguém quer nada com isso. Agora, se eu sento aqui e falo: eu vou falar o que eu penso. Você vai falar o que você pensa. O que você pensa é odiento. É um horror. Eu fico indignado com isso. Eu contra argumentar você. A sociedade ganha com isso.

Danilo Cavalcante: Com certeza.

Luciano Pires: Ganha muito. Porque quem está ouvindo em volta fala: meu Deus. Eu acabei de ouvir um negócio de um ponto de vista que eu nunca pensei, eu vou prestar atenção nisso. Aí a sociedade evolui. Quando eu calo a tua boca. Cala a boca. Você não vai falar. Fica no teu gueto falando lá. Eu simplesmente eliminei o debate. E eu nem permito que as coisas sejam esclarecidas. Ou que as pessoas cresçam com o debate. E está acontecendo isso na sociedade. Então essa perseguição existe sim senhor. Nós estamos vendo agora aí o pessoal perseguindo empresa. Perseguindo negócios. Vou cortar a tua fonte de financiamento. Entendeu? Porque quem pagava as propagandas não vai pagar mais. Porque não quer estar ao seu lado, seu leproso.

Danilo Cavalcante: Mas é engraçado. Porque termina criando um estigma na pessoa, como se ela fosse um pária mesmo. É uma espécie de sociologia da rotulagem. Agora o cara está marcado com aquele rótulo ali. É como se ele tivesse um guizo no pescoço.

Luciano Pires: E vai morrer com esse rótulo para o resto da vida. Aconteceu um lance interessante semana passada. Os caras prenderam nos Estados Unidos, o sujeito; não vou lembrar o nome dele. Mas quando o Trump começou a se mexer e tudo mais. Pintou uma história lá de que ele tinha feito um conluio com os russos. E que ele, junto com os russos, iam armar uma confusão toda para influenciar na eleição. E a Hillary perdeu a eleição porque os russos se meteram no processo eleitoral. E isso tudo começou com um cara que era um russo inclusive. Um russo norte-americano. Eu não vou lembrar o nome dele. E esse cara deu todos os subsídios para o FBI, para o pessoal. Semana passada esse cara foi preso. Foi preso, porque os caras concluíram que tudo aquilo era mentira. O que ele falou era mentira. Aquilo era tudo mentira. Então todos aqueles seis anos em que botaram um rótulo na testa do cara, que fez negócio com os russos, de repente, era mentira. Não existe mais. Só que isso aconteceu seis anos depois. Todo o prejuízo desses seis anos. O rótulo que botaram na testa do Trump. Ele vai morrer com esse rótulo. Nunca mais ele abandona esse rótulo.

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: Os caras pregam uma mentira na testa do cara. E esse cara não desprega mais aquilo. Na primeira confusão, no primeiro debate eleitoral que tiver alguém vai tirar do baú aquilo e vai jogar. Não adianta. O que vai acontecer com ele? Ao invés de ele falar das coisas legais, ele vai ter que se defender por algo que é mentira. E aí o debate de novo cai por terra.

Danilo Cavalcante: É. Eu sempre uso uma analogia com o rótulo real. Por exemplo, você vai tirar um rótulo de uma garrafa, sempre fica alguma coisa. É muito raro você puxar e vim inteiro. Então assim, pode ser que o tempo passe, algo diminua. Mas nunca vai sair 100%. Até porque, aquilo que é negativo viraliza. Quando é algo positivo, para desmentir, ai…

Luciano Pires: É uma maldade da sociedade. Mas vamos lá. No final das contas, no frigir dos ovos. O que aconteceu com você? Qual é o teu business? O que você acabou fazendo aí? Você acabou abraçando de vez nessa história de geração de conteúdo. Mas você não é um cara que dá aula de história.

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: O que é isso? Que business foi esse que você encontrou?

Danilo Cavalcante: Eu percebi que eu tinha a visão para escalar aquilo, para mais pessoas. Só que eu não poderia dividir muito a minha atenção. Eu gosto. Eu amo dar aula. Eu amo lecionar. Só que eu não poderia outorgar para mim o título de professor historiador. Porque eu não sou. Eu sou formado em História. Historiador, por exemplo, é o Thomas Giuliano. O cara vive para aquilo. Eu gosto de ler História ainda. Eu leio História. Mas não me considero um professor de História. Eu me considero meio como um empreendedor mesmo. E uma pessoa que viu num problema real que as pessoas sofrem; uma dor real. Uma causa que já era minha e que eu pude levar para as pessoas, para ajudar outras pessoas. Então eu criei uma escola online que é O Farol, que é uma escola/comunidade. Eu digo que é mais comunidade do que propriamente escola. Em que eu vejo pessoas que têm grande capacidade. Grande potencial. Estão começando a carreira agora. Ou que já tem uma carreira, mas ainda não tem a projeção que eu acredito que eles merecem. E convido para lecionar na escola, dentro de temáticas que abrangem os problemas que as pessoas enfrentam. E que eu quero atender. Então, por exemplo, a pessoa quer aprender a argumentar contra o feminismo. Hoje em dia, o feminismo é tido como uma verdade absoluta e que todo aquele que se posiciona contra o feminismo é tido como machista necessariamente. Então eu vi, por exemplo, a Regiane Siqueira, que é uma advogada. E que vem sofrendo uma série de perseguições por seus posicionamentos e tudo mais. E ela quer deixar de seguir essa carreira para focar só no ensino de fato. E na época ela estava – ano passado isso – com três mil, dois mil seguidores. Convidei ela. Quer ser professora? Agora ela já está com 13 mil, com seu curso próprio e tudo mais. Eu vi que ela tinha muito potencial. Então eu saio pegando essas pessoas que estavam na espiral do silêncio e começo a dar voz para elas. Então elas têm esse momento, que elas fazem isso…

Luciano Pires: Mas tem um componente então político-ideológico nesse teu trabalho?

Danilo Cavalcante: Tem.

Luciano Pires: O tempo todo?

Danilo Cavalcante: Claro.

Luciano Pires: Você não está lá dando aula de Matemática, Geografia?

Danilo Cavalcante: Não.

Luciano Pires: Nem dando aula de produtividade. Não. Você está dando uma aula de posicionamento…

Danilo Cavalcante: Eu já deixo muito claro na minha comunicação. Você entrou aqui. A minha escola é conservadora. Vai falar sobre isso e aquilo. Agora é claro. Uma implementação para o próximo ano. Eu vou trazer pessoas que vão tratar de outros temas. Um deles vai ser justamente da produtividade. Porque uma dor que eu percebo muito na galera. Eles entram na comunidade. Veem lá uma miríade de temas para eles estudarem. Só que eles não conseguem ter a disciplina ao longo do ano. Aí eu percebi essa necessidade. Para que eles tenham acesso a aprender como ter foco, disciplina, enfim, para complementar aquilo. Mas o foco principal mesmo é: aprender a se posicionar sem medo de fato. E ter essa comunidade de pessoas para você poder conversar abertamente, um papo franco, sem precisar ficar pisando em ovos.

Luciano Pires: O teu canal qual é? Instagram? O que é?

Danilo Cavalcante: Hoje o meu carro chefe mesmo é o Instagram. Desde o início eu queria focar lá, até porque é a rede social hoje que mais me traz retorno. E agora eu estou planejando ir para o Youtube. Eu estou a um tempo procrastinando. Mas eu sei que o Youtube também é uma boa possibilidade. Até porque eu vejo no Youtube mais liberdade de expressão do que no Instagram. Parece engraçado isso. Porque eu vejo muita gente já reclamando do Youtube. Mas eu vejo que o Youtube é assim. Porque o problema do Instagram hoje é que eles censuram até palavras. Então têm palavras que você tocou já aparece uma tarjinha lá. Ou ele derruba o post. Eu particularmente já tive uma conta derrubada.

Luciano Pires: Quantos seguidores você tem no Instagram?

Danilo Cavalcante: 214, 215 mil.

Luciano Pires: Você tem consciência que eles não são seus?

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Que eles são do Instagram?

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: Não te preocupa montar um negócio onde o teu público não é teu? É do Instagram.

Danilo Cavalcante: Por isso que eu estou fazendo outras medidas. Eu estou indo para o Telegram também. Estou levando o pessoal para o Telegram. A minha maior lição até hoje foi quando eu perdi a minha conta no Facebook, em 2018. Eu tinha quase 30 mil seguidores na época. Eu fiz uma publicação sobre a revolução sexual dos anos 60, com um paralelo com o feminismo. Não tinha nudez. Não tinha palavrão. Que era o que eles poderiam alegar. Não tinha discurso de ódio. Era só um relato de um fato e colocando fonte bibliográfica. O Facebook na época me notificou. Disse: tiramos teu post do ar. E sua conta vai ficar suspensa por um mês. Por quê? Aí eu mandei uma mensagem para eles – juro a você, uma linha – por quê? No outro dia eu recebi a resposta: sua conta foi deletada permanentemente. Excluíram a conta. Eu disse: é? Deu aquela dor. Aquele baque. Eu vou para o Instagram. Foi aí que eu saí do Facebook e fui para o Instagram. E me dediquei lá. Aí quando eu comecei a perceber que muitas pessoas estão tendo contas derrubadas. Perdendo link. Eu mesmo quando eu fui lançar a Confraria, a primeira turma, antes de ser O Farol, na semana de lançamento, três dias antes, eu fui abrir uma live. O Instagram: você está proibido de fazer live. Aí às pressas, eu criei uma conta fake. Eu mandei o pessoal para essa conta. Não prejudicou tanto assim o lançamento. Mas foi algo que eu: opa. Já chamou a atenção. E foi ali que eu criei o Telegram. Que no Telegram eu posso falar. Pelo menos até agora.

Luciano Pires: Por enquanto.

Danilo Cavalcante: Até agora. Eu até costumo brincar. Eu digo: vá para o Telegram porque lá você vai ter acesso a um conteúdo que eu nunca vou poder publicar aqui. Entendeu?

Luciano Pires: Sim.

Danilo Cavalcante: E também estou agora me organizando para ir para o Youtube. Eu já criei um canal lá. Têm alguns vídeos. Mas nada ainda muito sério.

Luciano Pires: É uma encrenca isso aí. Porque você está diante de outro tipo de espiral do silêncio. Outro tipo não. É a mesma espiral do silêncio. Porém com outras ferramentas.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: E essa é foda. Porque essa você não tem o endereço certo.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Para quem você liga para reclamar do Facebook? Você fala com quem no Facebook? Você tem que mandar um e-mail? Alô Facebook: não gosto de você. Vai cair sei lá em quem. Você possivelmente foi denunciado por alguém. E a pessoa que recebeu a denúncia é simpática a essa pessoa que denunciou.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Vou cortar esse cara. Aperta o botão. E acabou. Vou dar um shadow bunny. Quem não sabe o que é shadow bunny. O cara simplesmente diminui a tua entrega. E você nem sabe disso. De repente você bota. Esse post aqui era para ter viralizado. Não aconteceu nada com ele. Por quê? Porque o sistema não entrega. Alguém disse: não entregue.

Danilo Cavalcante: Exato.

Luciano Pires: E aí é complicado. Porque corta o teu canal de distribuição, que é o grande lance da internet. A internet é isso, ela me dá o canal.

Danilo Cavalcante: Agora, uma coisa engraçada é que assim. Você falou da estratégia gramsciana. E eu comecei a utilizar há um tempo. Quando aconteceu isso? Eu fiz uma publicação explicando o que realmente é fascismo. Foto de Mussolini. O que realmente é fascismo. E no decorrer do texto, eu fui mostrando que ele era coletivista, ultranacionalista. E que não faz sentido atrelar uma pessoa conservadora ao fascismo. Esse meu post seria o meu post com maior engajamento da história. Ele viralizou. Porque tinha milhares de salvos em muito pouco tempo. Do nada eu recebi: Danilo, cadê teu post? Tu apagou? Eu: não. Quando eu olhei o post tinha caído. Vou publicar de novo. Publiquei. Vida que segue. O post caiu de novo. E o Instagram me notifica. Eu: estão querendo brincar comigo. Eu mandei para o meu designer: Allan coloca uma framboesa na cabeça de Mussolini e troca fascismo por framboesa. Toda vez que eu for falar de fascismo agora, eu colocar framboesa em Caps Lock. Nunca mais caiu. Espero que não tenha ninguém do Facebook vendo. Mas algo que eu percebi, que de fato, se você quer entrar no jogo para ganhar ou para representar alguma frente, você precisa entrar no jogo das palavras. De modo que as pessoas entendam. O teu público entenda que aquilo ali é um código de linguagem de vocês. E que você quer se referir a outra coisa e não àquilo exatamente. E o algoritmo ainda não tem inteligência para isso. Ainda. Que vai chegar o tempo…

Luciano Pires: Ele vai ter. Porque ele vai começar a pesquisar intenções. A palavra vai cair para segundo plano. Hoje em dia ele caça. Você publicou um palavrão. Hoje à tarde um cara: olha aqui no Instagram como é. Eu escrevi aqui líder canalha. Um comentário num post meu. Eu fui publicar. O Instagram não deixou. Porque eu estava usando palavras ofensivas. Eu tirei o canalha. Ele deixou eu publicar. Ele achou o canalha. Daqui a pouco ele não vai precisar mais do canalha. Ele vai conseguir interpretar a intenção do post e ele vai te cortar.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Pela intenção. E aí não tem quem segure. Não tem mais como. Não tem como furar essa… a menos que a tua patota esteja no teu ambiente.

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Que foi uma coisa que eu nunca abri mão. Então desde o começo. Eu estou falando dos anos 90. O meu foco foi: eu criei o meu site. Portal Café Brasil, distribuição de conteúdo, PodCast. Está tudo lá no meu lugar. E eu uso as ferramentas todas como marketing. Então se alguém falar assim: tirei tua conta do Facebook do ar. Eu tenho 200 e tantos mil. Tua conta caiu. Continua tudo. Quem me conhece vai lá no Portal. Está tudo lá no Portal. O que eu queria voltar, que é o perigo dessa história toda: a gente durante muito tempo, nós ficamos preocupados com o autoritarismo e totalitarismo do Estado. O ditador que vai tomar conta. Os caras que vão chegar com canhões e vão tomar conta. E agora nós estamos enfrentando um autoritarismo que não é de Estado. E também não é do capitalismo. Ele é dessa entidade maluca. Um Facebook, que não tem fronteira. Que se você explodir a sede dele, ele continua existindo igual. Ele não precisa da sede para existir. Ele está em tudo quanto é país do mundo. Você aperta um botão, você atinge milhões de pessoas. Ele tem um poder. Ele tem uma força…

Danilo Cavalcante: O controle de informação disso tudo…

Luciano Pires: Que nos traz outro tipo de autoritarismo. Não tem mais o cara para eu apontar o dedo e falar: é ele.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: E outra, quando você aponta o dedo para o Mark Zuckerberg. Ele não é o bicho da história. Embaixo dele tem uma moçadinha lá. Tem uma menininha sentada num ambiente ali, com o dedo na ponta do botão, que ela tira você do ar sem que ninguém mais saiba.

Danilo Cavalcante: É.

Luciano Pires: Porque você incomodou a visão de mundo dela. E ela tem o poder de apertar o botão e detonar você.

Danilo Cavalcante: Exatamente. Eu acho que o grande ponto que as redes sociais vieram para desbancar era: havia um controle de informação muito mais rígido. Que num primeiro momento se fragmentou. Agora têm vários canais. E aí eles perceberam: opa. Olha a consequência que isso trouxe. Vamos então agora arrumar uma forma de controlar novamente. Então hoje – vamos olhar – o dono do Facebook, é o mesmo dono do Instagram, que é o mesmo dono do WhatsApp. Basicamente as três maiores redes sociais do mundo, à exceção do Youtube. Então, o quanto do poder de informação, quantos segredos, quantas fofocas, quantas mentiras, quantas verdades, quantos sonhos e planos não estão na mão de um só grupo? E obviamente eles vão utilizar ali dentro do que eles quiserem. É muito inocente a pessoa achar: o WhatsApp diz que essa encriptação é do início para o fim. Não tem. É muita inocência você acreditar numa coisa dessas.

Luciano Pires: E acreditar também no discurso: é tudo pelo bem. Como é as agências de [inint 01:14:43].

Danilo Cavalcante: Fake news. Pelo amor de Deus.

Luciano Pires: Agência de [inint 01:14:46]. Eu estou na rua, com um cartaz na mão escrito: ele não. Termina. Eu vou. Sento na minha carteira e lá vou eu exercer. Eu sou o cara que checa fatos ocorridos em passeatas.

Danilo Cavalcante: E eles se dizem imparciais. Um dia desses o [inint 01:14:59] fez um post no storie dele. Perguntaram para ele algo sobre riqueza. Algo assim. E ele colocou uma citação só de um autor. Não lembro o nome do autor. Mas o Instagram colocou lá: informação falsa. Uma tarja bem grande. Informação falsa. Para esconder o post. Quando você clica, eles botam assim: informação verdadeira. Essa frase não é de fulano. Só que quando vê que essa frase não é de fulano, por exemplo, essa frase não é de Shakespeare. Só que a frase que ele colocou lá no nome, não tinha o nome de Shakespeare. Entendeu? Ou seja, o verificador disse que a informação era falsa. Só que não tinha nada a ver com o que estava colocado na publicação. Ele esconde a informação. Coloca a tarja lá. E uma pessoa mais descompromissada, que não vai buscar entender o que está acontecendo: ah, é falsa. Já vai desacreditando daquela pessoa. E o que mais me choca é o fato de que esse tipo de coisa sempre pende para um lado. Perde link. Um lado perde link. Informação falsa. Um lado é informação falsa. Discurso de ódio. Só um lado tem discurso de ódio?

Luciano Pires: No outro lado são voluntários. Eu tenho voluntários que me ajudam. Se for o lado de lá é a gang. É quadrilha e tudo mais.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: É sempre assim. Por isso que é importante – eu vou caminhar para o nosso final aqui, meu caro – que é o seguinte: esse é um tipo de guerra e de luta que é muito novo. Antigamente era o seguinte… eu vou voltar para os anos 60. Os militares são ditadores. Vejo um militar e jogo um ovo nele. Era fácil. O alvo estava ali. Eu podia desenhar o bandido.

Danilo Cavalcante: Dava para visualizar.

Luciano Pires: Hoje não tem. Eu não tenho onde jogar o ovo. Até porque, a figura que aparece diante de mim é uma figura… é um anjo. Aparece diante de mim um anjo. Ele quer salvar o mundo.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Ele te ama tanto, que ele vai te obrigar a falar tal coisa. Você vai perder o emprego. Você vai perder teu emprego porque eu te amo.

Danilo Cavalcante: Eu te amo demais.

Luciano Pires: Eu te amo demais. Eu vou matar você.

Danilo Cavalcante: Eu vou lhe proibir de falar algumas coisas, porque eu te amo demais.

Luciano Pires: Exatamente. Esse é um mal tão louco, que as pessoas que… eu costumo dizer o seguinte: o problema do Brasil… faltou uma guerra fodida no Brasil para matar gente. Para ter um problema sério aqui, que historicamente pudesse botar no sangue da gente a luta pela liberdade. Como nós nunca perdemos. Quem foi que perdeu a liberdade? Eram uns caras nos anos 60, que estavam contra o regime. Ali tinha um problema. Mas faz 60 anos. Essa molecada como você não tem a menor ideia do que era aquilo. Nunca sentiu na pele aquilo. Aquilo já era. Como eu nunca perdi eu topo trocar um pouco. Se você me der um pouquinho de garantia financeira, eu te dou um pouquinho da minha liberdade. Então tudo bem. Tá legal. Eu não tenho mais liberdade de ir e vir, porque você vai cuidar da minha saúde? Legal. Então eu topo. Tira a minha liberdade que eu topo. A pessoa não sabe o valor que tem isso. E você perde um pouquinho. Depois mais um pouquinho. Daqui a pouquinho foi tudo. E vai ficar normal. É normal não ser livre.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Você está me ouvindo ai. Está horrorizada. Vai me cancelar. O cacete. Antes disso, compra uma passagem e vá para a Alemanha, que é o lado oriental. E converse com os velhinhos que estão lá. Converse com a molecada que está lá. Com os filhos dos caras que estavam lá. Pergunta para essa turma se lá tem essa conversinha de socialismo, comunismo? Pergunta para quem viveu isso na pele. Está tão claro isso. O problema é que isso foi tudo embalado. Tem um discurso. Sempre a serviço de meia dúzia, da elite. Tem uma elite que ganha muito com isso. E nós estamos vivendo na…

Danilo Cavalcante: Eu acho que um ponto importante é o seguinte: a minha busca por dar um espaço para os conservadores não é que eu quero aquela hegemonia conservadora. Eu quero simplesmente que haja espaço. Você fala o que você quiser. O absurdo que você quiser. Eu não quero que você seja preso. Discurso não vai me matar. Agora, saiba que eu também posso falar algo que se, porventura, te ofender, porventura, você não gostar, saiba que também é meu direito.

Luciano Pires: Claro.

Danilo Cavalcante: Porque se a gente agora vai arbitrar onde que está o limite do que eu digo e do que você diz, onde a gente vai chegar? Primeiro: quem vai ser esse juiz imparcial? Não vai existir.

Luciano Pires: E tem outra coisa também. A pessoa: então eu posso sair por aí falando bem do nazismo? Eles jogam sempre com 80.

Danilo Cavalcante: Sim. Claro.

Luciano Pires: É oito ou 80. Eu falo: tem um bom senso que a humanidade perdeu. A gente perdeu o bom senso. Esse bom senso é muito ralinho em alguns lugares. Em outros lugares ele é grande demais. Então, como é que você exercita isso: É interpondo as ideias. É contrapondo ideias.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Deixa eu ouvir você falar. Escuta eu falando. E você que está ouvindo nós dois aí. Ouviu o argumento dele. Ouviu o meu. Qual é o teu lado? Legal. Tudo bem. Vamos tomar um chope? Devia ter…

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Como era até 2013. Até 2018 era assim. E agora nós estamos numa situação tal. O Natal desse ano vai ser complicado. Tem primo que eu não posso ver. Tem tio que eu não converso mais.

Danilo Cavalcante: Eu acho que a grande perda é essa politização das relações humanas. Eu vejo muito isso. É meme na internet, claro. Mas isso na prática está acontecendo. Não fala com o pai. Com a mãe.

Luciano Pires: Saiu da internet e foi para o mundo real.

Danilo Cavalcante: Foi.

Luciano Pires: Eu botei um texto essa semana aqui de uma amiga minha, que foi na farmácia e foi comprar um produto qualquer na área de maquiagem. E aí a atendente da área de maquiagem falou: deixa eu dar uma olhadinha. Saiu com ela. Foi até o balcão para pesquisar no computador. E ela parou. Enquanto a moça pesquisava tinha umas mulheres na fila, comprando remédio. E começaram a apontar o dedo: olha aí, patricinha furando fila. E ela: não. Mas como assim? Aí a moça falou: não. Espera aí gente. Eu sou da outra área. Eu não sou de remédio. Eu sou da área de maquiagem. Eu só vim fazer uma consulta. E o pessoal xingando: olha aí, furando fila. Tem um ódio. Isso aí está latente. Já saiu da internet e veio para o dia a dia. Não vai acabar bem. Não pode acabar bem.

Danilo Cavalcante: Infelizmente.

Luciano Pires: Como é que você escapa disso? Ficar imune é impossível. Mas se você construir um repertório legal. Se você ouvir os vários lados. Se você estiver aberto para ouvir ideias que não estão fáceis por aí. Se você encontrar gente que nem o Danilo, que tem um projeto. Ele vai falar: eu vou pegar um monte de ideias que estão por aí e vou te mostrar que existem outras formas de você olhar o mundo. Isso te enriquece. E é o trabalho que eu faço também. O que é? Eu quero ampliar o teu repertório e refinar a tua capacidade de julgamento e tomada de decisão. É só isso. Eu não quero que você seja de direita, de esquerda. Não. Arruma a tua capacidade de julgamento e tomada de decisão. Só isso. Na hora de você escolher alguma coisa você vai falar: vou escolher convicto de que eu entendi o que está acontecendo. Eu ouvi todos os lados. E tomei a decisão que eu acho melhor para mim. E não a melhor para o grupo. A melhor para mim. Se isso acontecer a gente muda esse país aqui.

Danilo Cavalcante: E tirando esse assunto. Aqueles loucos ideológicos, que realmente são de fato do extremo, que não querem ouvir. Na vida real, quando você…

Luciano Pires: Espera aí… de todos os extremos.

Danilo Cavalcante: Sim. De todos.

Luciano Pires: Não é o extremo de direita nem de esquerda.

Danilo Cavalcante: De todos.

Luciano Pires: Todos os extremos.

Danilo Cavalcante: Tirando esses loucos, tresloucados de todos os sistemas: religioso, político, enfim. Na vida real, quando você senta para conversar de verdade, igual assim, um papo franco, você vai perceber que você vai concordar muito mais do que você imagina, com aquela pessoa.

Luciano Pires: Exatamente.

Danilo Cavalcante: É um negócio louco isso.

Luciano Pires: Exatamente. Então, como é? Vamos construir em cima dos 80% de concordância que nós temos?

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: E não em cima dos 20 de discordância. Eu não vou te matar porque eu discordo de você em 20%. Vamos celebrar os 80. E vamos dar um jeitinho de acertar esses 20.

Danilo Cavalcante: Exatamente.

Luciano Pires: Esse é o caminho. Onde a gente te acha? Mais alguma dica? Você tem alguma história que você está lançando agora? O que é? Cadê o livro? Cadê o blog? Cadê o filme?

Danilo Cavalcante: Eu falei sobre essa estratégia mais de não falar de política tão diretamente assim. Eu comecei a tratar um pouco a parte daquilo que eu percebia que as pessoas estavam tendo na realidade delas, que formou o imaginário delas. Então quando eu percebi que o cinema, por exemplo, as séries, novelas, programas de TV era algo muito forte na mente do brasileiro. E que eu poderia extrair deles um exemplo ou um contraexemplo, foi aí que eu percebi. Então eu vou começar a tratar aqui do conservadorismo de uma maneira um pouco mais… não tão agressiva assim. Não tão evidente. Sem nem usar o termo conservador mais. E vou trazer a questão dos valores. Olha: a gente agora está vindo aqui. Vamos lá. Eu sempre dou o exemplo de uma série que eu acho que eu vou ficar conhecido daqui a algum tempo, por sempre falar muito disso. Eu, a Patroa e as Crianças. Uma série que passava no SBT. Uma série da família. O cara negro; nasceu pobre. Bem-sucedido agora. Casado há décadas com a mesma mulher. Tem três filhos. Um pai presente. Um marido provedor. E um pai que sempre está ali para dar alguma lição para ajudar o filho a entender alguma coisa na vida. Um pai que confunde toda uma narrativa que tentam traçar para o negro. Uma atitude mais vitimista, que sempre se vê como oprimido e tudo mais. Um cara que venceu na vida. Só que essa série, à primeira vista você olha e você diz: é engraçada. Beleza. Só que o que está na segunda camada dela é uma lição do que de fato é uma família. Que vai ter briga. Vai ter conflito. Vai ter discordância. Mas no fim, o amor de um pai e de uma mãe sempre vai superar essas divergências. Então eu digo: é isso aqui que uma pessoa mais conservadora vai acreditar. Quando a gente fala de família não é que a gente quer colocar a família opressora, patriarcal, num mundo monocromático. Não. A ideia é: uma família tem que ser assim. Vai haver o momento de conflito. Vai haver o momento de harmonia. No fim das contas, a família é teu último império contra a tirania do Estado. Na série, eu acho que não foi nem intenção dos diretores colocarem algo desse tipo. Mas a série passa essa mensagem. Então ao inces de eu ficar falando ali: a tradição, o conservadorismo e os testes do tempo. Por que eu não pego um exemplo prático e diluo na mente da pessoa ali? Eu faço meio que uma espécie de engenharia reversa para a pessoa entender o que está ali por trás. Então eu comecei a aguçar muito isso na galera que me segue. Hoje em dia, eles assistem. O que eles assistem ou escutam, eles dizem para mim: Danilo, eu nunca tinha pensado nisso. Vê isso aqui. Assiste isso. Isso aqui me ajudou. Eu tenho relato de pessoas que eram feministas que deixaram de ser porque viram alguma análise minha. Ou de pessoas que tinham uma linhagem pró PT. E aí viram uma análise minha, que não tinha nada a ver com o PT. Mas perceberam como é que funciona a mente de uma pessoa que é revolucionaria e disse: opa; vou dar aqui um passo para trás. Não é assim que funciona. O mundo não foi criado hoje. Existe uma tradição aí e uma série de histórias que moldaram a história da humanidade, que eu não sou um alecrim dourado.

Luciano Pires: Que nos trouxeram até aqui.

Danilo Cavalcante: Que nos trouxeram.

Luciano Pires: E para você combater essa história você vai ter que usar o: e se? E se não existe. Eu te falei aqui, um pouquinho antes de começar. Eu vi o debate do Tico Santa Cruz com o Rica Perrone. O Tico é o rei do: e se? E ele pergunta: e se não fosse o Bolsonaro? Eu não sei. Podia ter acabado o Brasil. Podia ter se dado melhor. Eu não sei. E não posso trabalhar em cima do: e se? É especulação.

Danilo Cavalcante: Uma coisa que eu aprendi na Faculdade de História – tem uma coisa valiosa que eu aprendi – a História não é feita de futuro do pretérito. Lá em Recife isso é muito forte. E se os holandeses tivessem de fato colonizado Pernambuco e não os portugueses? E se? Não vai levar a lugar nenhum.

Luciano Pires: Não. Até porque, eu não sei se ia dar certo ou não. Mas em nome de uma utopia, eles pegam: se… teria acontecido tal coisa. Quem foi que disse?

Danilo Cavalcante: Pois é. Você tem a bola de cristal ali. Você viu todas as possibilidades.

Luciano Pires: Isso que eu chamo de ceticismo positivo. Não é o ceticismo da negação para destruir. Eu sou cético do ponto de vista positivo. Eu vou duvidar porque eu quero provar. Eu vou duvidar porque eu quero acreditar. Eu quero tanto acreditar, que eu vou duvidar. E ao duvidar… eu estou falando de Karl Popper aqui. Eu vou tentar destruir. Se eu não conseguir destruir está valendo. Essa ideia que eu tentei desfazer eu não consegui. Ela é tão forte que ela acaba…

Danilo Cavalcante: Sim. E uma coisa que eu acho legal é isso. Se uma pessoa tem um discurso e esse discurso e falacioso, bota no debate. Deixe que a verdade então seja suprema. Porque se for de fato verdadeiro ela vai resistir aos testes do tempo. Se for mentira vai sucumbir. Mas aí parece que as pessoas agora, essa movimentação contra a liberdade de expressão, o que eles querem basicamente é: a gente tem a narrativa. Essa narrativa deve ser a única possível. Porque a gente tomou ela como verdadeira. E todo o resto deve ser expurgado do debate público.

Luciano Pires: Sim. Não vamos nem falar. Isso não é debate.

Danilo Cavalcante: Se todo mundo está pensando igual não está tendo… ninguém está pensando.

Luciano Pires: Onde é que eu acho você? Vamos lá. A tua base é o Instagram?

Danilo Cavalcante: Exato @odanilocavalcante. Pinta por lá com esse @ aí. Eu estou indo para o Youtube para 2022. Mas também já tem um canal lá marcando território. Lá é normal, Danilo Cavalcante. Dá para encontrar. Têm alguns vídeos lá que já estão prontos. Um até que já viralizou, que eu fiz uma análise sobre o Jim Caviezel, o ator que fez Jesus na Paixão de Cristo. E depois foi cancelado por Hollywood. Eu faço um preâmbulo lá do que aconteceu desde então. E aí aguardem. Eu até vou deixar isso aqui registrado Luciano. Daqui a uns 20 anos eu vou voltar nesse PodCast para ver o que deu. Aguarde. Mas se assim Nosso Senhor permitir vocês ainda ouvirão falar muito no meu nome.

Luciano Pires: Vamos lá. Estamos aí. Eu espero estar mais perto de você. Vamos trocar uma ideia. Porque o teu conteúdo é legal. Essas coisas que ele está fazendo de cinema. É muito legal. Porque ele está usando muito bem a linguagem do Instagram. Você entra ali, tem um storie rapidinho. Ou tem uma sequência. Tem um carrossel rapidinho ali, que ele pega um tema. E rapidinho ele dá umas pegadas muito legais. Pega uma cena qualquer. Essa cena do filme. Vamos ver aqui. Tem sido um trabalho bem legal lá. Eu espero que seja bem-sucedido. Eu sei que você está com uns contatos legais, uns nego bom aí. Vamos ver rolar.

Danilo Cavalcante: Com certeza.

Luciano Pires: Um grande abraço. Muito bom te ter aí.

Danilo Cavalcante: Eu que agradeço o convite imensamente.

Luciano Pires: Vamos adiante. E no que precisar da gente estamos aqui.

Danilo Cavalcante: Digo o mesmo. Pode contar comigo aí.

Luciano Pires: Indo para Recife, eu vou te procurar lá.

Danilo Cavalcante: Com certeza. Já conhece Recife?

Luciano Pires: Meu Deus do céu. Eu tive em Recife uma experiência. Eu vou usar o finalzinho aqui para contar. Foi maravilhosa. Eu estou em Recife. Eu fui fazer palestra. Eu faço palestra no Brasil inteirinho. Para não dizer para você que eu conheço o Brasil inteirinho, só falta Fernando de Noronha. E eu falo isso há uns oito anos. E eu descobri que eu não vou para lá, que é para não estragar. É para não estragar a narrativa. Entendeu? O dia que eu for não falta mais nada.

Danilo Cavalcante: Sim.

Luciano Pires: Mas eu vou a Recife. Eu fui fazer palestra lá. Cheguei de dia. A palestra é à noite. Eu estou no hotel. Liguei a televisão. Palestra no dia seguinte. Liguei a televisão. De repente, eu pego uma entrevista. Aliás, eu vou almoçar e vejo sentado numa mesa almoçando, o Antônio Nóbrega. Eu adoro o Antônio Nóbrega. De paixão. Maravilhoso o trabalho que ele faz. Eu olhei e falei: o que esse cara está fazendo aqui? Almocei na boa. Chego no hotel. Ligo a televisão. E entra ali que o Antônio Nóbrega estaria encerrando um show dele – que ele estava fazendo no Brasil inteiro – chamado Nove de Fevereiro. E ele estaria encerrando esse show num teatro de uma universidade. Eu não vou lembrar nunca o nome lá. E era naquela noite. Eu falei: estou aqui de bobeira. Estou sozinho. Eu vou lá. Chego lá. Compro ingresso. Entro. E assisto um pernambucano fazendo um show de cultura pernambucana para encerrar a temporada dele em Pernambuco com uma plateia pernambucana. Então lá pelas tantas está todo mundo cantando músicas que eu nunca ouvi na minha vida. E o pessoal cantando como hinos. Eu fico todo arrepiado quando eu lembro. E eu sentado lá. Maravilhoso o show dele. Quando termina o show ele vai cantando. Ele desce. Começa a passar pela plateia. A plateia inteira levanta e sai com ele para a rua, cantando junto. E aquilo só aconteceu porque eu estava lá. Era em Pernambuco. Eu fico arrepiado. Até hoje quando eu lembro essa história eu falo: que puta sorte minha. Porque eu podia estar vendo esse encerramento aqui em São Paulo. E não teria. Seriam os pernambucanos exilados aqui. Lá não. Era lá na terra dele. Eu nunca mais vou esquecer. Ficou gravado para o resto da vida. A cultura pulando na tua frente. Mas é isso aí. Gosto muito. Sempre vou lá. Toda hora eu passo lá.

Danilo Cavalcante: Quando chegar lá só mandar aquele zap. Que a gente bate papo por lá.

Luciano Pires: Tamo junto. Grande abraço, meu caro.

Danilo Cavalcante: Valeu.